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Bolsonaro recoloca no baralho carta do impeachment, intimando país a reagir
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Com seu comportamento inusitado, Bolsonaro tornou-se protagonista de uma originalidade histórica. Desceu ao verbete da enciclopédia como primeiro chefe do Executivo a utilizar o 7 de Setembro como palco de uma confrontação com os outros dois Poderes da República. Declarou guerra ao Judiciário. E colocou em posição subalterna o Legislativo. Discursou para multidões de devotos em Brasília e São Paulo. Soou mais explícito na Avenida Paulista.
Como de hábito, o cérebro de Bolsonaro começou a funcionar neste feriado no instante em que ele acordou. E não parou até o seu encontro com o primeiro microfone do dia. Antes de discursar, era um presidente sem partido e sem rumo. Já nas primeiras palavras, colocou o seu governo no rumo de uma crise institucional sem retorno. Foi como se intimasse a República a reagir contra os seus ataques ao regime democrático.
Bolsonaro chamou de "canalha" o ministro Alexandre de Moraes, que preside inquéritos contra ele no Supremo. Acusou-o de decretar prisões políticas. Declarou que não cumprirá decisões judiciais proferidas pelo magistrado. Insinuou que o Supremo pode sofrer intervenção se o seu presidente, Luiz Fux, não enquadrar Moraes.
Considerando-se que Moraes é avalizado pela Corte e que Fux não dispõe de poderes para enquadrar seus pares, Bolsonaro comprou briga com o Judiciário, não com um de seus ministros. Fux conversou com os colegas de toga sobre a forma e o conteúdo da resposta da Corte Suprema. O ministro ainda não se deu conta. Mas vive um daqueles momentos históricos em que as horas mais preciosas são as mais rápidas. Como demoram as outras!
Em novo ataque às urnas eletrônicas, Bolsonaro disse que não admite participar em 2022 de uma "farsa" conduzida pelo ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Exigiu voto impresso e auditável. As mentiras de Bolsonaro sobre o sistema eleitoral eletrônico, seguro e já sujeito a auditagem, lhe renderam a abertura de um inquérito na Justiça Eleitoral. Foi inaugurado por decisão unânime dos sete ministros do TSE, não apenas de Barroso.
Entre os que votaram a favor da conversão de Bolsonaro em investigado também no âmbito da Justiça Eleitoral está Alexandre de Moraes, que presidirá o TSE na sucessão do ano que vem. Levando-se em conta que a Câmara já enterrou a proposta de voto impresso e que Rodrigo Pacheco, presidente do Senado e do Congresso, já arquivou o pedido de impeachment que Bolsonaro formulou contra Moraes, o presidente da República desafia também o Legislativo.
É como se Bolsonaro estimulasse o pedaço do país que não o chama de "mito" a cutucar com o pé o deputado Arthur Lira, presidente da Câmara, para ver se ele morde seu principal aliado, abrindo a gaveta que guarda mais de 130 pedidos de impeachment. A contragosto do centrão, Bolsonaro recolocou no baralho a carta do impeachment.
Num dia em que pretendia exibir os músculos, Bolsonaro acabou escancarando sua fragilidade. Desde que assumiu a Presidência, ele declara guerra ao mundo. Passou a guerrear contra a estabilidade da democracia. Pela lógica, um governante que derrete nas pesquisas deveria buscar aliados e evitar brigas. Mas a única lógica que Bolsonaro conhece é a lógica do confronto.
A obsessão pela guerra tem suas raízes nos 28 anos de exercício de mandato parlamentar. O problema é que, na Câmara, o custo do destempero e dos xingamentos de Bolsonaro limitava-se ao desperdício de verbas públicas com o pagamento do seu contracheque e com as rachadinhas proporcionadas pela estrutura administrativa do seu gabinete.
No Planalto, o custo é mais alto. Em campanha permanente, Bolsonaro se abstém de presidir as crises que inquietam o país. Em condições normais, presidentes fracos interessam ao centrão. No momento, as emendas orçamentárias que remuneram a cumplicidade de parlamentares com códigos de barra na lapela custam R$ 37 bilhões anuais ao Tesouro.
Entretanto, ao cometer crimes comuns e de responsabilidade em série, Bolsonaro leva até o centrão a fazer um cálculo do tipo custo-benefício. Empresários pressionam o grupo a exibir uma reação. Nem que seja uma cara de nojo. Num cenário assim, a democracia brasileira precisa morrer um pouco a cada dia para que Bolsonaro sobreviva no cargo.
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