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Josias de Souza

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonaro volta a pendurar Alexandre de Moraes na manchete de ponta-cabeça

Colunista do UOL

07/06/2022 19h11

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Em condições normais, o noticiário político desta terça-feira deveria ser monopolizado pela decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal de restabelecer a cassação do mandato do deputado estadual bolsonarista Fernando Francischini por propagar mentiras sobre as urnas eletrônicas em 2018. Mas Bolsonaro cuidou de diversificar a pauta.

Informado de que seria cassada, por absurda, a liminar usada pelo ministro Kassio Nunes Marques para devolver por menos de uma semana o mandato de Francischini, Bolsonaro apressou-se em injetar confusões novas na conjuntura. O presidente voltou a pendurar de ponta-cabeça nas manchetes o ministro do Supremo Alexandre de Moraes, seu desafeto de estimação.

Numa entrevista ao SBT, Bolsonaro acusou Moraes de ter descumprido pontos de um suposto acordo articulado pelo ex-presidente Michel Temer nas pegadas dos atos realizados no 7 de Setembro do ano passado. Num desses atos, na Avenida Paulista, Bolsonaro chamara Moraes de "canalha" e dissera que descumpriria suas decisões judiciais.

Menos de 48 horas depois, Temer intermediou uma conversa telefônica do presidente com o ministro. Redigiu uma carta na qual Bolsonaro recuou, atribuindo seus arroubos ao "calor do momento."

Agora, Bolsonaro declara que manteve com Moraes, na presença de Temer, não uma conversa telefônica, mas três. E acrescenta, enigmático: "Combinamos certas coisas para assinar aquela carta. Ele [Moraes] não cumpriu nenhum dos itens que combinei com ele."

O presidente se abstém, convenientemente, de informar quais seriam os alegados compromissos descumpridos por Moraes. Limita-se a dizer que eram "questões" destinadas a "diminuir a pressão sobre essa perseguição que ele faz até hoje em cima de pessoas que me apoiam."

O que Bolsonaro insinua, com outras palavras, é que Moraes teria reconhecido que persegue devotos do bolsonarismo. Pior: no enredo do presidente, o magistrado assumiu o compromisso de desmontar o patíbulo.

Michel Temer viu-se compelido a sair em defesa de Alexandre de Moraes, seu ex-ministro da Justiça. Declarou que "não houve condicionantes" no diálogo do ano passado. Referiu-se à conversa de setembro como "um gesto conjunto de boa vontade e grandeza entre dois Poderes do Estado brasileiro."

Na última sexta-feira, Moraes havia previsto que o "obstáculo" criado pelo bolsonarista Kassio ao anular em decisão individual a cassação de Francischini, que o TSE havia aprovado por 6 votos a 1, "logo seria superado." Futuro presidente do TSE, Moraes reafirmou que o precedente será usado para punir quem difundir fake news na campanha de 2022.

O "obstáculo" de fato foi removido. Mas a confusão planejada por Bolsonaro para 2022 está apenas começando. Inicialmente, a liminar de Kassio seria derrubada no plenário virtual do Supremo. Ali, Kassio e o colega "terrivelmente evangélico" André Mendonça, seu parceiro de empreitada, seriam surrados por 9 votos a 2.

Com a transferência da encrenca para a Segunda Turma, a surra foi substituída por uma derrota miúda de 3 votos a 2. Ao manter a eletrificação do cenário com uma nova polêmica, Bolsonaro como que magnificou o vexame. Foi como se o presidente quisesse mostrar a Moraes que tudo passa, até Átila, o rei dos hunos. Mas a grama jamais será a mesma.