Decisão unânime do BC deixa Lula na posição de derrotado
Os tiros disparados por Lula contra Roberto Campos Neto ricochetearam, atingindo o pé do atirador. O Copom, Comitê de Política Econômica do Banco Central, deixou o presidente da República manco ao manter a taxa básica de juros em 10,50% ao ano. Interrompeu-se um ciclo de sete cortes consecutivos da Selic, iniciado em agosto do ano passado, quando a taxa estava em 13,75%.
Na véspera, Lula declarou que Campos Neto "tem lado político"e "trabalha para prejudicar o país". Mirou no coração da autonomia do Banco Central. Num disparo, questionou: "A quem esse rapaz é submetido?". Noutro, indagou: "Cadê a autonomia dele?".
Para desassossego de Lula, a posição do presidente do BC diluiu-se em meio à unanimidade de nove votos do Copom. Posicionaram-se a favor da manutenção dos juros inclusive os quatro diretores escalados pelo próprio Lula. Entre eles Gabriel Galípolo, cotado para substituir Campos Neto, cujo mandato expira no final do ano.
Disparando a esmo, Lula havia se referido à política monetária do BC como único problema do país. "Nós só temos uma coisa desajustada no Brasil neste instante: é o comportamento do Banco Central. Não tem explicação a taxa de juros do jeito que está." No ricochete, o Copom sinalizou que parte do desajuste está no desequilíbrio das contas do governo.
Fernando Haddad colecionou muitas vitórias no primeiro ano da gestão Lula 3. Mas seu déficit zero virou ficção. O superávit tornou-se uma lenda. Esgotou-se a estratégia da resolução da encrenca pelo aumento de arrecadação.
O dólar disparou, produzindo reflexos inflacionários. Medida pelo IPCA, a inflação corrente no acumulado de doze meses subiu de 3,69% em abril para 3,93% em maio, superando a meta de 3% prevista para o ano. O governo foi como que intimado a cortar gastos. E Lula hesita em trocar a pistola pelo facão.
No início da semana, Fernando Haddad e Simone Tebet expuseram a Lula o buraco produzido no Tesouro pelas benesses concedidas ao empresariado. Somando-se as renúncias tributárias e os subsídios financeiros, a conta foi a R$ 646 bilhões em 2023. Lula declarou-se "extremamente mal impressionado". Com um ano e meio de mandato, renovou o compromisso de retirar os ricos do orçamento. Fácil de prometer, difícil de cumprir.
Todos anseiam pela queda dos juros —de Lula às torcidas do Flamengo e do Corinthians. Mas Roberto Campos Neto tornou-se, a essa altura, um bode expiatório gasto. Em 31 de dezembro, ele estará livre para colocar o seu bolsonarismo a serviço da candidatura presidencial de Tarcísio de Freitas. Nem por isso o vermelho das contas nacionais será tingido de azul.
Ficaram entendidas duas coisas: 1) Nomeado por Bolsonaro, Campos Neto forneceu a munição usada contra ele ao participar, na semana passada, de um jantar oferecido em sua homenagem pelo governador bolsonarista de São Paulo. 2) Lula demora a perceber que as virtudes de um governante não estão no coldre. A unanimidade do BC deixou o presidente na incômoda posição de derrotado.
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