Dino sinaliza para Lira que o olimpo não dispõe de escada
Sócio fundador do orçamento secreto, Arthur Lira achou que seria uma boa ideia patrocinar no apagar das luzes de sua gestão uma penúltima manobra. Servindo-se das digitais de 17 líderes partidários, impôs ao Planalto o pagamento de R$ 4,2 bilhões em emendes orçamentárias de comissão sem o aval das comissões. O Legislativo foi ao recesso. Mas o ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino, alheio às férias do Judiciário, manteve a caneta em riste. Às vésperas do Natal, suspendeu novamente a liberação das verbas e determinou à Polícia Federal a abertura de inquérito para investigar o pedido da Câmara.
Parte das verbas que Dino mandou bloquear iria para Alagoas, o estado de Lira. Coisa de R$ 73 milhões. O ministro anotou em seu despacho que a pretensão da Câmara "não é compatível com a ordem constitucional". Lembrou as peculiaridades que marcam um novo escândalo de emendas que a Polícia Federal está esquadrinhando no Dnocs. Envolve contratos de R$ 1,4 bilhão. Dino mencionou "malas de dinheiro sendo apreendidas em aviões, cofres, armários ou jogadas pela janela" durante as batidas da PF.
Em fevereiro, quando o Congresso reacender suas fornalhas, Arthur Lira conhecerá as agruras da ex-presidência. Na semana passada, em discurso de despedida, disse que retornará ao "chão de fábrica". Sem mencionar o seu nome na decisão desta segunda-feira, Flávio Dino como que sinalizou para Arthur Lira que o olimpo não tem escada. A história mostra que ex-chefes da Câmara que não souberam se reinventar foram abatidos pela maldição da ex-presidência.
Marco Maia não conseguiu se reeleger deputado pelo Rio Grande do Sul. O paulista João Paulo Cunha, o potiguar Henrique Eduardo Alves e o carioca Eduardo Cunha fizeram escala na cadeia. O primeiro, carbonizado pelo mensalão, renunciou ao mandato. O segundo perdeu uma eleição para o governo do Rio Grande do Norte. O terceiro, artífice do impeachment de Dilma, foi afastado do cargo pelo Supremo antes de ser cassado pelos colegas. Rodrigo Maia, acossado pelo bolsonarismo nas redes sociais, desistiu de tentar a sorte das urnas no Rio de Janeiro.
Candidato ao Senado em 2026, Lira enxerga nas decisões de Dino uma interferência indevida do Judiciário no Legislativo. Para o virtual ex-soberano da Câmara, liminar boa não é a que trava os gastos da emendocracia, mas a que a bloqueia investigações, como fez Gilmar Mendes no caso das emendas de Lira que enviaram kits de robótica superfaturados para escolas alagoanas. Resta agora esperar que nenhuma toga amiga surja do nada para matar as provas de eventuais malfeitorias que a PF consiga identificar.
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