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Leonardo Sakamoto

Dilema de Doria em SP: agravar a pandemia ou perder votos no segundo turno

 Valter Campanato / Agência Brasil
Imagem: Valter Campanato / Agência Brasil

Colunista do UOL

26/11/2020 10h58

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Enquanto cresce o número de internações em UTIs por covid-19 e aumenta a velocidade de transmissão do coronavírus no Estado de São Paulo, o governador João Doria se vê diante de um dilema: endurece o isolamento social e assume o risco eleitoral de uma medida impopular às vésperas da eleição ou mantém a situação como está até depois do segundo turno e agrava a pandemia.

Ressalte-se que os municípios também poderiam adotar medidas de restrição, mesmo que o governo permita uma abertura maior. Mas, ao que tudo indica, o discurso segue alinhado.

"Não há necessidade de retroceder", repetiu o prefeito Bruno Covas, em sabatina do UOL e da Folha de S.Paulo, nesta quinta (26). Garantindo que os dados mostram "estabilidade da doença", ele disse que não faria "discurso alarmista em véspera eleitoral", nem afirmaria que a pandemia acabou. Ao se colocar como defensor de uma atitude equilibrada entre extremos, o prefeito quer fazer crer que a verdade não está em nenhum dos lados - os números, contudo, apontam o recrudescimento da covid-19.

O aumento do número de casos graves da doença estava previsto para o final do ano, mas aconteceu em meio ao segundo turno da eleição - que já havia sido postergada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por conta da pandemia.

O PSDB, partido de Doria, está no segundo turno não apenas na capital, com Bruno Covas, mas também em Mogi das Cruzes (com Marcus Melo), Piracicaba (Barjas Negri), Praia Grande (Raquel Chini), Ribeirão Preto (Duarte Nogueira), São Vicente (Solande Freitas) e Taboão da Serra (Engenheiro Daniel).

Desses municípios, apenas Ribeirão Preto não se encontra na fase verde do Plano São Paulo - que prevê reabertura controlada de praticamente todas as atividades.

Mas há um descompasso com a realidade da doença. Como apontaram Cláudia Collucci e Leonardo Diegues, em reportagem na Folha de S.Paulo, desta quinta (26), o centro de contingência para o coronavírus vai propor a Doria o endurecimento da quarentena.

Além do ranger de dentes causado por um retorno a um cotidiano mais restritivo, o que pode levar à perda de votos em uma população esgotada, há também o risco de a medida ajudar a afastar das urnas a parcela mais idosa do eleitorado - como ocorreu no primeiro turno com Bruno Covas.

O prefeito sofreu os efeitos de uma abstenção de mais de 29% na capital, tendo significativamente menos votos do que o previsto pelas pesquisas. Ele lidera por 62% a 28% entre quem tem mais de 55 anos. Já Boulos está na frente em quem tem até 24 anos: 50% a 39%, segundo o Ibope.

A pergunta posta à mesa é: se não houvesse eleição neste momento, o governo de São Paulo, que se vendeu como um contraponto responsável ao terraplanismo biológico do presidente da República, já não teria retrocedido na flexibilização da quarentena?

Não será uma surpresa se, na próxima segunda, uma dia após o segundo turno, houver um endurecimento das medidas na revisão do Plano São Paulo. E, independentemente da decisão que o governador e os prefeitos tomem a partir de agora, ela poderá vir tarde demais para muita gente.