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Leonardo Sakamoto

Bolsonaro diz que "pressa por vacina não se justifica". E por impeachment?

Bolsonaro ergue cloroquina para apoiadores                              - Reprodução/Facebook
Bolsonaro ergue cloroquina para apoiadores Imagem: Reprodução/Facebook

Colunista do UOL

19/12/2020 20h53

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"A pressa pela vacina não se justifica", afirmou Jair Bolsonaro neste sábado (19), ecoando a pergunta feita pelo ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, na última quarta, ao comentar a cobrança por um plano de vacinação: "Para que essa ansiedade, essa angústia?"

Suponhamos que o presidente da República não se importe com as mais de 186 mil vidas perdidas para a covid-19. Como ele mesmo já disse várias vezes, lamenta, mas a "morte é o destino de todo mundo". Até porque, como deixou bem claro, o receio de morrer de covid faz de nós um "país de maricas".

Bolsonaro deve considerar que, proporcionalmente, esse número de óbitos é eleitoralmente irrelevante frente aos mais de 65 milhões que receberam o auxílio emergencial - o que sustenta a alta em sua popularidade. Provisoriamente, claro, porque o auxílio está acabando, mas a pandemia não.

Desde o começo, ele se disse preocupado com empregos e com a economia - porque acredita que números ruins causarão impacto negativo em sua reeleição, em 2022. E, sob essa justificativa, pressionou para que milhões de brasileiros voltassem logo às ruas para comprar e procurar serviço. Muitos atenderam, o que tornou capengas muitas quarentenas e ajudou a arrastar a pandemia por mais tempo.

Sim, Bolsonaro manteve o fogo do vírus aceso jogando mais gente na fogueira.

Mesmo que essa suposição seja real, ou seja, ele não se importe com as pilhas de cadáveres da covid que começam a se acumular, novamente, nos necrotérios de hospitais, os seres humanos se preocupam. E isso vai levar a um novo endurecimento das regras de isolamento social. Afinal, a economia se fecha não porque as pessoas acham bonito, ou porque políticos querem atrapalhar seu governo, mas porque gente está se contaminando em linhas de produção e morrendo. Um grande exemplo disso foram os frigoríficos, vetor de contaminação no Sul do país.

O coronavírus irá parar de circular na sociedade, permitindo que a vida volte ao normal, depois que atingirmos a imunidade de rebanho. Ou seja, quando uma média de 70% da população tiver contraído o vírus ou tomado a vacina. Quanto mais tempo demorarmos para começar esse processo, mais tempo levaremos para atingir essa marca. A menos que ele queira que isso aconteça através da contaminação da população. Mas entraríamos no campo da psicopatia.

Se o país tivesse feito sua lição de casa, contratado antecipadamente milhões de doses de uma cesta de vacinas ao invés de apostar apenas na da Universidade de Oxford/AstraZeneca (que teve problemas em sua fase de testes) e se o país não tivesse gastado um tempo precioso atacando a vacina do laboratório chinês Sinovac, poderíamos estar começando a imunizar a população ainda neste ano. E, consequentemente, terminar o processo ainda em 2021.

Mas Bolsonaro rifou a saúde pública em nome da disputa eleitoral. E, com isso, rifou também a retomada dos empregos. A vacina não é garantia absoluta de que tudo ficará bem, mas é um passo fundamental. Sem ela, continuaremos nos afogando em ondas de covid.

Estamos com 14,1 milhões de desempregados, número que vai aumentar e diminuir com essas ondas.

"A pressa pela vacina não se justifica." Porque, segundo o presidente, isso coloca em risco a saúde da população. Inferiu que as vacinas podem não ser seguras, mesmo tendo passado em todos os testes. Talvez se esses testes tivessem sido revisados pela Universidade do WhatsApp e não pela comunidade científica, ele confiaria.

A pressa justifica-se, sim. Tal como a pressa para que os outros poderes da República evitem que Bolsonaro aprofunde ainda mais a tragédia, com sua inação e irresponsabilidade.

O problema é que ele já causou um estrago, em vidas e empregos, difícil de ser mensurado. E fez isso após ter neutralizado parte de instituições, como a Procuradoria-Geral da República e o Congresso Nacional, que, em uma situação de normalidade democrática, permitiriam que ele fosse removido do cargo antes que esse estrago acontecesse.

O que indica que o país tem duas doenças, mas uma das vacinas só estará à disposição em outubro de 2022.