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Leonardo Sakamoto

Covid negativo em teste de farmácia não é 'passaporte' para a ceia de Natal

Faltando menos de uma semana para o natal, consumidores lotam a região de comércio popular do Brás, no centro de São Paulo, neste sábado (19). - ROBERTO COSTA/ESTADÃO CONTEÚDO
Faltando menos de uma semana para o natal, consumidores lotam a região de comércio popular do Brás, no centro de São Paulo, neste sábado (19). Imagem: ROBERTO COSTA/ESTADÃO CONTEÚDO

Colunista do UOL

21/12/2020 15h10

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Muitos estão procurando testes de saliva ou de sangue em farmácias em busca de uma espécie de "passaporte" para a ceia de Natal ou para o encontro do Reveillón. Contudo, no que pese a importância de alguns desses testes para confirmar o diagnóstico de pacientes com sintomas de covid-19, eles não são uma garantia de que você, assintomático, não irá transmitir a doença - principalmente a pessoas idosas ou imunodeprimidas.

"Um 'passaporte' no sentido de uma certeza absoluta de que você pode utilizar para ir tranquilo nas festas de final de ano não existe", afirmou à coluna André Nathan, pneumologista do Hospital Sírio-Libanês e professor do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

"Nas primeiras 72 horas de sintomas, o teste tem menos sensibilidade. Portanto, a chance de vir negativo mesmo estando doente aumenta. Não é possível dar uma garantia que você não está contaminado, nem que não vai infectar ninguém", explica Nathan. "Nenhuma sociedade médica nacional ou internacional indica testes para passar o natal tranquilo", diz.

A forma menos arriscada seria manter um isolamento total sem sair de casa por dez dias antes de encontrar com familiares, segundo o Pneumologista. O que se tornou mais difícil para muitas famílias com a reabertura gradual da economia.

Diante disso, a recomendação dele e de outros especialistas é evitar festas e reuniões familiares o máximo possível, pois não há método 100% seguro. Segue a conversa.

Existe algum teste para covid que sirva como "passaporte" para as reuniões de final de ano?

Não existe. Porque nenhum teste tem 100% de sensibilidade, ou seja, de chance de vir positivo quando você já está contaminado. Apesar da sensibilidade ser de mais de 90% nos melhores testes, há chance você estar doente e o teste dar negativo mesmo assim. Por melhor que seja teste. Um "passaporte" no sentido de uma certeza absoluta de que você pode utilizar para ir tranquilo nas festas de final de ano não existe.

Para reforçar: se eu fizer um RT-PCR, o teste que coleta secreção nasal e oral com cotonete, considerado o teste mais preciso, e ele der negativo antes de ir a um jantar de Natal, é garantia de que não estou contaminado e não vou infectar alguém?

Termos como "certeza", "garantia" ou "passaporte" são muito duros quando falamos de medicina e exames laboratoriais. O que acontece é que temos alguma segurança de que aquele teste está certo. Mas você não tem uma garantia. Até por isso, quando um paciente começa a ter indícios da doença, o exame só é colhido no terceiro dia de sintomas. Se você teve febre, tosse, coriza, dor de garganta, perdeu olfato, hoje, só vou pedir para você colher o PCR no nariz em 72 horas, porque a chance é maior do teste vir positivo.

Nas primeiras 72 horas de sintomas, o teste tem menos sensibilidade. Portanto, a chance de vir negativo mesmo estando doente aumenta. Não é possível dar uma garantia que você não está contaminado, nem que não vai infectar ninguém.

Nenhuma sociedade médica nacional ou internacional indica testes para passar o natal tranquilo.

Os testes de saliva na farmácia, que detectam se estou com vírus, são tão precisos quanto o do cotonete feito em laboratório? Há muita gente que está fazendo esses testes da saliva dois dias antes do Natal para poder encontrar a família.

Estes testes de saliva na farmácia são piores do que os testes de cotonete de laboratório. Eles têm sensibilidade mais baixa. Então há uma chance maior de vir negativo e você estar doente.

Você pode me perguntar: "ah, então eles não servem para nada?" Não, servem para várias coisas. Como, por exemplo, fazer um diagnóstico de um paciente sintomático. Se estou com sintomas, tenho suspeita de estar com covid, faço esse teste e ele dá positivo, tenho meu diagnóstico.

Mas perde eficácia para detecção de covid em alguém que não demonstra ter sintomas. Não foi para isso que ele foi desenhado.

Se já tive covid, um teste de sorologia, feito com coleta de sangue em laboratório, que aponte que tenho anticorpos no organismo serve como passaporte para não infectar ninguém numa festa?

Se já teve covid, a chance de ter com de novo é muito pequena. Temos milhões de casos de covid no mundo, mas apenas algumas centenas de reinfecção. É muito pouco, mas não é zero. Ou seja, apesar de a chance ser muito baixa, não posso dizer que pelo fato de você já ter tido covid que não vai ter de novo.

Além disso, você pode estar "carreando" o vírus. É mais difícil, mas acontece. Você teve contato com alguém com covid com a mesma roupa ou teve contato físico e não se higienizou, pode contaminar por ser o "carreador" do vírus, mesmo não estando doente.

Os testes rápidos de sangue na farmácia, que detectam se eu já tive a infecção, são tão precisos quanto a sorologia?

Os testes de sangue na farmácia são inferiores em acurácia do que os exames de laboratório.

Por fim, se fico em isolamento total por uma semana posso encontrar pais e avós que também estão em isolamento total para o Natal ou foi Ano Novo?

O tempo de incubação do vírus é descrito entre três e dez dias. Claro que isso é uma média, há indivíduos que vão estar fora da média. Uma semana é um pouco menos do que seria recomendado em isolamento total para garantir que, mesmo assintomático, você não infecte ninguém.