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Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Irritado, Bolsonaro sabe que será abandonado se vantagem de Lula não cair

Colunista do UOL

08/06/2022 14h08

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Por quanto tempo setores do centrão vão ficar ao lado de Jair Bolsonaro se ele não demonstrar que pode ser útil na eleição de deputados federais, senadores e governadores em outubro? A compra da fidelidade de um naco do parlamento pelo governo vale apenas para evitar o impeachment ou levará o centrão até o fim ao lado de Jair, custe o que custar?

Essas perguntas devem estar pesando na cabeça do presidente da República diante de pesquisas como a Genial/Quaest, divulgada nesta quarta (8), apontando que Lula venceria no primeiro turno se a eleição fosse hoje, com quase 53% dos votos válidos. Ela confirmou o levantamento do Datafolha, que indicou que o ex-presidente venceria com 54%.

Não à toa, portanto, Jair fez um discurso mais destemperado que o normal na tarde desta terça em evento no Palácio do Planalto. Sim, a irritação era uma sinalizacão que precisava dar a seus seguidores após a 2ª turma do STF derrotar a liminar do bolsonarista Nunes Marques - que havia salvo o deputado Fernando Francischini, cassado por atacar o sistema eleitoral.

Mas não só isso. O tom foi tão alto que quase expôs os pensamentos do presidente, que está sentindo o peso de pesquisas eleitorais. Elas não indicam melhora em suas intenções de voto apesar de toda a energia que tem gasto nesse sentido.

Bolsonaro abandona o trabalho durante o expediente para fazer motociatas, carreatas, cavalgadas e afins, além de comícios e outros atos de campanha, inaugurando até obra inacabada. Bolsonaristas flodam redes sociais e aplicativos de mensagens com material, incluindo fake news. O governo transforma o Bolsa Família em Auxílio Brasil, libera FGTS, antecipa aposentadoria. Permite uma farra como nunca vista no Congresso Nacional, entregando bilhões via orçamento secreto para que os parlamentares usem em suas bases.

Mas com a disparada dos preços dos alimentos e dos combustíveis em meio a uma inflação insistente de dois dígitos, a queda de 7,9% no rendimento médio dos trabalhadores em um ano e uma retomada do emprego que não está produzindo postos de trabalho de qualidade, todas as ações do presidente acabam sendo insuficientes para reverter as pesquisas. O PIB cresceu 1% no primeiro trimestre? Ótimo, mas o povão não come PIB.

E, ainda por cima, nada melhora a situação de Jair a notícia escandalosa de que o número de famintos no Brasil subiu de 19,1 milhões para 33,1 milhões em menos de dois anos.

Se a situação não melhorar significativamente, o eleitor indeciso pode optar pela segurança material em vez do discurso de costumes e comportamento. De acordo com a Genial/Quaest, 62% dizem que conseguiam comprar mais com o salário sob o governo Lula, enquanto 10% dizem o mesmo para o governo Bolsonaro.

A base da política no Brasil não é nacional, mas regional. Acontece na relação de prefeitos com deputados, senadores e governadores. Para estes três últimos se elegerem em outubro, precisam de candidatos à Presidência que estabeleçam uma simbiose com eles, ou seja, os ajudam a conseguir votos e sejam ajudados por eles a conseguir votos.

Em alguns lugares, como a região Centro-Oeste, onde Bolsonaro está numericamente à frente de Lula segundo a pesquisa, candidatos querem aparecer ao seu lado. Mas, no Nordeste, quem disputa uma cadeira no Congresso, nas Assembleias e governos tende a fugir de Jair.

Pode-se dizer que isso já era esperado nessa região. Mas ele está 12 pontos abaixo de Lula no Sudeste também, o que dificulta a atração de candidatos para apoiá-lo. Jair corre o risco de ser abandonado em alguns locais antes mesmo de a campanha começar de fato.

Aqui importa o resultado de primeiro turno, até porque deputados e senadores não vão para uma segunda fase da eleição. Ainda que Jair se recupere em um provável segundo turno e vença, se ele não puder ser cabo eleitoral na primeira votação, muitos vão procurar quem possa. Ou pelo menos, buscar a neutralidade, que ajuda quem está na frente.