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Ao congelar CPI do MEC, Senado sugere a eleitores que ignorem corrupção
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O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e lideranças da casa produziram um Grande Dia para Jair Bolsonaro ao empurrar a CPI do MEC para um fictício "depois das eleições". Do tipo, fiado só amanhã. Ao mesmo tempo, enviaram um recado aos eleitores: desconsiderem a corrupção na decisão do seu voto.
Pacheco afirmou que a investigação vai acontecer "permitindo-se a participação de todos os senadores e evitando-se a contaminação das investigações pelo processo eleitoral". Esse discurso inverte os fatos, pois é o silêncio da câmara alta do parlamento que está contaminando o processo eleitoral neste momento, negando informação relevante aos cidadãos.
Os eleitores têm o direito a saber a razão de o Ministério da Educação ter, ao que tudo indica, se transformado numa plataforma de financiamento de amigos e aliados do presidente num momento em que todos os recursos e energias deveriam estar sendo gastas para tentar compensar o imenso atraso educacional deixado pela pandemia de covid-19 em crianças e adolescentes.
Temos dois pastores, um deles amigo do presidente da República, que cobravam propina em dinheiro, ouro e bíblias para garantir acesso privilegiado de prefeitos ao Ministério da Educação e aos fundos bilionários em um verdadeiro gabinete paralelo. Ambos visitavam regularmente o Palácio do Planalto e não era para ver a leveza da obra de Oscar Niemayer.
Temos um presidente da República que, após a queda do ministro da Educação, pode ter interferido na investigação da Polícia Federal sobre o caso, alertando o seu ex-assessor de que haveria operação de busca e apreensão contra ele. Detalhe que o próprio ministro reconheceu em áudio que o presidente pediu para atender a vontade dos pastores.
Temos uma base aliada do governo no Congresso Nacional que também usou o fundo bilionário do ministério para atender a seus interesses políticos e econômicos, gerando denúncias pela imprensa de sobrepreço na compra de kits de robótica (ironicamente em cidades com escolas sem água ou luz) e de ônibus rurais.
E também temos um Senado que, com a manobra, agiu como puxadinho do Palácio do Planalto.
A cúpula do Senado prometeu instalar outras CPIs que estavam na fila como sinal de equilíbrio. Bobagem. Governistas propuseram outra, para apurar obras inacabadas de creches, escolas e universidades durante o governo petista, apenas para tentar inviabilizar a CPI do MEC.
Mas se há irregularidades, que se apure tudo - o que, sinceramente, não interessa aos governistas.
O que foi feito com dinheiro que deveria ter sido gasto em educação? Foi parar em alguma igreja? No bolso de empresários amigos de parlamentares? Acabou desviado para financiar caixa 2 na campanha deste ano? Virou leite condensado e pão francês? Sem informação, a tomada de decisão do voto fica prejudicada.
O Senado tem dois terços de seus membros que não vão buscar a reeleição este ano, ou seja, mesmo que atuem na campanha de outras pessoas, há pessoal suficiente para tocar uma comissão como essa. Se não, é melhor que tirem licença não remunerada.
Mais do que ajudar o presidente da República postergando revelações que lhe são incômodas, a impressão é que o congelamento da CPI do MEC também quer esconder o que parlamentares fizeram com o dinheiro da educação. O atraso na instalação da comissão acaba soando como decisão em causa própria.