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Entidades pedem que Justiça proíba PM de usar corda e arame em abordagens
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Organizações sociais solicitaram à Justiça que a polícia de São Paulo seja proibida de usar cordas na abordagem de pessoas, como as que amarraram pés e mãos de um homem negro em posição de pau de arara na capital paulista último dia 4. Também exigem que seja vedado o uso de arames, fios, grilhões ou qualquer instrumento que não sejam algemas sob pena de multa.
A demanda foi protocolada, nesta sexta (9), pela Educafro e pelo Centro de Defesa de Direitos Humanos Padre Ezequiel Ramin em caráter liminar e urgente. Ela se junta à uma ação civil pública apresentada contra o Estado de São Paulo por entidades sociais cobrando indenização à sociedade de R$ 500 milhões pelo caso, mas também revisão de uso da força pelo poder público e mudança na formação de policiais.
O pedido afirma que a súmula vinculante número 11 do STF diz ser lícito o uso de algemas em caso de resistência, risco de fuga ou perigo ao policial ou a terceiros, mas em nenhum momento autoriza o uso de correntes, cordas, grilhões, fios metálicos ou quaisquer outros instrumentos para a imobilização durante abordagens.
"A sumula institui algemas como o único meio possível e imaginável, e sob diversas condições e restrições, para se conter uma pessoa. Ela não estabelece as hipóteses de uso de uma corda para amarrar, ainda mais naquela situação de tortura", afirmou à coluna o ex-juiz Márlon Reis, um dos advogados que assina a ação. Reis é conhecido por ter sido o relator da Lei da Ficha Limpa.
Segundo ele, o STF nem considerou a hipótese de que a pessoa seja amarrada ou presa com fios metálicos ou outros tipos de aparatos que não sejam os tecnicamente desenhados para essa situação. Algemas são mais do que eficazes para conter alguém.
O pedido de cautelar apresentado à Justiça afirma que a violenta técnica é chamada de "pacotinho" e faz com que o detido tenha dificuldade de respirar. Em vídeo que viralizou nas redes sociais, o homem amarrado por policiais urrava de dor.
A imagem remete ao chamado pau de arara, tortura empregada contra escravizados no período colonial, em campos de concentração nazista na Segunda Guerra e contra presos na ditadura militar brasileira. Contudo, a juíza Gabriela Marques Bertoli disse não haver provas de que o homem amarrado em São Paulo sofreu maus tratos ou foi vítima de tortura.
A caracterização de abuso é importante porque a prisão em flagrante feita de forma ilegal pode ser relaxada. O seu advogado José Luiz de Oliveira Junior, em entrevista ao UOL, nesta sexta, disse que o pedido de habeas corpus não havia nem sido apreciado ainda. Poderou que, se fosse um "figurão", ele teria sido solto mesmo rapidamente.
"O que a polícia estava fazendo com uma corda? Isso foge do procedimento operacional padrão da Polícia Militar", reclama o advogado.
De acordo com o pedido à Justiça feito pelas organizações sociais, "o ato de amarrar as mãos e os pés de um ser humano com cordas é profundamente repugnante, pois ultrapassa os limites do simples confinamento físico e adentra a esfera da humilhação, da desumanização e da perpetuação de estigmas históricos".
"Tal prática ignominiosa busca menosprezar a dignidade do indivíduo, evidenciando clara intenção de aviltar sua imagem e reforçar uma posição de superioridade daqueles que praticaram tais atos", afirma.