Letícia Casado

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Vivo e TIM ignoraram regra da Anatel que dificultaria plano de matar Moraes

O plano de militares para assassinar o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), foi organizado por meio de mensagens de aplicativo de celulares pré-pagos cadastrados em nomes de terceiros.

Eles conseguiram comprar chips da Vivo e da TIM usando dados de outras pessoas porque as operadoras não exigem o cadastro da biometria, descumprindo uma regra da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). A agência reguladora passou a exigir em 2021 que as empresas implementassem esse cadastro com identificação digital na hora de adquirir os chips.

"Desde novembro de 2021, no curso do Projeto Cadastro Pré-Pago, há exigência de implantação da ID Digital, como parte do processo de validação cadastral, no qual o consumidor precisa, além de informar seus dados pessoais, enviar uma foto sua (selfie) e do seu documento de identificação", informa a Anatel.

O plano de assassinato foi executado —e abortado— em dezembro de 2022. Ou seja, um ano depois do que foi determinado pela agência reguladora.

A Anatel informa que instaurou um procedimento administrativo para avaliar as medidas adotadas por parte das operadoras. A agência vai avaliar as ações das companhias no cadastro de titulares de linhas móveis pré-pagas, "conforme o disposto no artigo 1º da Lei nº 10.703/2003 e na regulamentação vigente, especialmente, sobre a manutenção da base cadastral deste serviço correta e atualizada, bem como a implementação de medidas preventivas contra fraudes de subscrição".

No relatório enviado ao ministro, a Polícia Federal aponta que a Claro exigia a biometria e, por isso, os números da operadora não foram utilizados no esquema.

Fraude de dados nos telefones pré-pagos

Na decisão do ministro Alexandre de Moraes que determinou a prisão dos militares e autorizou a operação, a PF mostra como era o esquema de fraude.

De acordo com os investigadores, o grupo usou codinomes de países que disputaram a Copa do Mundo de 2022 para ocultar as reais identidades. O procedimento é chamado de anonimização.

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"A referida estratégia de utilização de dados de terceiros é chamada de 'anonimização', que, segundo a Polícia Federal, é 'técnica empregada na doutrina de Forças Especiais do Exército para não permitir a identificação do verdadeiro usuário'", escreveu Moraes na decisão.

Em um dos casos, os militares roubaram a identidade de um homem após um acidente de trânsito e cadastraram um chip no dia 8 de dezembro de 2022 — uma semana antes de a operação para matar o ministro ser deflagrada.

Todos os envolvidos usaram codinomes para conversar no grupo "Copa 2022". Foram escolhidos os países "Alemanha", "Argentina", "Brasil", "Áustria", "Gana" e "Japão".

A investigação mostrou que os militares cadastraram esses codinomes com chips usando dados de homens que moram em Alagoas, Bahia e Belo Horizonte.

Segundo a PF, os tenentes-coronéis Rafael Martins de Oliveira e Rodrigo Azevedo seriam "Japão" e "Áustria", respectivamente. Eles foram alvo da operação na terça (19), assim como o general da reserva Mario Fernandes, o tenente-coronel Hélio Ferreira Lima e o policial federal Wladimir Matos Soares.

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Imagem: Reprodução
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Setor diz cumprir legislação

As empresas Vivo e TIM não responderam às perguntas enviadas pela coluna e informaram que a Conexis Brasil Digital, representante do setor, forneceria informações conjuntas.

A Conexis informou que as empresas associadas "investem de forma recorrente, em conformidade com a legislação vigente, em diversas tecnologias de segurança e prevenção a fraudes para proteção de seus clientes e da sociedade".

A nota diz, ainda, que o cliente pode procurar no site se seus dados estão sendo utilizados de forma indevida: "Também disponibilizam consulta para os clientes verificarem habilitação indevida em seu nome, pelo Portal de Consultas: cadastropre.com.br. Os usuários também podem, se necessário, entrar em contato com a prestadora para efetuar o cancelamento. As empresas ressaltam que estão à disposição para cooperar com as autoridades e reforçam o compromisso com a segurança e privacidade de seus clientes."

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.