Topo

Thaís Oyama

Teorias conspiratórias, fake news e amigos inteligentes que caem nas duas

Sim, era fake também - Reprodução
Sim, era fake também Imagem: Reprodução

Thais Oyama

Colunista do UOL

28/03/2020 12h02

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Recebi uma mensagem por Whatsapp de uma douta amiga a quem reputo QI bem acima da média. Um juiz lhe dizia ter "ouvido falar" que médicos de São Paulo estariam atestando óbitos por coronavírus mesmo em pacientes que morreram sem passarem por testes. Por trás disso, estaria a intenção de inflar as estatísticas mais trágicas de modo a enfraquecer o presidente Bolsonaro e fortalecer o governador João Dória.

Perguntei à amiga se ela achava mesmo que médicos arriscariam sua reputação e seu CRM para "ajudar" o governador de São Paulo. Ela respondeu que também havia achado a tese "improvável". Um segundo depois, teclou de novo: "Para não dizer, impossível". E finalmente: "Acho que estou perdendo o senso crítico".

A neurociência já mostrou que as pessoas têm mais facilidade em acreditar naquilo em que já estavam predispostas a crer ou que gostariam que fosse verdade. Nesse caso: 1) estão usando a pandemia para atacar Bolsonaro; e 2) a pandemia não vai matar tanta gente como dizem.

É o chamado viés de confirmação, que também ajuda a explicar, em parte, porque as pessoas disseminam "informações" como a de que lança-perfume cura a Covid-19; idosos que saírem de casa terão o pagamento da aposentadoria cancelado; e institutos que são referência de pesquisa científica no mundo não sabem fazer contas (a propósito: Neil Ferguson, do Imperial College de Londres, NÃO admitiu que revisou a previsão de 500 mil britânicos mortos pelo coronavírus para 22 mil - os números se referem a cenários diferentes: o primeiro sem medidas de isolamento e o segundo com).

Quando toda essa desgraça passar, algum legado positivo restará e, nesse momento, é possível que cresça a valorização da imprensa profissional. Aquela formada por jornalistas que, além de compromisso com o leitor, têm chefes, são por eles cobrados quando erram e podem inclusive ser demitidos se erram feio ou usam de má fé — apenas algumas características que os distinguem dos franco-atiradores da internet. Quando se trata de notícias, profissionais da imprensa são melhores que eles não porque são da imprensa, mas porque são profissionais.

Em época de resfriado, um chazinho ou mandinga prescrita pela vizinha pode resolver. Em época de coronavírus, melhor recorrer aos especialistas.

E um pouco de senso crítico também ajuda.