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Bolsonaro aposta na jurisprudência do caso Temer para não ficar inelegível
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Nesta semana, Bolsonaro terá a sua inelegibilidade declarada na ação de investigação judicial eleitoral, em tramitação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Para se chegar a essa conclusão, não há necessidade de posse de esfera de cristal. Desnecessário também consultar a Mãe Dinah da vez, numa referência àquela apresentada como vidente e que se candidatou ao cargo de vereadora e, por ironia do destino, perdeu a eleição.
As provas contidas no processo eleitoral decorrente da ação de investigação judicial eleitoral são contundentes.
Mais ainda. O pano de fundo que Bolsonaro pretende afastar do cenário probatório desvirtua o papel da Justiça Eleitoral.
1. Victimless
Com base na doutrina criminal norte-americana chamada de 'victimless' (a significar ser vítima de si próprio), Bolsonaro produziu, aos montes, prova de afronta à legislação eleitoral.
Bolsonaro foi vítima dele mesmo: tiro no próprio pé.
Existe registro de tudo. Prova farta e induvidosa.
Bolsonaro desviou-se da função. Abusou do seu poder político e usou de instalações oficiais, palacianas, para dar solenidade e peso à sua trama criminosa.
O ex-presidente quis se colocar no lugar da Justiça Eleitoral — e isso é grave. E disse mentiras aos embaixadores e aos adidos de representações estrangeiras convocados. Isso ao sustentar fraude nas urnas de votações e consequente resultado viciado.
Para quem tem olhos de ver e vontade de enxergar, Bolsonaro tentava justificar, aos países estrangeiros, um futuro golpe de Estado.
A lembrar que a Justiça Eleitoral nasceu em 1932 para combater fraudes, abusos. A garantir igualdade entre os concorrentes e a posse do escolhido pela vontade dos cidadãos (eleitores), como convém num estado democrático de direito.
2. Pano de fundo
No campo probatório existe, a servir como pano de fundo, um conjunto concatenado de comprovações a demonstrar a verdadeira intenção de Bolsonaro. No popular, preparar o clima internacional para "melar" a eleição e manter-se no poder.
Para alguns operadores do Direito, Bolsonaro pretende reduzir o campo de exame das provas. E invoca jurisprudência do TSE.
Busca-se uma comparação com o caso de abuso imputado à chapa Dilma e Temer (Aije 194358). Essa referida ação de investigação judicial eleitoral foi rejeitada por 4 votos a 3, e Temer acabou mantido presidente da República.
O julgamento foi juridicamente considerado escandaloso.
O relator Gilmar Mendes atuou como inquisidor estilo Torquemada para responsabilizar Dilma. Quando do julgamento, no entanto, Dilma já havia sido cassada por impeachment.
Aí, o jogo virou, e Gilmar Mendes, no seu voto, afastou a inelegibilidade de Temer, que já estava empossado na presidência. Estranho! Dilma, pelo voto de Gilmar Mendes, aparentava cassada pelos abusos. Temer, da mesma chapa e beneficiado, mudou a bússola orientadora do voto do ministro Gilmar Mendes.
Os bolsonaristas recordam desse julgamento. No caso, afirmam os operadores bolsonaristas das leis, foram desconsideradas provas juntadas a respeito de fatos novos e posteriores. Fatos não mencionados fora de representação ensejadora da abertura da ação de investigação judicial eleitoral.
Bolsonaro, por exemplo, não deseja que sejam consideradas provas sobre o 8 de janeiro golpista e nem sobre a minuta apreendida com o seu ex-ministro da Justiça. Nem os discursos de 7 de setembro de 2021 e de 2022.
Numa apertada síntese, não se quer o pano de fundo amplo. Objetiva-se fazer a Justiça não enxergar o todo golpista.
3. A jurisprudência
Abertamente sustenta-se haver jurisprudência — a do caso Dilma-Temer — a favorecer Bolsonaro.
Em outras palavras, almeja-se tirar do cenário o pano de fundo e limitar a utilização da prova ao encontro subversivo com convocados embaixadores e adidos estrangeiros. Invoca-se a representação feita pelo PDT, limitada à convocação com os diplomatas estrangeiros.
Aí, segundo os mencionados operadores pró-Bolsonaro, só teria havido mera opinião do ex-presidente, tipo esperneio em disputa equilibrada. Fato isolado, que não geraria inelegibilidade pela inexistência de condutas abusivas.
O saudoso e grande jurista Theotônio Negrão ensinava, numa referência aos tribunais brasileiros, existir jurisprudência para todo o gosto. Seria fácil encontrar jurisprudência para apoiar qualquer tese defensiva.
O Direito Sumular decorreu, em parte, da necessidade da uniformização da jurisprudência. Existem súmulas aplicáveis e os demais tribunais superiores ou inferiores a seguem. E súmulas, é bom ressaltar, porque existe sempre jurisprudência a abrigar a tese defensiva escolhida.
Atenção! A jurisprudência do TSE, apelidada de Temer, e garantidora da permanência dele na presidência, na verdade, e com o devido respeito, reduziu ao formalismo o papel da Justiça eleitoral.
Um processo eleitoral iniciado por uma ação de investigação judicial deve chegar à verdade real.
Não se pode contentar-se — na Justiça Eleitoral da transparência e do realmente acontecido — com a verdade apenas formal. Com o formalismo e o reducionismo.
A lembrar, no supracitado caso Dilma-Temer, ter o relator, ministro Hermann Benjamin, pelo seu voto denso e substancioso, entendido pela consumação de abuso de poder político e econômico, a violar a chamada "par condictio", ou melhor, a igualdade entre os concorrentes em eleições.
Pedido de vista não deverá acontecer
O Regimento interno do TSE conta com essa previsão, mas o presidente da Corte, ministro Alexandre de Moraes, poderá designar data para prosseguimento do julgamento, a evitar a chamada "gaveta-amiga".
Fora disso e em processos eleitorais de repercussão, os demais ministros costumam antecipar os seus votos e o resultado fica estampado, quando há pedido de vista dos autos.
O conhecimento dessa regra costumeira poderá constranger o ministro Nunes Marques, de perfil filobolsonarista e apontado como eventual ministro a solicitar vista dos autos processuais.
Pano rápido
Não à toa Bolsonaro está desesperançoso com o resultado projetado que levará à sua inelegibilidade por 8 anos, a contar da data da eleição. Seus seguidores, como destacado pelo Olhar Apurado de ontem, não se conformam com a sua passividade. Talvez, Bolsonaro comece por aí a vestir panos de vítima.
Contorcionismos jurídicos, como no caso da chapa Dilma-Temer, não deverão ocorrer, e o pano de fundo também influenciará as decisões.
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