Wálter Maierovitch

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Opinião

Votar não deveria ser obrigatório; votos brancos e nulos sequer contam

Num sistema de voto direto, a introdução de dois turnos em grandes centros urbanos significou aperfeiçoamento democrático.

Mas, o Brasil precisa dar outro passo.

Obrigar o cidadão a votar, quer no primeiro, e especialmente no segundo turno, não é democrático.

O cidadão, numa democracia liberal, tem o direito de não se interessar em votar. Por exemplo, aguardar a decisão da maioria dos que se dispuseram a votar ou ficar em casa por não se entusiasmar com os candidatos apresentados pelos partidos políticos.

Vamos a um exemplo prático. Na esquisita eleição paulistana, onde a Justiça eleitoral errou ao não impedir cautelarmente o desqualificado Pablo Marçal de concorrer, a candidata Tabata Amaral ocupou o quarto lugar com 605.498 votos.

Muitos dos seus eleitores não migrarão os votos para os dois finalistas, Ricardo Nunes e Guilherme Boulos. Apertarão na urna eletrônica o botão do voto em branco ou digitarão um número inválido para gerar nulidade.

Nos dois casos, branco e nulo, os votos não serão considerados válidos. Em resumo, serão um nada.

A obrigatoriedade, na hipótese, é incivil, pois o cidadão irá se deslocar à zona eleitoral para não ter o voto validado.

A lembrar que ainda temos doutrinadores, mundo afora e nos campos do direito constitucional e eleitoral, a considerar o voto um dever cívico.

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Cívico, pasmem, quando a escolha, branco ou nulo, não valerá nada.

Atenção: não passa de lenda a afirmação de ocorrer anulação da eleição quando brancos e nulos representarem a maioria.

A lembrar. Certa vez, na França, muitos eleitores, tendo em vista a qualidade dos concorrentes, preferiram permanecer em casa ou ir à praia.

Não fossem o segundo turno e a consciência cívica, a direita radical, de matriz nazifascista com Jean-Marie Le Pen e a filha Marine à frente, teria ganho.

Daí, surgiram — entre os que defendem a obrigatoriedade do voto — os que passaram a falar na existência do "partido abstencionista".

Os mais exagerados, ainda no tema da obrigatoriedade do voto, destacam o ato de votar como dever ético dos que vivem em país democrático.

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A levar o dardo da participação mais adiante, temos os seguintes argumentos tirados dos constitucionalistas italianos - onde a eleição do presidente da República é feita pelos parlamentares: a obrigatoriedade serve para unir a comunidade; outorga legitimação às instituições; reconhece o valor democrático da representação popular.

Com efeito. Aqueles obrigados a votar e que não votarão nem em Nunes, nem em Boulos, terão apenas de "cumprir tabela", como se diz em linguagem futebolística quando a partida não vale nada em termos de liderança.

Democracias maduras

Como regra, o voto no Brasil é obrigatório e gera sanções. Muitos juristas brasileiros consideram a obrigatoriedade legítima por tratar-se de dever legal.

Outros — e volto à bandeira da democracia liberal, e a exemplificar com democracias consolidadas, por exemplo, EUA e Reino Unido — consideram o ato de votar um direito que pode não ser exercitado: direito de ter voto, sem obrigação de ir votar.

Em outras palavras, concluem ser legítimo não se interessar diante do quadro eleitoral apresentado: partidos incapazes de oferecer candidatos e motivar os eleitores. A abstenção estaria a significar maturidade e civilidade.

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Atenção. No longo período do fascismo italiano (1922 a 1943), Mussolini não só impôs o voto obrigatório. Era crime não comparecer para votar.

Tem mais, o voto é obrigatório nas ditaduras e em regimes de partido único, como ocorre na República da China.

Num pano rápido. Votar deve ser visto como um direito do cidadão, mas não sendo obrigação-dever o comparecimento.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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