A 10 dias do 2º turno, Bolsonaro insiste em mentiras sobre vacina e fome
A dez dias do segundo turno das eleições presidenciais, o presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a mentir sobre a pandemia de covid-19, o atraso na compra de vacinas e sobre dados da fome no Brasil durante entrevista ao podcast Inteligência Ltda na noite desta quinta-feira (20). Ele também repetiu desinformação sobre um ritual indígena ianomâmi em que, ao contrário do que diz Bolsonaro, não ocorre canibalismo. Confira a checagem:
Nenhuma vacina foi vendida em 2020. Não tinha vacina. Começou a cobrança de vacina pra cima de mim. Não tinha vacina em 2020. Não tinha em lugar nenhum.(...) Me aponte qual país do mundo comprou uma dose de vacina. A primeira vacina foi em dezembro de 2020. A primeira vacina aplicada no mundo foi no Reino Unido em 2020."
É falso que não havia vacinas à venda em 2020. Não havia imunizantes à venda em março de 2020, quando a OMS (Organização Mundial de Saúde) declarou a pandemia. Mas as vacinas começaram a ser oferecidas dois meses depois ao Brasil, de acordo com o relatório final da CPI da Covid. O documento aponta que houve atraso na compra de imunizantes, o que inviabilizou o início da vacinação do país já em dezembro, quando a primeira pessoa foi vacinada no mundo, no Reino Unido.
O Brasil também teria recebido as primeiras remessas da Pfizer em dezembro se um acordo tivesse sido fechado com a empresa, segundo afirmou à CPI o CEO na América Latina, Carlos Murillo. Ele disse que o governo brasileiro ignorou três ofertas para aquisição de vacinas em agosto de 2020, e que as negociações haviam começado em maio.
Além disso, cerca de 50 países começaram a vacinação antes do Brasil em dezembro de 2020, ou seja, compraram o imunizante em 2020. Apenas na América Latina, Chile, México e Costa Rica começaram as campanhas de vacinação antes do Brasil. No dia 24 de dezembro, quando esses países começaram a vacinar, o Brasil ainda não tinha previsão de quando começaria a campanha.
Por que os presos que vivem amontoados não morreram [de covid-19]? Onde é que houve morte em presídio, meu deus do céu? O que que eles tomavam? Remédio pra chato, que dá nos pelos pubianos."
Falso. Não é verdade que presos não morreram de covid-19 porque se medicavam com remédio para chato. Houve, sim, mortes de covid nas prisões brasileiras. De acordo com o boletim de monitoramento de covid nas prisões do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), foram registradas até setembro deste ano, 695 mortes: 339 de pessoas presas e 356 de servidores.
Ele [João Doria] não comprou nenhuma dose, foi tudo o governo federal."
Falso. O então governador de São Paulo, João Doria, assinou em setembro de 2020 um contrato de US$ 90 milhões para a compra de 46 milhões de doses de CoronaVac, vacina contra covid-19 produzida pelo laboratório chinês Sinovac. Uma parceria entre a farmacêutica e o Instituto Butantan para a produção de vacina em São Paulo já havia sido fechada em junho. Na época, Doria já havia se convertido de antigo apoiador (durante a eleição de 2018) a desafeto e futuro concorrente de Bolsonaro, por ser cotado para a disputa presidencial pelo PSDB. Bolsonaro lançou dúvidas sobre o imunizante por ser de origem chinesa.
O primeiro lote da vacina chegou a São Paulo em novembro de 2020. Em dezembro, o governo afirmou que incluiria a CoronaVac no plano de imunização nacional contra a covid-19. A CoronaVac foi a primeira vacina a ser aplicada no país, no dia 17 de janeiro, na mesma tarde em que foi aprovado o uso emergencial pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Naquele momento, o Instituto Butantan tinha à disposição 10,8 milhões de doses da vacina em solo brasileiro. A vacinação simbólica ocorreu na cidade de São Paulo (SP), antes que o governo federal distribuísse as doses para outros estados.
Tem fome? Tem. Mas não nesse número que o Lula prega. O que o Lula fala, ele chuta números. (...) Ele sempre fala que tem 30 milhões de pessoas passando fome."
Falso. Dado de que 33 milhões de pessoas passam fome no Brasil não é de Lula. O número consta na segunda e mais recente versão do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia de Covid-19 elaborado pela Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional), segundo o qual 33 milhões de brasileiros vivem em situação de insegurança alimentar grave, ou seja, fome.
A pesquisa foi elaborada pela Rede Penssan com execução do Instituto Vox Populi, e apoio da Ação da Cidadania, ActionAid, Fundação Friedrich Ebert Brasil, Ibirapitanga, Oxfam Brasil e Sesc São Paulo.
A metodologia. A pesquisa foi feita a partir de entrevistas face a face em domicílios representativos das 5 regiões brasileiras, incluindo todos os 26 estados e o Distrito Federal em áreas rurais e urbanas. A amostragem foi de 12.745 domicílios. O intervalo de confiança é de 95%.
Eles cozinham o índio com banana e depois a aldeia come o índio."
Falso. Bolsonaro voltou a repetir declaração dada à entrevista do New York Times em 2016, que viralizou há duas semanas, com inverdades sobre o povo indígena ianomâmi do Surucucu (RR). Os ianomâmis não praticam canibalismo. Bolsonaro distorce um ritual fúnebre desses indígenas.
O ritual, chamado Reahu, dura vários dias, envolvia a cremação do corpo do falecido e o consumo das cinzas — e não da carne — em mingau de banana-da-terra. Mas segundo o filho do xamã ianomâmi Davi Kopenawa, Dário Kopenawa, os ianomâmis já não consomem mais as cinzas com mingau e sim as enterram em uma celebração coletiva.
O número de morte de gay aumentou ou diminuiu no meu governo? Diminuiu."
Falso. As mortes violentas de pessoas LGBTQIA+ aumentaram 33,33% no Brasil em 2021, na comparação com 2020. O dado é do dossiê do Observatório de Mortes e Violências contra LGBTI+.
Desde o ano 2000, maior número de casos foi registrado em 2017, quando houve 445 mortes violentas de pessoas LGBTQIA+. O número teve uma pequena queda no ano seguinte (420), em 2019 (329) e em 2020 (237), mas voltou a crescer no ano passado, quando 316 pessoas LGBT+ foram vítimas desses tipos de crime.
O dossiê é produzido pelas organizações Acontece Arte e Política LGBTI+, ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) e a ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos).
Agora no parlamento europeu, uma diretora da Pfizer foi questionada e ela respondeu se as pessoas inoculadas com a vacina poderiam ou não transmitir o vírus, se foi feito um teste no tocante a isso. Ela respondeu que não. (...) a própria diretora da Pfizer falou que não foi feito nenhum teste até hoje se a pessoa vacinada com a Pfizer pode ou transmitir o vírus, e na verdade transmite."
Bolsonaro reproduz fake news sobre a vacina. A informação de que a diretora da farmacêutica Pfizer assumiu que não foi feito nenhum teste sobre a transmissibilidade do coronavírus antes da vacina entrar no mercado é distorcida, porque esse nunca foi um dos critérios para aprovação do imunizante. Ela realmente afirmou isso, porém não havia exigência para um teste desse tipo: para o uso emergencial na União Europeia era necessário comprovar que a vacina era segura e que teria eficácia de, pelo menos, 50%.
O objetivo das vacinas contra covid-19 era impedir a evolução da doença para formas graves. A vacina não impede a infecção pelo vírus, nem a transmissão de pessoa para pessoa - e esses não foram critérios para a aprovação do imunizante.
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