Autismo não tem cura, ao contrário do que diz Tarcísio
O autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento, condição para a qual não há cura, ao contrário do que afirmou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, na quarta-feira (8) ao justificar o veto total ao projeto de lei 665/2020, aprovado pela Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo). O texto estabelece prazo de validade indeterminado ao laudo médico pericial que atesta o TEA (Transtorno do Espectro Autista).
O governador se retratou nesta sexta-feira (10).
O que diz o veto?
A atribuição de prazo de validade indeterminado aos laudos médicos que atestem o transtorno do espectro autista (TEA) fere o princípio da igualdade, uma vez que os laudos médicos de inúmeras outras doenças igualmente permanentes não são assim considerados."
Diário Oficial de quarta (8)
Autismo é doença: falso. Autismo não é doença, mas uma deficiência, como reconhece a lei 12.764/2012 —chamada Lei Berenice Piana.
- A OMS define o transtorno como "um diverso grupo de condições caracterizadas por algum grau de dificuldade na interação social e na comunicação" (leia a íntegra, em inglês, aqui);
- O CDC, agência nacional de saúde dos EUA, classifica "como uma deficiência de desenvolvimento provocada por diferenças no cérebro" (leia a íntegra, em inglês, aqui);
- O Ministério da Saúde afirma que se trata de "um distúrbio caracterizado pela alteração das funções do neurodesenvolvimento do indivíduo, interferindo na capacidade de comunicação, linguagem, interação social e comportamento".
O transtorno do espectro autista 'diagnosticado precocemente até os cinco anos e onze meses de idade é mutável, podendo mudar tanto de gravidade como até mesmo deixar de existir'."
Diário Oficial de quarta (8)
Na decisão, Tarcísio atribui a afirmação à área técnica de saúde mental da Secretaria Estadual da Saúde.
Autismo é mutável até 5 anos e 11 meses: falso. O diagnóstico de autismo não é mutável. Quanto mais precoce o diagnóstico, maiores as chances de desenvolvimento da criança, mas não de cura.
É possível ter um diagnóstico estável e seguro aos 16 meses, conta a neuropsicóloga Joana Portolese, coordenadora do programa de diagnóstico do TEA do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP).
A intensidade das manifestações do transtorno pode variar ao longo de toda a vida do autista, dependendo dos estímulos aos quais a pessoa é exposta e das características próprias de cada uma (comorbidades, genética etc).
A variação não é necessariamente linear e progressiva, e pode ocorrer por influências dos estímulos recebidos, como o tipo de acompanhamento, e também por influência de medicamentos (para crises emocionais ou distúrbios do sono, por exemplo), como diz a neuropsicóloga Yasmine Martins, mestre em ciências da saúde infantil.
No início da pandemia de covid-19, o desenvolvimento de muitos autistas sofreu prejuízos, entre outros motivos, por causa da quebra de rotina e da suspensão ou da mudança de formato das consultas.
As críticas ao veto de Tarcísio se dão pela falta de acompanhamento —e da consequente perda de estímulos— enquanto se espera a atualização do laudo.
Autismo pode deixar de existir: falso. O autismo é uma deficiência, uma condição permanente. É possível estimular o desenvolvimento dos autistas por meio de acompanhamento de uma equipe multidisciplinar especializada, mas ninguém deixa de ser autista.
A intervenção precoce atua para amenizar as manifestações do transtorno e ampliar a autonomia e a capacidade de aprendizagem. "Mas isso não significa cura", reforça Portolese.
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