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Menina sequestrada pela mãe não sabe que ela está presa em Londres

Rafaely com o pai, Rafael Isidro Vieira, e a madrasta, em Londres; a menina é alvo de disputa entre os pais - Arquivo pessoal
Rafaely com o pai, Rafael Isidro Vieira, e a madrasta, em Londres; a menina é alvo de disputa entre os pais Imagem: Arquivo pessoal

Renan Antunes de Oliveira

Do UOL, em Florianópolis (SC)

16/01/2013 06h00

A menina Rafaely, 8, cuja guarda é disputada pelos pais brasileiros na Justiça britânica, foi informada por familiares que a mãe está no Brasil, quando na verdade ela está na cadeia de Holloway, em Londres, onde aguarda julgamento.

Rafaely assistiu a prisão da mãe em 1º de novembro, no aeroporto de Heathrow, mas não entendeu bem o que se passava. A mãe dela, Fernanda Guiguer, 28, e o atual marido, Wagner Santos, foram acusados pelo ex-marido Rafael Isidro Vieira, 30, de sequestrar Rafaely.

Como os três foram retirados do avião pela polícia no momento em que tentavam viajar para o Brasil, Rafaely presumiu que a mãe tinha continuado a viagem. Assistentes sociais da polícia inglesa Scotland Yard levaram a menina na madrugada da prisão, em 1º de novembro, para a casa de Rafael, em Londres, onde ela está até agora.

A disputa pela guarda começou em 2007, no divórcio em Criciúma (200 km de Florianópolis). Pela certidão, Rafaely ficaria com a mãe. O documento já foi apresentado à polícia inglesa, mas ainda não foi validado porque todos os demais envolvidos têm cidadania européia, exceto Fernanda --o que é uma desvantagem para ela.

"Eu quero minha filha e vou ficar com ela", afirmou Rafael, por e-mail.

Em Santa Catarina, Magda Souza, mãe de Fernanda, disse que a filha desfilava roupas para sua loja própria, antes de viajar para a Itália. E que lá buscava prosseguir na carreira de modelo com fotografia de moda:

"Minha filha é muito bonita e fotogênica. Nas horas vagas, ela era esteticista", garantiu a mãe.

Vida em Londres

Enquanto aguarda a decisão da Justiça Rafaely vive numa casa com o avô José Vieira, 52, com a avó postiça Patrícia, 41, o pai Rafael, a madrasta Daisy Vieira, 27, o tio Guilherme, 16, irmão de Rafael com a primeira mulher de José, e um sobrinho de oito anos, filho do segundo casamento do avô.

Todos os adultos trabalham numa mesma rede de academias, em serviços gerais. Eles se revezam na guarda dela. A menina estuda na Chestnut Primary School, do bairro Tottenham.

Segundo o pai, a menina se dá bem com a madrasta e é feliz na casa.

Os Vieira disseram já ter recebido várias visitas sem aviso prévio de assistentes sociais do governo, com uma tradutora própria para as conversas com a menina.

Ainda conforme eles, o pessoal se fecha na sala com a criança para seus interrogatórios: "Se eles tivessem sentido qualquer problema aqui, já a teriam tirado de nós", diz o Vieira avô.

José Vieira promete "arrasar com Fernanda na próxima audiência judicial [marcada para algum dia de março a ser confirmado] para garantir que meu filho fique com a guarda dela".

Ele afirma que "minha nora era uma prostituta, a menina viu coisas horríveis na casa dela em Milão, por isso não vou deixá-la sair daqui nunca mais. E como nós temos cidadania européia, a lei nos protegerá".

Vieira é foragido da Justiça brasileira. Ele foi condenado em Itapema (60 km de Florianópolis) por tentativa da assassinato da ex-mulher, em 2003. Hoje, por telefone, ele disse que seu advogado entrou com um recurso contra a condenação.

Minimiza o crime do pelo qual foi condenado: "Eu só deixei ela amarrada uns 10 minutos". Vieira torce para o caso prescrever: "Basta eu ficar em Londres até 2019".

Vieira diz que nenhum dos membros da família pretende voltar ao Brasil. "Tenho cidadania europeia porque minha mãe era filha de italianos. Minha esposa, meus filhos e minha neta têm a cidadania. Minha nora só tem uma permissão de trabalho, deve ser extraditada."

Entenda o caso

Fernanda casou em 2003 com o músico aspirante Rafael. No ano seguinte, os dois tiveram Rafaely.

O casal se divorciou em 2007. A menina ficou sob a guarda da mãe. No mesmo ano, Rafael foi morar no eixo Londres-Milão.
Em 2010, Fernanda e Rafaely também se mudaram para a Europa, para Milão. Rafaely passava alguns meses por ano em Londres com o pai e a família do avô paterno.

Em algum momento houve um conflito e o sogro teria exigido que Rafael tomasse a guarda da criança em definitivo.

José Vieira distribuiu fotos da ex-nora na internet afirmando que ela se prostituía na Itália, sob os nomes de Layla e Caroline, o que seria prejudicial para a menina.

Em julho do ano passado, nas férias escolares, a menina foi para uma de suas visitas a Londres. Ao final do período, Rafael não quis devolver Rafaely para a mãe. A confusão começou. Fernanda foi a Londres e pediu ajuda do Consulado Brasileiro para tentar resgatar a menina.

Policiais ingleses ajudaram na tarefa, mas os Vieira não foram encontrados em casa. Ela desistiu temporariamente. Em outubro, Fernanda voltou a Londres em sigilo, fez campana na casa do sogro e pegou a filha quando ela saiu com o tio Guilherme. Fernanda viajou de carro pelo túnel sob o Canal da Mancha, uma travessia de três horas, levando a menina.

Enquanto mãe e filha viajavam, Rafael e o pai correram à Scotland Yard para denunciar o caso como sendo um sequestro.
A polícia demorou a se mexer. Quando o fez, as duas já estavam do outro lado do túnel, em direção a Itália. De lá, em 1º de novembro, Fernanda tentou voar para o Brasil, na viagem abortada em Londres.