Polícia do RJ mata mais que a de SP e MG; nº é "inaceitável", diz professor
Em 2013, de acordo com o ISP (Instituto de Segurança Pública) do Rio de Janeiro, 416 pessoas morreram em “autos de resistência”, ou seja, quando os autores das mortes foram policiais. Para o sociólogo do Laboratório de Análise da Violência da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) Ignacio Cano, o número é muito elevado. “Quatrocentas pessoas mortas é inaceitável”, diz. O número supera, inclusive, os dados dos Estados mais populosos do país: São Paulo e Minas Gerais.
Em comparação com os dois vizinhos, os números fluminenses se destacam. Em 2013, 369 pessoas morreram pelas mãos de policiais civis e militares em São Paulo, a serviço ou em momentos de folga – 11% a menos que no Rio.
Em Minas, de acordo com a Secretaria de Defesa Social do Estado, os últimos dados oficiais disponíveis sobre esta taxa são de 2011, quando 53 pessoas foram mortas em confrontos com agentes de segurança, incluindo policiais militares, policiais civis, bombeiros e membros do sistema penitenciário.
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Embora o número no Rio de Janeiro tenha sido reduzido a um terço em relação a 2007 (quando foram 1.300 vítimas), ele é alto e volta à tona após casos como os da auxiliar de serviços gerais Cláudia Ferreira da Silva, que morreu na última semana após ser baleada durante uma operação da Polícia Militar no Morro da Congonha, na zona norte do Rio, e foi arrastada pelo carro da PM no caminho do hospital. Um inquérito está em processo sobre a autoria do disparo que matou Claúdia.
Mapa dos autos
A geografia dos autos de resistência também mudou. Se na comparação de 2012 e 2013, o número de mortos em confronto com a polícia foi praticamente o mesmo –com uma diferença de três vítimas a menos em 2013–, apenas na capital houve redução significativa no número de autos, com 59 mortes a menos de um ano em relação ao anterior.
Nas demais partes do Estado, os homicídios cometidos por policiais –que são, segundo o Artigo 23 do Código Penal Brasileiro, em defesa própria, cumprimento do dever ou estado de necessidade– aumentaram.
Segundo Ignacio Cano, uma das possibilidades para essa redistribuição das ocorrências é o trabalho das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) na cidade do Rio de Janeiro. “Com certeza, um dos impactos das UPPs é a redução drástica dos autos de resistência, motivado pela descontinuidade da resistência. Mas a grande redução [de 2007 até hoje], a gente atribui à implantação de metas policiais que incorporaram o fim das mortes violentas dentro do que a polícia tem que alcançar”, diz Cano.
No entanto, segundo o professor, um dos obstáculos para que esses números caiam ainda mais é a coexistência de duas formas de se garantir a segurança pública no Estado: a da pacificação e a do confronto. Este último, para ele, é o modelo histórico de a polícia atuar, com casos de premiação para os policiais que mais matavam na década de 1990, por exemplo.
Hoje, além do viés violento que esteve por muito tempo na corporação, um dos motivos da violência pode ser, inclusive, a insegurança dos próprios PMs. Assim, para o pesquisador, é preciso incentivar que a polícia tenha o objetivo de reduzir o número de mortes dos próprios policiais, já que para serem menos atacados teriam que, consequentemente, agir com menos violência. Só neste ano, 15 PMs foram assassinados.
“Falta, basicamente, transformar a doutrina policial e fazer com que a pacificação seja um princípio inspirador da política pública. Tem que inverter a espiral da violência para uma espiral de proteção da vida”, afirma Cano.
Governo anuncia medidas
A Seseg (Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro) afirma que trabalha para reduzir os índices de mortes de autoria policial e destaca a queda de 61% destas ocorrências desde 2006. Além disso, adianta que está sendo criado um Sistema de Qualificação e Gestão da Informação sobre mortes por causas externas.
O objetivo deste sistema, de forma geral, é concentrar todas as informações sobre uma morte --assim como melhorar a qualidade delas-- e aumentar a confiabilidade dos dados. Além disso, ele deve incentivar e propor atividades de capacitação e aperfeiçoamento profissional e alterações na legislação. Ou seja, dar meios para que estes homicídios sejam mais bem apurados. Com o mesmo propósito, um número de identificação de cadáver deve ser implantado em breve. “Ele funcionará como um registro único utilizado por todos os órgãos que lidam com mortes violentas ou por causas externas”.
A Seseg também explica que, a exemplo de outros Estados, aboliu designações genéricas como auto de resistência dos boletins de ocorrência –embora o ISP ainda tenha o termo em seus relatórios. Assim, é usado “homicídio decorrente de intervenção policial”. O mesmo vale para lesões corporais.
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