Entidade vê "ataque vil e covarde" a juiz que soltou homem acusado de estupro em ônibus
A repercussão na imprensa e nas redes sociais sobre a decisão do juiz José Eugênio do Amaral Souza Neto --de soltar um suspeito de estupro por considerá-lo um contraventor, e não um criminoso-- representa um ataque “vil e covarde” e ainda expôs o magistrado a um “linchamento moral”. A análise é da Apamagis (Associação Paulista de Magistrados), que emitiu, nesta sexta-feira (1º), uma nota de “integral apoio” ao juiz do Dipo (Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária) no Fórum da Barra Funda.
Alvo de críticas, a decisão de Souza Neto fomentou debate sobre assédio sexual e estupro depois que, na última quarta-feira (30), ele mandou soltar o ajudante de serviços gerais Diego Ferreira de Novais, 27.
Ele foi preso em flagrante no dia anterior depois de ejacular no pescoço de uma passageira do transporte coletivo, às 12h30, em um ônibus que seguia pela avenida Paulista. Além desse caso, ele tem outras 16 passagens policiais por abuso sexual e estupro no transporte público paulistano.
O UOL ouviu a opinião de especialistas em direito penal que consideraram a atitude do magistrado "um erro injustificável".
“A Apamagis vem a público externar seu integral apoio ao magistrado José Eugênio do Amaral Souza Neto, atacado de maneira vil e covarde na imprensa e em redes sociais. Não é possível assistir inerte ao linchamento moral a que foi submetido o magistrado, por pessoas sem nenhum compromisso com a verdade dos fatos e que insuflaram parcela expressiva da população, agredindo injustamente um juiz que dignifica a toga”, diz a nota.
Sem citar que medidas pode adotar, a entidade, cuja diretoria tem cinco juízes e uma juíza, avisou ainda que “adotará todas as medidas cabíveis para que os danos provocados sejam reparados e atuará firmemente na defesa intransigente da independência jurisdicional, garantia primeira das sociedades civilizadas”.
“O ato que deu origem à decisão proferida pelo magistrado é indubitavelmente repugnante e causa asco em qualquer pessoa minimamente civilizada. Por isso, ninguém --menos ainda o magistrado-- minimizou a gravidade da conduta do autor. Entretanto, para que se estabeleça a verdade dos fatos, o Ministério Público, titular da ação penal, entendeu, segundo a sua interpretação técnico-jurídica, que o ato praticado não configurava crime de estupro, mas uma contravenção penal e assim, requereu expressamente o relaxamento da prisão. Noutras palavras, o órgão acusador pleiteou a liberdade, acolhida pela Justiça, sendo necessária, portanto, a soltura do acusado”, continua a nota.
A associação enfatizou ainda que, “numa democracia, não é dado ao juiz o direito de julgar sem amparo das leis, sob o risco de se perderem direitos e conquistas tão duramente alcançados pela sociedade brasileira”.
Por fim, a entidade classificou como “evidente descompasso” a legislação vigente e os casos reais e defendeu que levará a discussão ao Congresso Nacional a fim de que sejam feitas “alterações legislativas que corrijam essa e outras falhas tão graves no ordenamento jurídico”.
A reportagem tenta desde a terça-feira um posicionamento do juiz, mas nem ele --alegando incompatibilidade legal para comentar um caso julgado--, nem o Tribunal de Justiça de São Paulo se posicionaram a respeito.
IDDD critica "onda punitiva" e "execração pública" de juiz
Também em nota, o IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa) defendeu o magistrado ao afirmar ver "com preocupação" os "ataques à decisão judicial que garantiu a liberdade de um acusado de crime de estupro."
"A execração pública do magistrado coloca em xeque sua independência judicial. O Judiciário não pode ficar refém da onda punitiva, que teima em colocar juízes sob suspeita toda vez que decidem a favor do réu. No caso concreto, a decisão se deu depois de manifestação do Ministério Público favorável à soltura do acusado, que ainda não foi julgado, o que só reforça a plausibilidade jurídica da decisão. Por mais repugnante que possa ser a acusação, ao magistrado não cabia outra providência. Se a lei é omissa, não é papel do juiz ampliar seus limites, mas sim garantir ao acusado um processo justo."
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