Cadeias brasileiras superam limite de superlotação estipulado pelo Ministério da Justiça
O quadro de superlotação nos presídios brasileiros viola resolução do CNPCP (Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária), órgão ligado ao Ministério da Justiça, que fixou o parâmetro de 137,5% como percentual máximo de excedente de detentos nas prisões.
Hoje, o país tem uma taxa de superlotação nas cadeias de 197,4%, o que significa que existe quase o dobro de detentos em relação ao número de vagas. Os dados foram divulgados nesta sexta-feira (8) pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública e se referem a junho de 2016. São 726.712 presos para 368.049 vagas.
Nenhum dos 26 Estados nem o Distrito Federal seguem o percentual estipulado pela resolução. A exceção são os quatro presídios federais de segurança máxima, com taxa de lotação de 52,5%.
Segundo a resolução número 5 do CNPCP, publicada em novembro de 2016, "a superlotação não é compatível com o processo de ressocialização" e "os cárceres brasileiros --prova da ineficiência da política de segurança pública-- implicam aumento da criminalidade, inclusive, com a elevação das taxas de reincidência".
Em entrevista ao UOL, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes afirmou que "a superlotação dos presídios ofende a dignidade humana".
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No Brasil, conforme a resolução número 5, o percentual de 137,5% do número de vagas equivale, num presídio de 800 detentos com capacidade de 8 presos por cela, a admitir superlotação de até 11 presos por cela.
"Essa resolução é um marco, reconhecida internacionalmente. Incentiva o desencarceramento, cria prisões mais humanizadas em que a chance de ressocialização é real", afirma a especialista em arquitetura prisional Suzann Cordeiro, professora da Universidade Federal de Alagoas. Ela era integrante do CNPCP quando a resolução foi aprovada. Ela considera que "as violações no sistema prisional são propositais".
Resolução tem caráter "orientativo", diz Depen
Esse percentual foi definido pelo conselho com base numa decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos --citada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) num julgamento sobre superlotação nos presídios nacionais-- que aplicou o percentual como parâmetro para cadeias na Califórnia.
"Essa previsão [dos 137,5%] acaba não tendo efeito prático. O que demonstra é o enfraquecimento do conselho, que no decorrer dos últimos tem cedido a essas pressões e não consegue mais pautar políticas mínimas", afirma a pesquisadora Valdirene Daufemback, ex-diretora do Depen (Departamento Penitenciário Nacional).
O conselho é formado por 13 membros indicados pelo Ministério da Justiça, entre pesquisadores, profissionais da área criminal e representantes do governo, e tem como função traçar diretrizes e planos no setor criminal e penitenciário.
"Infelizmente, o número de presos que chegam às penitenciárias é cada vez maior e essas pessoas são jogadas em celas com 20, 30 até 60 outras pessoas, como eu já presenciei", diz o advogado Marcos Roberto Fuchs, diretor adjunto da Conectas Direitos Humanos. Ele também era integrante do CNPCP quando a resolução foi aprovada.
Questionado pelo UOL, o diretor-geral do Depen, Jefferson de Almeida, afirma que a resolução do conselho tem caráter "orientativo" e não há punição em caso de descumprimento.
"Evidente que essa resolução do CNPCP é um marco orientativo de 137%, ou seja, muito embora exista uma sobrepopulação acima da média, se entende que nesse momento 137% é sim um dado que precisa ser trabalhado", diz.
"Não há uma punição do Depen no que se refere a isso, mas há uma sentença recente do Distrito Federal no sentido de se indenizarem pessoas que eventualmente sejam submetidas a qualquer tipo de subtração dos seus direitos", afirma Almeida.
O Depen reconhece o problema da superlotação e trabalha para mitigá-lo, diz, por meio de investimento na ampliação de vagas e no uso de medidas alternativas à prisão, como a tornozeleira eletrônica.
Segundo o diretor-geral do Depen, há recursos do Pnasp (Programa Nacional de Apoio ao Sistema Prisional) e do Funpen (Fundo Penitenciário Nacional) previstos para a criação de 65 mil vagas, quantidade porém insuficiente para sanar o déficit no sistema.
"Se nós somarmos as vagas do Pnasp com as vagas que poderão ser ofertadas pelo fundo, chegaremos à casa de 65 mil vagas. O que não vai resolver o problema, evidentemente, de falta de vagas no sistema prisional. É por isso, então, que o Depen vai trabalhar fortemente no que diz respeito à política de monitoramento eletrônico e à de alternativas penais", diz.
O ritmo das obras também é outro desafio. Relatório da CGU (Controladoria Geral da União), divulgado em julho, aponta que o Pnasp, lançado em 2011, previa a oferta de 45.730 vagas, mas, até dezembro do ano passado, apenas 1.190 tinham sido entregues.
Almeida afirma que após o Depen identificar 51 obras consideradas em estado crítico, que estavam paradas, não tinham começado ou foram interrompidas, realizou novos acordos com os Estados para a conclusão delas.
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