''Ele dizia que nunca seria preso'', diz vítima de homem condenado por infectar mulheres com HIV
“Estou satisfeita com a Justiça, porque ele estava certo de que isso [a condenação à prisão] nunca iria acontecer. É uma pessoa com um ego muito grande, que sempre fez coisas erradas e nunca arcou com as consequências.”
A declaração é de Rosa*, uma das mulheres que se relacionou com Renato Peixoto Leal Filho, condenado a sete anos de prisão em regime fechado por contaminar intencionalmente ao menos duas mulheres com o vírus HIV. Ela não foi infectada pelo vírus, mas, assim como as outras mulheres, manteve relações com o acusado sem proteção e sem saber que ele era portador da doença. O número total de mulheres vítimas não foi confirmado, mas poderia chegar a uma dezena, segundo Rosa.
Leal Filho está preso desde julho de 2017, quando se entregou ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, após denúncias. A condenação, publicada no último dia 23 no Diário da Justiça Eletrônico do Rio, é em primeira instância e ele ainda pode recorrer.
Sua defesa não foi localizada pela reportagem para comentar a condenação. Porém, em 2015 ele havia dito a um jornal do Rio de Janeiro que havia informado às suas então parceiras que era portador do vírus antes de manter relações sexuais com elas. Leal Filho afirmou que ao menos uma das mulheres havia feito uma vingança contra ele ao afirmar aos autoridades que ele não havia revelado sua condição.
“Ele mandava áudios dizendo que nunca seria preso e agora vai sentir que estava fazendo algo errado. Ele vai pagar, apesar de eu achar que continuará fazendo a mesma coisa quando for solto. Ele é uma pessoa ruim, só de ouvir os áudios você percebe”, afirmou Rosa, em entrevista por telefone ao UOL.
Quando Leal Filho foi preso, Rosa dizia temer que ele fosse colocado logo depois em liberdade. Agora ela diz estar satisfeita com a condenação, que considera ter sido rígida.
Isso porque, segundo ela, poucas mulheres que se relacionaram com Leal Filho concordaram em prestar queixa e expor suas histórias. “A Justiça foi feita em parte, porque não considerou todas as vítimas: muitas não quiseram depor, tiveram vergonha.”
Hoje ela diz ter superado a história, da qual somente seus amigos mais próximos e familiares têm conhecimento.
Relacionamento baseado no medo
Em 2017, logo após Leal Filho se entregar à Justiça --uma reação à campanha feita pelas mulheres em redes sociais e repercutida pela imprensa--, Rosa contou ao UOL sobre seu relacionamento com o homem que conheceu via Instagram. Ela, que é de outro estado, foi até a casa dele na Barra da Tijuca (RJ) passar alguns dias, em 2014, e acabou ficando por quatro meses.
"Nunca fui extremamente apaixonada por ele, era um relacionamento baseado no medo. Eu tinha medo de voltar para casa e ser rechaçada [pela minha família] por ter ido para o Rio. Eu não queria falar para meus pais o que estava acontecendo e não queria ficar na rua. Tive medo do início ao fim", disse à época.
Ela relatou que Leal Filho recebia R$ 3.100 de mesada da mãe, e o dinheiro acabava em pouco tempo. Assim, logo que chegou ao Rio, ela precisou arrumar emprego. “Comecei a trabalhar e ele pegou meu primeiro salário. Eu estava pagando para viver com ele. Fui escrava sexual, porque ele não respeitava meu ‘não’”, relatou à época. Com medo das agressões, Rosa acabou fugindo e voltando para a casa dos pais.
A vítima afirmou ter descoberto que o então parceiro tinha o vírus HIV ao achar na casa dele acidentalmente um exame de uma outra mulher que havia se relacionado com ele. Somente após isso, na versão dela, Leal Filho teria contado a verdade. Seis meses após o fim do relacionamento, ela fez exames e descobriu que não havia sido infectada.
Abordagem via redes sociais
O caso contra Leal Filho começou a ser investigado em 2015, quando uma das vítimas --que não é Rosa-- foi à Polícia Civil denunciá-lo. Logo depois, outra mulher prestou queixa parecida, relatando a mesma prática. Segundo elas, Renato se apresentava como empresário e abordava mulheres em redes sociais.
Com curtidas e mensagens privadas, as convencia a se encontrar com ele, segundo Rosa. "Começaram assim, pela internet, todos os relacionamentos dele. Ele tinha tempo ocioso”, explicou Rosa. No início, conta, ele era gentil e falava muito de uma filha de três anos e de como sofria com o fim de um relacionamento. "Ele falava de alienação parental, postava fotos da filha. A gente acabava seduzida por ele, que era um ator.”
Depois disso, mantinha relações sexuais com elas sem proteção, supostamente sem avisar que era portador do vírus HIV.
Quando o caso veio à tona, a defesa de Leal Filho alegou que as mulheres que o acusavam tinham conhecimento de que ele era soropositivo. Em sua sentença, no entanto, a juíza Regina Esteves de Magalhães rechaça essa versão. Segundo ela, Renato agiu com dolo (intenção) “ao transmitir a enfermidade incurável”, sem informar as mulheres sobre a doença.
O artigo 130 do Código Penal considera crime “expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está contaminado”.
*A identidade foi trocada para proteger a identidade da vítima
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