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Candidato que propuser penas mais duras será bem-vindo, diz novo delegado-geral de SP

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

11/07/2018 13h13Atualizada em 11/07/2018 14h32

O delegado Paulo Afonso Bicudo, 67, estava em casa em Jundiaí (SP), após a vitória do Brasil contra a Costa Rica na Copa do Mundo no último dia 22 de junho, quando recebeu um telefonema do Palácio dos Bandeirantes para uma reunião com o governador Márcio França (PSB) e o secretário da Segurança Pública, Mágino Alves Barbosa Filho.

Durante o encontro, recebeu o convite para ser o novo delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo --pelo menos até dezembro, quando termina a gestão de França. Ele foi nomeado quatro dias depois. O cargo estava ocupado interinamente pelo delegado Júlio Guebert desde o início de abril, quando Geraldo Alckmin (PSDB) deixou o governo para concorrer às eleições presidenciais e o então delegado-geral, Youssef Abou Chahin, pediu demissão.

Formado em direito pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), Bicudo se orgulha de ser delegado há 42 anos e de ter passado "por todos os lugares possíveis" dentro da Polícia Civil. Está há 13 anos em cargos de direção da corporação, e ultimamente chefiava a área de Piracicaba (SP). "Prestei concurso. Confesso que até desconhecia a polícia. Fui à busca de um emprego. Mas me surpreendi. Comecei a trabalhar na Delegacia de Homicídios, me senti muito identificado com a função, com a missão, com a carreira", afirmou ao UOL.

Bicudo sabe que terá pouco tempo para implantar seu modo de ação dentro da polícia, inclusive por 2018 ser um ano eleitoral. No entanto, diz que dará sua contribuição à medida do possível. "Avançar sempre. Melhorar sempre. Mas com as limitações, inclusive, do tempo. Não tenho a pretensão de fazer mudanças estruturais, até porque o tempo não permite", afirmou.

Enquanto não se pode mexer peças por estar com o orçamento engessado, ele analisa que, principalmente no âmbito nacional, será melhor para a segurança pública propostas que deixem o sistema penal e processual mais duro, como o endurecimento de penas e a redução da maioridade penal, por exemplo.

Todo aquele candidato que tiver propostas no sentido do enrijecimento do sistema é bem-vindo em toda área da polícia. O que se percebe é uma certa fragilidade, não só no sistema penal e processual, mas especialmente na aplicação da pena.

Paulo Afonso Bicudo, delegado-geral da Polícia Civil de SP

10.jul.2018 - Paulo Afonso Bicudo, 67, delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo - Murilo Silveira Idu/UOL - Murilo Silveira Idu/UOL
Paulo Bicudo foi nomeado delegado-geral da Polícia Civil de SP em 26 de junho de 2018
Imagem: Murilo Silveira Idu/UOL

"O mundo ainda não descobriu outra forma de punir o criminoso, aquele que infringe a lei do que a supressão dele do meio social, o confinamento. É o ideal? Não, mas é o único existente. E se percebe no Brasil uma certa complacência, principalmente no cumprimento da pena. Então, a minha proposta pessoal é: tudo aquilo que enrijecer o sistema é melhor, é bem-vindo. Vai melhorar a sociedade", complementou o novo delegado-geral.

Como exemplo, Bicudo explica que, para adolescentes infratores, o ideal seria reduzir a maioridade penal ou criar um sistema mais rigoroso para o jovem. "Hoje, nós temos um sistema que não dá proteção à sociedade e, às vezes, não dá a pena necessária, inclusive, ao adolescente".

"PCC está enfraquecido"

Denúncia do Ministério Público oferecida no último dia 5 de julho aponta que o PCC (Primeiro Comando da Capital), que foi fundado em São Paulo, é a principal facção criminosa do país, se expandiu para outros estados e países e está com uma estratégia mais violenta de combate a outras facções.

Para o novo delegado-geral, a facção é "uma das principais preocupações da Polícia Civil". No entanto, afirma, operações recentes da polícia apontam que, em São Paulo, o PCC está cada vez mais enfraquecido.

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"O crime se organizou em torno de marginais líderes daquele grupo. Esses marginais acabaram sendo presos, através de investigações de longo tempo, e os substitutos desses postos nessa organização criminosa já são marginais --se é que se pode falar dessa forma, mas tentando explicar-- menos qualificados dentro da organização. Então, ela está sendo enfraquecida", disse.

De acordo com o delegado-geral, as operações que detêm integrantes da facção geram desdobramentos positivos, atingindo a parte financeira da organização criminosa. "É importante também desorganizar o crime através da destruição do seu poder financeiro, do seu patrimônio, das atividades empresariais e comerciais".

Levantamento do UOL apontou que, dos 92 policiais civis presos ano passado em São Paulo, ao menos 39 teriam algum tipo de suspeita de ligação com o PCC. Bicudo afirmou que nenhuma instituição está livre de ter parte de seus integrantes com desvio de conduta.

"Os maus, dentro daquilo que é possível fazer, são eliminados. No caso da Polícia Civil, através de uma corregedoria firme, correta, dura com objetivo de ação. É um processo de depuração. Todas as instituições passam por isso", afirmou.

"Policial tem que sobreviver" 

Os registros de estupros nas delegacias paulistas subiram 38% no mês de maio, segundo a SSP. Foram 943 casos em maio deste ano, ante 683 no mesmo mês de 2017. Durante a gestão Alckmin (2011-2017), o número de mortes praticadas por policiais subiu 96%, enquanto o número de policiais mortos teve queda de 17%.

"O estupro é um delito aviltante às pessoas e ele é cometido em situações de difícil investigação. Nós dependemos muito das informações da vítima, das circunstâncias em que o caso foi cometido, se foi no envolvimento de um delito contra o patrimônio ou se foi dentro do ambiente doméstico, enfim, realmente percebemos que a estatística acelerou nesse tema, mas é uma investigação localizada em cada caso", justificou o delegado.

Segundo ele, todas as delegacias são orientadas para receber bem as vítimas. "O cidadão que vai à delegacia, ele precisa ser bem atendido. Então, tudo aquilo que distanciasse desse bom atendimento, estamos muito bem alinhados com a corregedoria. Um atendimento rigoroso, justo, sem uma exposição desnecessária da Polícia Civil, do órgão, mais firme e robusta".

10.jul.2018 - Paulo Afonso Bicudo, 67, delegado-geral da Pol?cia Civil de S?o Paulo - Murilo Silveira Idu/UOL - Murilo Silveira Idu/UOL
Delegado Bicudo ficará no cargo até, pelo menos, dezembro deste ano
Imagem: Murilo Silveira Idu/UOL

Com relação à letalidade da polícia, Bicudo afirmou que, quando o policial "é obrigado a fazer um enfrentamento, ele tem que sobreviver". "Ele está numa situação de alto risco. Sabemos da forma agressiva que o crime organizado age, o armamento que hoje o marginal está utilizando, a facilidade com que ele tem acesso. O policial está ali numa situação de vida ou de morte", argumenta.

"Então, a todo momento que eu puder defender o policial que age no estrito cumprimento do dever e que, às vezes, infelizmente, é obrigado a atirar e ceifar a vida de um marginal, eu prefiro muito mais do que o contrário", complementou.

Reajuste e evasão

No início do ano, o então governador Geraldo Alckmin concedeu reajuste de 4% aos policiais. Críticos e entidades de classe classificaram o reajuste como "eleitoreiro", por ter sido concedido após cinco anos sem aumento salarial.

"Como todo servidor, estamos sempre buscando uma revalorização. Houve, realmente, esse período longo sem reajuste. O governador Márcio França assumiu num momento em que ele não pode aumentar --o orçamento está engessado, estamos entrando num período eleitoral. A polícia, como um todo, está a aguardar um reajuste", disse.

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Bicudo afirma não concordar com a afirmação de que a Polícia Civil está sucateada. Ele admite que existem problemas financeiros, mas afirma que o estado tem dado a resposta com, por exemplo, 80 viaturas adquiridas recentemente.

Para o novo comandante da Polícia Civil, houve uma evasão de profissionais por causa da possível reforma previdenciária. Policiais que alongariam sua vida profissional acabaram, por medo de não ter mais direito à aposentadoria, pedindo o benefício.

Um dos alicerces para a mudança do cenário, na opinião do novo delegado-geral, é a mudança da Polícia Civil da esfera da Secretaria de Segurança Pública para a da Justiça --proposta de Márcio França, que está em análise na Assembleia Legislativa de São Paulo.

"Há um consenso na Polícia Civil: tudo aquilo que vem para melhorar precisa ser observado. É uma mágica essa proposta? Não. Mas é um alinhamento. A Polícia Civil tem uma atividade de Polícia Judiciária", afirmou.

Para ele, com a mudança, os policiais civis vão atuar diretamente no Judiciário, para entregar investigações melhores ao Ministério Público e, assim, fazer com que o réu seja condenado. "Será um alinhamento. Para extirparmos da sociedade os maus cidadãos que romperam a lei. Esse é o objetivo. Então, dentro desse pensamento, nos alinhamos às carreiras jurídicas", defendeu.

10.jul.2018 - Paulo Afonso Bicudo, 67, delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo - Murilo Silveira Idu/UOL - Murilo Silveira Idu/UOL
Bicudo afirma que convite para ser delegado-geral foi recebido como convocação
Imagem: Murilo Silveira Idu/UOL