Mãe de menino morto no Complexo da Maré: "Pulei o luto e fui para a luta"
O Encontro com Fátima Bernardes recebeu hoje Bruna da Silva, mãe do garoto Marcos Vinícius da Silva, que foi morto durante operação policial no Complexo da Maré em junho do ano passado.
A ativista falou sobre a decisão de hoje do Tribunal de Justiça do Rio, que decidiu ativar uma liminar, que antes havia sido suspensa, criando regras para operações policiais no Complexo da Maré. Entre as estipulações está a proibição de operações durante horários de entrada e saída de escolas.
"Graças a Deus, o que aconteceu comigo e com o meu filho no Complexo da Maré foi um levante. Eu pulei a fase do luto para a luta. A volta da nossa Ação Civil Pública é muito importante para o morador, porque são ações como essas que vão diminuir blusas como essa", comentou, segurando o uniforme escolar manchado de sangue de Marcos Vinícius.
"Eu costumo dizer que eu perdi um filho, mas ganhei milhares. Cada criança no Complexo da Maré hoje me importa. Precisou doer na minha alma para eu começar a ver o problema do próximo. É preciso levantar uma questão: a gente quer uma segurança pública que trabalhe ao nosso favor, uma segurança pública que nos abrigue, nos proteja", disse ainda.
"Não está certo o discurso de 'tem que entrar [polícia na favela], bandido bom é bandido morto'. Eu não acho", declarou ainda. "Acho que bandido bom é bandido ressocializado. Polícia boa é polícia morta? Não concordo. Policial bom é policial vivo, que trabalha para garantir a vida do próximo, de quem tem que ir e vir".
"Quem nos faz ficar contra o Estado é o próprio Estado"
"A gente costuma dizer que, quando tem qualquer tipo de operação na zona sul, sempre é uma operação de sucesso. Não tem troca de tiros, não tem helicóptero. E são encontrados vários fuzis desmontados em prédios e condomínios de luxo, de alto padrão", comentou a seguir Bruna.
"Eles conseguem entrar e apreender aquela arma sem trocar tiro, garantindo a vida dos moradores. Dá para fazer assim na nossa comunidade também. Quem nos faz ficar contra o Estado é o próprio Estado. O Estado, ao invés de conquistar os moradores, coloca os moradores contra ele", disse ainda.
Bruna adicionou que sua outra filha queria ser policial, mas desistiu após o acontecido com o irmão. "Mas eu falei para ela: Minha filha, você ainda pode ser! Você pode estudar e ser, mas você tem que exercer o que é a favor do próximo, do morador, da pessoa que está desprotegida", completou.
"Eu acredito muito no diálogo, ele pode vencer esse ódio todo. Acredito que somos nós, mães que tivemos filhos vitimados pelo Estado, que vamos parir um Brasil melhor. Eu acredito que somos nós, a população brasileira, que temos que cobrar e reivindicar os nossos direitos, mas na sabedoria, no amor, no diálogo", disse ainda.
"Quando eu falo que não tem ódio no meu coração, é porque eu não deixo ele entrar. Todo dia eu me podo, todo dia. Essa semente é plantada diariamente dentro de mim, mas cabe a mim não cultivar esse sentimento", finalizou.
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