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Morte de 64 em fábrica de fogos na BA vai a júri na OEA após 21 anos impune

Mulher que foi vítima de explosão em fábrica de fogos em Santo Antônio de Jesus, na Bahia, é socorrida - José Simões - 11.dez.1998/Correio da Bahia
Mulher que foi vítima de explosão em fábrica de fogos em Santo Antônio de Jesus, na Bahia, é socorrida Imagem: José Simões - 11.dez.1998/Correio da Bahia

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

31/01/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Explosão em fábrica de fogos de artifício na Bahia em 1998 matou 64 pessoas
  • Condenados nunca começaram a cumprir pena; caso chegou ao STF

A CIDH (Corte Interamericana de Direitos Humanos), da OEA (Organização dos Estados Americanos), analisa nesta sexta (31) a denúncia feita contra o Brasil no caso da explosão de uma fábrica de fogos de artifício em Santo Antônio de Jesus, no recôncavo baiano, em dezembro de 1998. O acidente matou 64 pessoas e deixou seis feridos. Sobreviventes e familiares ainda esperam por justiça após mais de duas décadas.

Na audiência de hoje na CIDH, vítimas e familiares vão apresentar queixas sobre o andamento do caso no Brasil. Se condenado, o país pode ser obrigado, por exemplo, a indenizar as vítimas, fiscalizar a produção de fogos de artifício ou dar celeridade ao julgamento dos recursos dos acusados. Em caso de descumprimento de uma decisão da Corte, o Brasil poderia sofrer sanções internacionais.

O caso é marcado por uma longa disputa nos tribunais. O MP-BA (Ministério Público da Bahia) ofereceu denúncia criminal contra oito pessoas por homicídio doloso —quando há ciência dos riscos ou intenção de matar. Dessas, cinco foram condenadas em 2010 em um júri realizado em Salvador.

Elas, porém, recorreram da decisão ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e ao STF (Supremo Tribunal Federal). As duas Cortes confirmaram a condenação, mas os réus ingressaram com outro recurso no STF e ainda não houve cumprimento da sentença. Os condenados alegam que teria havido descumprimento de direito à defesa.

Em parecer dado em março do ano passado, a PGR (Procuradoria Geral da República) pediu que o STF negasse pela terceira vez um pedido dos réus. "Nos parece que eventuais novos recursos nesta Corte Suprema seriam manifestamente protelatórios, pelo que urge sejam providências tomadas quanto à execução da pena", alegou.

14.dez.1998 - Explosão de fábrica clandestina de fogos de artifício em Santo Antônio de Jesus, Bahia: Parentes de vítimas aguardam a liberação dos corpos no IML (Instituto Médico Legal) - Sidenei Haack - 14.dez.1998/Correio da Bahia - Sidenei Haack - 14.dez.1998/Correio da Bahia
Foto da época mostra parentes de vítimas aguardando a liberação de corpos no Instituto Médico Legal
Imagem: Sidenei Haack - 14.dez.1998/Correio da Bahia

Sequelas marcaram vítima

Leila Cerqueira dos Santos, 41, é uma das sobreviventes da explosão da fábrica. Com queimaduras de primeiro, segundo e terceiro graus, ela ficou internada por dois meses e teve sequelas no rosto, nas pernas e perda auditiva.

"A gente espera que a justiça seja feita. Nosso objetivo é que a gente chegue lá", conta a mulher, que será uma das testemunhas a falar na audiência hoje em San José, na Costa Rica.

A sobrevivente ainda mora na cidade do acidente e trabalha na creche criada pelo Movimento 11 de Dezembro —que reúne afetados pela tragédia— para assistir e ajudar filhos de vítimas da explosão. Na época dos fatos, ela tinha 20 anos e trabalhava enrolando pólvora na produção de fogos. "Eu fazia o que todos faziam lá", lembra. À época, a fábrica pagava R$ 0,50 pela produção de mil traques.

Até hoje, a vítima conta que recebeu apenas um pequeno valor de indenização, acordado com a família dona da fábrica. Mas, para a ONG Justiça Global, que acompanha as vítimas desde 2000, o valor não foi capaz de reparar danos.

Segundo Sandra Carvalho, presidente da ONG e uma das autoras da denúncia na CIDH, a comissão da Corte decidiu levar a denúncia a julgamento somente em 2018, após a demora brasileira.

A CIDH já condenou o Brasil em alguns casos no passado, como a morte do jornalista Vladimir Herzog e as chacinas na favela Nova Brasília, do Rio.