"Fizeram o que polícia não fez", diz ouvidor a pais que investigaram crime
O ouvidor da polícia de São Paulo, Elizeu Soares Lopes, esteve ontem (9) no Capão Redondo, na zona sul de São Paulo, com os jovens Alexssandro Marques do Nascimento, 18; Eryk Bueno Pimentel, 20; e Kelvin Nascimento de Amancio, 22. Os três passaram dois meses presos por roubo e foram soltos após os pais deles investigarem o caso e conseguirem imagens que mostravam que eles não estavam na cena do crime pelo qual foram presos pela Polícia Militar.
"Vocês fizeram o trabalho que a polícia não fez", disse o ouvidor aos pais dos jovens. Alexssandro, Eryk e Kelvin estão em liberdade provisória desde 20 de janeiro e ainda têm algumas restrições de direitos — eles não podem sair das 22h às 6h, por exemplo.
A Polícia Civil é a primeira que deveria fazer o controle do trabalho da PM. Se a autoridade policial, que é o delegado, vê que a informação que a PM traz não faz sentido, ele tem que se negar a autuar os presos em flagrante."
Elizeu Soares Lopes, ouvidor da polícia
A ouvidoria abriu um procedimento sobre o caso no dia 18 de janeiro e cobrou informações das corregedorias de ambas as polícias. No dia 20, mesmo dia em que o UOL noticiou o caso, a juíza Maria Fernanda Belli, da 1ª Vara Criminal, concedeu a liberdade provisória dos jovens.
Para o ouvidor, casos como o dos rapazes do Capão Redondo mostram como a pobreza é criminalizada no país. "Será que num bairro nobre eles seriam tratados assim?", questionou.
Após 20 dias de liberdade, Alexssandro, Eryk e Kelvin ainda sentem o peso da prisão e têm medo da polícia.
Bate insegurança quando vejo uma viatura."
Eryk Bueno Pimentel
Tenho medo que eles voltem e façam a mesma coisa de novo."
Kelvin Nascimento de Amancio
Eryk e Alexssandro estão em busca do primeiro emprego e Kelvin arrumou um trabalho em um lava-rápido. Alexssandro está aguardando o resultado de uma vaga e Eryk afirma que está com dificuldade de se empregar.
O UOL solicitou um posicionamento da Secretaria de Segurança Pública a respeito das declarações do ouvidor e aguarda manifestação.
Ouvidor defende polícia comunitária
Lopes defendeu uma polícia comunitária "e não uma polícia que veja a população como inimiga", disse. "O comandante da PM local tem que conhecer os moradores e as lideranças comunitárias, o pastor, o padre", defendeu o ouvidor.
A assistente social Maria Edijane Alves, articuladora da Rede de Proteção e Resistência contra o Genocídio, grupo formado por articuladores sociais que dão apoio a vítimas de violações de direitos humanos, disse que é necessário pensar em outras políticas públicas para a periferia que não apenas a intervenção policial. "Os jovens foram presos na única área de lazer do bairro", disse.
Elizeu concordou com a assistente social. "Eu cresci no Itaim Paulista [zona leste de São Paulo] numa família com dez irmãos. Sei o quanto é difícil o acesso a direitos. E esse problema não é só das famílias, mas do Estado", disse.
Amigo dos jovens segue em prisão domiciliar
O ouvidor também conheceu a tutora do jovem Rafael Marques, 21, a cozinheira Silvana Maria Marques, tia do jovem. Ela contou que o rapaz continua em prisão preventiva domiciliar. Ele não foi preso em regime fechado como seus três amigos por ter diagnóstico de transtorno bipolar e atraso em seu desenvolvimento intelectual.
Silvana não está conseguindo contato com o advogado do rapaz e a defesa dele ainda não requereu que a liberdade provisória concedida à Alexssandro, Erik e Kelvin seja estendida para ele.
"Ele só tem autorização para ir acompanhado por mim até a UBS para pegar a medicação dele ou ir ao médico", contou Silvana. O resto do tempo Rafael fica em casa.
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