'História se repete', diz mãe de João Pedro após jovem morrer em ação da PM
Pouco mais de um ano após o adolescente João Pedro Matos, 14, ter sido morto durante uma operação policial no Itaoca, no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo - cidade da região metropolitana do Rio -, outro jovem negro, João Vitor Santiago, 17, foi morto na mesma região.
A mãe de João Pedro, a professora Rafaela Matos, destacou que o que aconteceu com seu filho há pouco mais de um ano se repete com mais uma família. "Era um menino inocente e mais uma vez a história se repete, um ano após tudo que a gente já viveu. A gente vê como mais uma ação desastrosa da polícia. A gente não fica bem emocionalmente", disse ao UOL.
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020 (levantamento mais recente feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com dados do ano de 2019), 74,4% das vítimas de homicídio no Brasil eram pessoas negras.
Entre as pessoas mortas por policiais, 79,1% são pessoas negras. Na esfera do poder público, não existe uma divulgação transparente de dados oficiais nacionais sobre homicídios ou sobre mortes provocadas por policiais em todo o Brasil. O governo brasileiro também não disponibiliza dados nacionais sobre as investigações e punições de homicídios.
Ação da polícia
João Vitor Santiago voltava de uma pescaria quando foi baleado durante uma ação da Polícia Militar ocorrida na última sexta-feira (20). O amigo dele Alexander Carvalho, 17, também foi ferido. Os dois foram socorridos e encaminhados para o Hospital Estadual Alberto Torres, no Colubandê, na zona sul de São Gonçalo.
João não resistiu aos ferimentos e foi enterrado ontem no cemitério municipal de São Gonçalo. Alexander continua internado com quadro de saúde estável, segundo informações da Secretaria de Saúde.
Parentes e amigos relatam que os disparos que atingiram os jovens partiram da PM. "O que disseram pra gente é que a PM soltou o dedo no gatilho e atingiu os garotos que estavam voltando de um passeio. Sem perguntar, sem questionar, sem nada. Geralmente é isso que ocorre mesmo. O João não vai voltar mais. Estão todos até agora sem acreditar", disse um amigo da família, que pediu para ter o nome preservado.
Procurada, a Polícia Militar informou que a ação desta sexta-feira (20) "foi baseada em informações de Inteligência da Polícia Civil, indicando que dezenas de traficantes armados se preparavam para deixar a comunidade em direção ao Complexo da Alma, onde haveria uma guerra".
De acordo ainda com a corporação, a PM montou um cerco e houve confronto. Sobre a morte de João Vitor, a PM informou que as investigações estão a cargo da Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí (DHNSG).
"Testemunhas foram ouvidas, as armas dos policiais militares que participaram da ação foram apreendidas para perícia e diligências estão sendo realizadas para esclarecer todos os fatos", afirma a corporação. A perícia feita nas armas e o laudo do IML devem ser finalizados nos próximos dias.
João Pedro
No mês de maio de 2020, também no Itaoca, o adolescente João Pedro Matos, 14, foi morto durante uma operação da Polícia Civil na região. Agentes da Core (Coordenadoria de Recursos Especiais) invadiram um imóvel e atiraram contra um grupo de jovens no interior da residência.
João Pedro estava na companhia dos primos e foi baleado. Os policiais chegaram a socorrer a vítima de helicóptero, mas o menino não resistiu. A família precisou fazer buscas pelo paradeiro dele.
Somente em junho deste ano, mais de um ano após a morte de João Pedro, três policiais civis da Core foram indiciados pela morte do adolescente. Dois dos três policiais que invadiram a casa devem responder por homicídio culposo, quando não há intenção de matar, e o terceiro agente por tentativa de homicídio culposa. O caso foi encaminhado para o Ministério Público do Rio de Janeiro.
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