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Empresário denuncia racismo e homofobia de cliente: 'Cabelo de vassoura'

Benedito Rodrigues Neto, conhecido como Neto Rodrigues, recebeu mensagens ofensivas na última terça-feira (16) - Reprodução/ Arquivo pessoal
Benedito Rodrigues Neto, conhecido como Neto Rodrigues, recebeu mensagens ofensivas na última terça-feira (16) Imagem: Reprodução/ Arquivo pessoal

Caio Santana

Do UOL, em São Paulo

19/11/2021 21h49Atualizada em 19/11/2021 21h49

O empresário autônomo Neto Rodrigues, de 23 anos, denunciou ter recebido mensagens racistas e homofóbicas de um cliente em potencial durante uma negociação de venda de calçados por conversa em um aplicativo de mensagens.

O rapaz, que trabalha em Anápolis (GO), conta que já havia falado com o suspeito anteriormente, mas que apenas na terça-feira (16) percebeu algo de errado no teor da conversa, em que o suspeito se referia a alguém como um "negão com cabelo de vassoura" e comentava sua sexualidade de forma pejorativa. O cliente deletou as mensagens poucos minutos depois, mas Neto já tinha feito cópia das telas.

O empresário acredita que o investigado pretendia mandar as mensagens para uma terceira pessoa, mas acabou enviando para ele por engano. Neto registrou boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia Civil na quarta-feira (17).

"Esse cliente já tinha consultado comigo alguns valores de tênis, mas não chegou a fechar [a compra]. Do nada recebi algumas mensagens e comecei a achar estranho. Quando eu percebi o que estava acontecendo, eu já printei", relatou o jovem em entrevista ao UOL.

De acordo com Neto, o suspeito apagou as mensagens e mudou de assunto mandando a foto de um tênis. Em seguida, ele alega ter sido bloqueado pelo homem no aplicativo de mensagens. "Foi quando eu entendi a noção do que estava acontecendo. Ele estava falando de mim para alguém, tinha feito aqueles comentários e acabou enviando para mim", deduziu o empresário sobre as supostas mensagens acidentais.

As mensagens com ofensas contra Neto, enviadas para o próprio, acompanham uma foto do perfil do empresário nas redes sociais: "Esse negão aí. Cabelo de vassoura de limpar casa. Ele é até bonitão. Mais queima (sic)", escreveu o suspeito.

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Captura de tela da mensagem mostra ofensas racista e homofóbica
Imagem: Reprodução/ Arquivo pessoal

Novo constrangimento

Ao comentar sua ida à delegacia, Neto afirma que não se sentiu confortável com o tratamento que recebeu no local, que incluiu tentativas de fazê-lo desistir da denúncia.

"Na terça-feira (16) não consegui abrir o boletim de ocorrência. Voltei a comparecer na manhã [seguinte]. Falei com o escrivão, totalmente despreparado, não tinha informações. A todo momento ele tentou fazer com que eu desistisse de abrir o boletim. Ele não me deu suporte, até o boletim ficou errado em alguns momentos", detalhou.

"Me senti constrangido duas vezes. [...] A gente já chega [para denunciar] tão sensível, tão machucado e ter que se deparar com tudo novamente. Várias vezes eles duvidaram do que eu estava falando, chegaram a falar que eu não tinha prova", detalha o empresário, que agora advoga por um maior preparo dos profissionais em delegacias.

Procurada pelo UOL para comentar os erros no registro e a qualidade do atendimento, a assessoria da Polícia Civil afirmou "que os servidores recebem treinamento para atendimento qualificado às vítimas vulneráveis". A nota também destaca que a corporação já fez diligências para apurar o caso.

"A Polícia Civil esclarece ainda que não houve declarações dos policiais, no ato do atendimento, de que o caso a ser registrado 'não era grande coisa'. A PCGO tem trabalhado com afinco no combate aos crimes de intolerância e homofobia em Goiás", declara a nota.

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Outra captura de tela já mostra as mensagens apagadas e o possível cliente enviando uma foto interessado em produto
Imagem: Reprodução/ Arquivo pessoal

A defesa

O UOL entrou em contato com o escritório Pedro Xavier Advogados que faz a defesa do suspeito, que foi identificado oficialmente apenas pelas iniciais E.B.C. Ele prestou depoimento na delegacia no final da tarde de hoje.

Por meio de nota, os advogados Pedro Xavier, Ryvia de Almeira e Wilson Araújo disseram que o investigado "nega veementemente as acusações inverídicas e manipuladas" feitas pelo empresário.

Segundo a nota, o cliente "não nega ter escrito tais palavras" das mensagens, mas declara que elas não eram direcionadas a Neto, "mas sim a amigos, que são companheiros de futebol do Senhor E.B.C. e que conversam diversos assuntos [...] inclusive brincando de forma extrovertida entre eles mesmos".

Os advogados afirmam ainda que "em momento algum houve dolo" para cometer qualquer crime por parte do suspeito. "O Senhor E.B.C. também é pessoa afrodescendente e/ou negra, de forma que seria impossível o mesmo cometer qualquer crime de racismo e/ou injúria racial contra um igual".

Os advogados declararam ainda que tomarão medidas judiciais contra Neto e que o cliente e sua família estão sofrendo diversas ameaças após a repercussão do caso.

foto 3 - Reprodução/ Arquivo pessoal - Reprodução/ Arquivo pessoal
Neto afirma que situação vivida em conversa foi a primeira em que se sentiu diretamente vítima de racismo
Imagem: Reprodução/ Arquivo pessoal