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Viúvo morre atropelado após revelar carta à esposa: '19.213 dias de amor'

Ari Cunha, de 72 anos, morreu atropelado em Joinville (SC) - Arquivo Pessoal
Ari Cunha, de 72 anos, morreu atropelado em Joinville (SC) Imagem: Arquivo Pessoal

Abinoan Santiago

Colaboração para o UOL, em Florianópolis

09/12/2021 18h26

Minutos depois de imprimir e distribuir cópias de uma carta escrita para a esposa falecida, o líder comunitário Ari da Cunha, 72, morreu após ser atropelado, em Joinville, a 183 km de Florianópolis. O acidente aconteceu na última segunda-feira (6), no percurso entre a Câmara de Vereadores e a casa onde morava.

Segundo a família, era comum Ari visitar a Câmara em razão do ativismo social, mas, naquele dia, especificamente, o idoso imprimiu e distribuiu aos políticos cópias de uma carta escrita em homenagem à esposa, Marlete Cunha, que morreu aos 74 anos, em janeiro deste ano após complicações provocadas pela covid-19.

"Sem você tem sido muito difícil viver e será assim até o fim da minha vida"
Trecho da carta de Ari a Marlete

O neto do casal Huellinton Alves, 30, conta que Ari ainda se emocionava quando se lembrava da companheira. "Achávamos que meu avô não iria sentir tanto a perda da esposa porque sempre foi muito ativo politicamente, mas ambos eram muito ligados e a morte o deixou muito fragilizado. Ele me procurou e pediu para digitar no computador as memórias do casal e uma carta em homenagem a ela", relatou.

Quando eu precisei de ti, sempre esteve presente ao meu lado e quando você precisou de mim, eu também estava. Estive ao lado da cabeceira da nossa cama procurando te acalmar muitas vezes, pois a dor que você sentia também doía em mim.
Ari da Cunha

Ari ainda acrescenta, na carta: "Começamos nossa vida conjugal sem nada, mas, com a sua ajuda, conseguimos conquistar muitas vitórias e eu sentia que tínhamos muita riqueza de amor. (...) Permanecemos juntos por 52 anos, 7 meses e 1 semana que é igual 640 meses, 19.213 dias, 461.112 horas, 27.666.720 minutos ou 1.660.003.200 segundos. Aqui, nossas mãos se encontram para construir uma história".

Triste fim

Ari andava de bicicleta por Joinville com os documentos digitados em um pendrive. A ideia era imprimir a carta e distribuir aos amigos próximos. No dia de sua morte, foi à Câmara de Vereadores, tirou cópias no gabinete da vereadora Tânia Larsen (PSL) e as entregou aos parlamentares.

Depois de sair do prédio da Câmara, acabou atropelado, no bairro Petrópolis, na esquina das ruas Petrólolis e Jornalista Osvaldo Rosenstock, já próximo da casa onde vivia. Um motorista de 55 anos perdeu o controle do veículo e atingiu a bicicleta do viúvo, que seguia pela ciclovia.

O motorista não sofreu ferimentos graves e, segundo a Polícia Civil, "não foi demonstrado que ele estava dirigindo alcoolizado, por isso, o condutor foi liberado".

De acordo com o delegado da 2DP de Joinville, Rodrigo Vicentini, um inquérito será instaurado para apurar a morte e, apesar da PM tratar o caso como homicídio culposo, quando não há intenção de matar, ainda não há certeza da tipificação do caso. A reportagem não conseguiu localizá-lo ou o seu representante legal.

O caso gerou comoção no parlamento de Joinville. Diversos vereadores usaram as redes sociais para homenagear Ari, que tinha como principal pauta a luta por melhorias nos serviços ofertados aos aposentados e pessoas idosas na cidade.

O líder comunitário foi sepultado no fim da tarde desta terça-feira (7), em Joinville.

Casal Ari e Marlete Cunha - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Casal Ari e Marlete Cunha
Imagem: Arquivo Pessoal

Confira, na íntegra, a carta de Ari a Marlete:

"Marlete,

Quando eu tinha você ao meu lado, me sentia mais forte. Hoje, me sinto muito fraco e sozinho, pois olho por todos os cômodos da casa e vejo tudo muito vazio sem a sua presença. Como eu sinto sua falta, meu coração sofre com a saudade. Sem você tem sido muito difícil viver e será assim até o fim da minha vida.

Não penso em mais nada além de você. Quando eu precisei de ti, sempre esteve presente ao meu lado e quando você precisou de mim, eu também estava. Estive ao lado da cabeceira da nossa cama procurando te acalmar muitas vezes, pois a dor que você sentia também doía em mim, pois juntos, formávamos um só corpo. Muitas lágrimas derramei por você nestes tempos difíceis.

Começamos nossa vida conjugal sem nada, mas, com a sua ajuda, conseguimos conquistar muitas vitórias e eu sentia que tínhamos muita riqueza de amor. Hoje, me sinto muito pobre. Você foi minha protetora, acolhedora, ajudadora e a segunda mãe. Permanecemos juntos por 52 anos, 7 meses e 1 semana que é igual 640 meses, 19.213 dias, 461.112 horas, 27.666.720 minutos ou 1.660.003.200 segundos. Aqui, nossas mãos se encontram para construir uma história."