Homem apontado como falso médico é solto; defesa vai ao MP contra polícia
O homem apontado pela Polícia Civil da Bahia como um falso médico foi solto na tarde de ontem, após o pagamento de fiança de dois salários mínimos. Apresentado por sua defesa como Fábio Dias Sant'ana, 41, ele havia sido preso na terça-feira (8), no HGE (Hospital Geral do Estado), em Salvador, suspeito de dar informações falsas quanto à possibilidade de recuperação a familiares do policial civil Yago da França Souza Avelar, 39.
O agente teve morte cerebral confirmada no sábado (6), um dia após a viatura em que estava capotar na BA-233, na região da Chapada Diamantina. Outros dois colegas dele morreram no local.
Autuado por exercício ilegal da profissão e falsidade ideológica, Fábio ficou detido na carceragem da DRFRV (Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos). Os advogados negam que ele tenha se apresentado como médico, mas sim como amigo de infância da vítima e estudante de medicina. Segundo os representantes, Fábio foi procurado pelos próprios familiares do paciente para dar sua opinião sobre o quadro dele.
Além de considerar a prisão ilegal, a defesa de Fábio pretende acionar o Ministério Público para apurar o que vê como "abuso de autoridade" e ainda cita homofobia no tratamento destinado a ele (leia abaixo).
O alvará de soltura foi assinado pela juíza Maria do Socorro Santa Rosa de Carvalho Habib, titular da Vara de Execução de Penas e Medidas Alternativas da capital baiana. Para a magistrada, não há fundamentos para a conversão da prisão em flagrante em preventiva.
Em seu despacho, a juíza afirma ainda que Fábio "não colocará em risco a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal". "Trata-se de crime de baixo potencial ofensivo e, em caso de futura condenação, não será possível a imposição de penas privativas de liberdade nos regimes semiaberto ou fechado", assinalou.
De acordo com a versão informada pela Polícia Civil — e questionada pela defesa do suspeito — Fábio deu esperanças de recuperação a parentes de Yago por meio de um áudio enviado a um familiar, chegando a assegurar que o policial estaria vivo.
Entre as informações repassadas à imprensa, inclusive ao UOL, a assessoria da corporação informou que, ao ser abordado pelos agentes no HGE, o suspeito usava jaleco, carregava um estetoscópio e uma cédula de identidade da Argentina. Ele teria se apresentado como Fábio C Michel Abrahim, a partir de um carimbo que exibia o nome, registrado como cirurgião no Conselho Regional de Medicina. Segundo a polícia, o suspeito disse ter se formado na Stanford University, na Califórnia (EUA), mas sem apresentar documentos que comprovassem sua habilitação para atuar na profissão.
O delegado Maurício Moradilo, da 1ª DT (Delegacia Territorial) dos Barris, instaurou um inquérito para apurar o caso, incluindo o acesso à unidade de saúde.
Ao rebater as informações da polícia, o advogado de Fábio, André Franklin, diz que o cliente chegou a cursar medicina na Argentina, mas trancou o curso no último ano por questões pessoais. O defensor nega que o cliente levasse um carimbo com a identificação de um cirurgião ou que tenha dito ter estudado em Stanford. Ele argumenta que o boletim levado aos familiares de Yago era de informações repassadas pelo próprio plantonista que cuidava do paciente, sem "nenhuma informação que traga prejuízo".
O defensor também afirmou que o estudante não foi indiciado por exercício ilegal da medicina, e sim por falsidade ideológica, pela falta de meios de verificação do documento argentino; e "exercício arbitrário das próprias razões", que corresponde a "fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite"
Homofobia, socos e pontapés
O advogado Luciano Bandeira Pontes, que também atua na defesa de Fábio, disse ao UOL que o abuso de autoridade e a prisão arbitrária dos quais ele foi vítima serão apurados pelo Ministério Público. Ao citar supostos excessos durante a abordagem, o defensor diz que o cliente foi alvo de homofobia e levou socos e pontapés de policiais civis. Pontes, contudo, não detalhou quais foram os supostos atos de preconceito e/ou discriminação sofridos pelo suspeito.
"A verdade é que a polícia cometeu o erro de divulgar a morte de um policial que ainda está vivo, e agora que fazer cortina de fumaça. E o 'bode expiatório' foi o Fábio", declarou o advogado.
Pontes citou uma nota de esclarecimento que classifica como "infundadas" as informações prestadas pela Polícia Civil e cobra providências no âmbito da Corregedoria, a fim de que a "verdade seja restabelecida".
Questionada pelo UOL sobre as alegações da defesa do suspeito, a Polícia Civil informou que o auto de prisão em flagrante por exercício ilegal da profissão e falsidade ideológica se baseia no que determina a legislação penal em vigor, e não em elucubrações.
A respeito do suposto ato de homofobia, a corporação afirma que não houve nenhuma menção à orientação sexual de Fábio.
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