Tatuadora tem braço amputado após fazer lipoescultura: 'Perdi meu sonho'
No auge da vida profissional, morando e trabalhando nos EUA, a tatuadora Camila Gama, 41, viu sua vida "virar de cabeça para baixo" após retornar ao Brasil para passar por um procedimento estético em uma clínica conceituada de Goiânia. De acordo com ela, após fazer uma cirurgia de lipoescultura, por um descuido do anestesista de plantão, seu braço direito apresentou uma trombose arterial que culminou na amputação do membro.
Nascida e criada na capital goiana, Camila mudou-se para os EUA aos 34 anos. Cansada de trabalhar como servidora pública por 16 anos, cinco deles na Polícia Civil, ela decidiu que era hora de buscar uma vida melhor e se mudou para os EUA, "com a cara e a coragem". Após alguns anos de muitos perrengues, surgiu a oportunidade de fazer um curso de micropigmentação em sobrancelha e o seu "sonho americano" começou a se concretizar.
"Eu comecei a ficar muito famosa, porque eu fazia fine line (linha fina), e aqui na região eu era a única brasileira que fazia esse estilo, que é muito delicado. Então, comecei a ficar bastante conhecida pelas redes sociais, pelo Instagram. Aí vinham pessoas do Tennessee, de outros estados fazer comigo. Eu fui ficando bastante conhecida", contou, lembrando que foi nessa época que sentiu o desejo de realizar um procedimento estético no corpo.
Eu estava na melhor fase da minha carreira, com muitos clientes, popular aqui na cidade, ganhando dinheiro, então eu decidi fazer a minha cirurgia plástica no Brasil, porque é mais barato. Algumas amigas indicaram um médico, com boas referências, e entrei em contato com ele online."
Após realizar uma bateria de exames e enviar para o médico, Camila marcou a data da cirurgia para o dia 3 de março e embarcou para o Brasil, com destino a Goiânia. O namorado, Marcos, ficou nos EUA, cuidando do filho dela, Caíque.
No dia marcado, a tatuadora estava no centro cirúrgico da clínica, realizando uma lipoescultura no corpo, do pescoço até o joelho. Tudo correu bem e, no dia seguinte, Camila já estava se recuperando na casa dos pais. Mas no quinto dia ela passou mal e precisou retornar à clínica. Estava com anemia.
Após receber duas bolsas de sangue, ela se sentiu melhor e recebeu alta. No dia seguinte, porém, desmaiou novamente no banho. Depois perdeu as forças nas pernas e não conseguia se movimentar. "Liguei para o médico, que pediu que eu voltasse até a clínica. Mas ele não estava lá e pediu a um médico de plantão para receitar um suplemento à base de ferro injetável".
Início do pesadelo
De acordo com Camila, após várias tentativas, as enfermeiras não conseguiram encontrar veia no braço para injetar o remédio. Ela então foi colocada numa maca e levada até o anestesista de plantão.
Foi aí que o meu pesadelo começou. Ele estava de máscara, não sei quem é, não sei o nome dele, ele simplesmente baixou a máscara e disse 'oi' para mim e pegou uma veia no meu pulso e injetou o medicamento. Comecei a sentir uma dor bastante forte, eu comecei a falar para todos que estava doendo, mas disseram que era normal, que o remédio doía mesmo e me levaram de volta para o quarto."
Cerca de 45 minutos depois, conta Camila, os dedos da mão começaram a escurecer. Sua mãe, que estava com ela, fez uma foto e enviou ao cirurgião plástico que havia feito a cirurgia na filha. Ele chegou à clínica acompanhado de um angiologista e a tatuadora foi levada de ambulância para um hospital, onde passou por duas cirurgias.
"Eles estavam tentando salvar minha mão, que já estava necrosando. Meu braço apresentava uma trombose na artéria até perto do ombro. Um especialista nessa área foi chamado também e sugeriu uma medicação que viria dos Estados Unidos para poder diminuir a trombose. Graças a esse medicamento ele conseguiu salvar metade do braço", recorda Camila, dizendo que a amputação foi necessária até um pouco acima do cotovelo.
De volta à casa dos pais, a tatuadora passou por um período difícil, de terapia ocupacional, com o objetivo principal de livrar-se da "dor do membro fantasma", uma condição que ocorre por que o cérebro leva um tempo para processar que o membro amputado já não está mais no corpo.
Vaquinha para a prótese
Com a ajuda do filho, Caíque, Camila criou uma vaquinha online no GoFundMe, visando arrecadar dinheiro para a continuidade do tratamento e também para poder comprar uma prótese especial, que custa cerca de R$ 100 mil, para poder voltar a trabalhar. Ela também tem recebido ajuda pelo Pix (62) 9 9312-7491.
Eu não perdi somente o meu braço, eu perdi o meu sonho, perdi o meu trabalho, eu perdi meus quase 9 anos de sonhos concretizados como imigrante."
Recentemente, a tatuadora recebeu permissão médica e retornou aos EUA para reencontrar o namorado e o filho. Apesar de ter se tornado dependente deles para coisas simples, como pentear os cabelos e amarrar os sapatos, ela afirma que não guarda mágoa ou raiva pelo que aconteceu. Ela diz que se surpreende por aceitar tão rapidamente a perda do braço e que espera conseguir juntar o dinheiro necessário para a compra da prótese e voltar ao trabalho o mais rápido que puder.
"Eu já faço alguns desenhos com a mão esquerda no iPad, eles ficam um pouco trêmulos, mas eu sei que com tempo e prática pode ficar muito melhor", acredita. "Não guardo rancor, sou feliz, amada, tenho família e amigos que me apoiam, sem falar no meu namorado e no meu filho, que estão fazendo tudo por mim. Mas quero ter certeza de que esse erro médico seja descoberto e a pessoa que fez isso, impedida de colocar em risco outras pessoas".
Para isso, Camila contratou dois advogados, um na área criminal, para provar o cometimento do erro médico, e outro na área cível, para reivindicar os danos morais, materiais e estéticos que ela sofreu.
Após contatar os advogados, a tatuadora diz ter descoberto que a clínica onde realizou a cirurgia enfrenta mais de 120 processos, incluindo casos de amputação e de morte dos pacientes. "Era a melhor clínica da cidade, a clínica mais chique da cidade. Mas está cheia de processos".
Enquanto aguarda pelo andamento dos processos, Camila afirma que não vai esmorecer e nem se deixar influenciar pelos aspectos negativos da amputação.
"Eu simplesmente aceitei, eu recebi muito amor, eu recebi muito apoio. Então eu me sinto grata só de estar viva. E saber que eu podia voltar para os EUA e estar com meu filho, ver meu filho crescer. Estar com meu namorado e estar aqui, sabe? Viva. Então eu sinto uma gratidão imensa no meu coração", afirmou.
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