Bean bag: como é munição que matou torcedor do SPFC, segundo delegada

Um novo tipo de munição adotado pela Polícia Militar de São Paulo em substituição às balas de borracha, com a justificativa de trazer menor letalidade, atingiu um torcedor do São Paulo que morreu nos arredores do Estádio Cicero Pompeu de Toledo, na capital paulista, no domingo passado (24), durante as comemorações da conquista da Copa do Brasil. A informação foi confirmada pela delegada Ivalda Aleixo à Folha.

Segundo o jornal, fotos indicam que a vítima, Rafael dos Santos Tercílio Garcia, foi ferida na cabeça por objeto semelhante a um "bean bag", saco contendo pequenas bolas de metal que é justamente a nova munição utilizada pela PM em substituiçao às balas de borracha. O caso é investigado pela Polícia Civil.

A corporação está realizando a troca gradual das balas de borracha pelos BBs (bean bags), expresão em inglês que significa sacos de feijão, alegando a existência de estudos comprovando o risco menor de mortes e ferimentos causados pelo novo armamento. Contudo, especialista em segurança ouvido pelo UOL alerta que, dependendo do uso, os BBs podem ferir gravemente e até matar.

Segundo comunicado enviado pela PM à reportagem em julho passado, esse tipo de munição é projetado para se alastrar ao atingir o alvo, minimizando o risco de penetração em tecidos moles "e configura um propelente (impulsor) moderno, com mais precisão, maleável e moldável, adaptando-se a diferentes plataformas de armas utilizadas, como a espingarda calibre 12".

A Polícia Militar paulista cita estudos acadêmicos de laboratórios e institutos, como os publicados pela N.I.J. (National Institute of Justice), nos EUA, que apontam as vantagens de trocar balas de borracha pelos BBs.

'Bean bags têm vantagens mínimas'

O bean bag é uma munição composta por bolinhas de chumbo envoltas em um tecido sintético e inseridas em um cartucho
O bean bag é uma munição composta por bolinhas de chumbo envoltas em um tecido sintético e inseridas em um cartucho Imagem: Reprodução/Wikipedia

Até julho, a Polícia Militar havia adquirido 20 mil modelos de BBs, por meio de um investimento de R$ 620 mil.

As balas de borracha, também chamadas de elastômetro ou PICs (Projéteis de Impacto Controlado) foram objeto de diversas polêmicas ao longo dos anos, como durante os protestos contra o aumento da tarifa de ônibus que ocorreram em São Paulo, em 2013. Muitas pessoas ficaram feridas e um repórter fotográfico perdeu a visão, supostamente ao ser atingido por essas balas.

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Segundo Eduardo Llanos, especialista em segurança pública e licenciado em ciências policiais, tecnicamente as vantagens dos BBs no lugar das balas de borracha são mínimas.

"O que faz a diferença é a utilização por parte de um agente treinado para analisar, determinar e agir controladamente ao momento da deflagração do projétil, uma vez que ambas podem-se tornar letais", afirma.

Risco de ferimentos graves

Ele explica que as balas de borracha, dependendo da distância do disparo e do local do corpo atingido, provocam ferimentos graves, como a perda de um globo ocular, a perfuração de órgãos vitais, como o coração e os pulmões, podendo provocar traumatismo com danos cerebrais e até a morte de uma pessoa, tornando-se uma arma letal. Dependendo da sua utilização, esse tipo de projétil configuraria um perigo para qualquer tipo de imobilização de uma pessoa ou grupos violentos.

Porém, segundo o especialista, os riscos também são inerentes quando se trata do uso dos BBs. "Diante do resultado do impacto no corpo de uma pessoa, uma bala de borracha pode produzir uma lesão maior em razão da sua estrutura e composição quando comparado com os bean bags, mas tudo sempre vai depender da distância do disparo", avisa.

Os BB foram projetados para atingir especificamente os membros inferiores do corpo, aparentemente sendo uma opção menos letal que as balas de borracha, mas os fabricantes deste tipo de munição alertam que, se atingir a cabeça, pescoço, tórax ou coluna, podem causar lesões irreversíveis e inclusive a morte.

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"A finalidade deste tipo de arma sempre foi atingir locais do corpo que permitam imobilizar temporariamente uma pessoa agressiva, entre eles as pernas e braços, mas diante de uma situação que é necessária uma ação rápida em defesa própria ou de terceiros, se torna impossível cumprir com o propósito principal da sua utilização".

Segundo a PM, os policiais militares que utilizam os projéteis considerados menos letais são devidamente habilitados e treinados. Esse é um dos pontos mais importantes, segundo o especialista. Na sua avaliação, a substituição da bala de borracha pelo BB não trará nenhum resultado positivo se ele for utilizado sem que se obedeça às instruções dos fabricantes. Eles determinam, por exemplo, uma distância mínima, correspondente a 20 metros, para seu acionamento, evitando atingir locais do corpo que permitam um resultado de alta letalidade.

"Para que este ou qualquer outro tipo de deflagração de projéteis menos letais utilizados normalmente para conter multidões ou pessoas violentas tenha resultados positivos, é preciso que seu operador se encontre capacitado para discernir em momentos de alta pressão psicológica se seu disparo vai cumprir com todas as exigências necessárias para seu completo êxito", declara Llanos.

"Quando se trata de controlar pessoas ou multidões violentas é necessário que se entenda que a utilização de armas menos letais corresponde à penúltima instância necessária. No quadro relativo é necessário ter em mente que existe um sistema gradual objetivo para a contenção de multidões violentas, que remete a um fluxo gradual de intervenção. Ele tem seu início no diálogo, seguido de contenção, dissuasão, dispersão, desocupação e detenção, momento no qual são utilizadas as armas que deflagram projéteis menos letais", conclui.

*Conteúdo baseado em reportagem publicada originalmente em 11 de julho de 2023

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