Marielle: Brazão recebeu mais de meio milhão do TCE mesmo sem trabalhar

Domingos Brazão acumulou 420 dias de férias como conselheiro do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Rio). Sem trabalhar após ter ficado uma semana preso por causa de uma investigação de corrupção, em 2017, ele acabou recebendo R$ 581 mil pelas folgas não tiradas.

O que aconteceu?

Mesmo após sua prisão, no último domingo (24), Brazão ainda não foi exonerado do cargo. Ele é apontado pela Polícia Federal como um dos responsáveis por arquitetar a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) e seu motorista Anderson Gomes.

Domingos Brazão foi eleito conselheiro do TCE-RJ em abril de 2015, por indicação da Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro). Vitalício e com garantias semelhantes às dos magistrados do Judiciário, o cargo tem salário inicial de R$ 39.717.

Em março de 2017, Brazão foi preso e afastado do cargo. Suspeito de corrupção, ele foi investigado na Operação Quinto do Ouro, pela Polícia Federal. Desde então, o ex-parlamentar e conselheiro afastado continuou recebendo salário, benefícios e férias do TCE.

O tribunal é o órgão responsável pela fiscalização da aplicação dos recursos públicos por parte dos governantes. O uso de todo o dinheiro do contribuinte aplicado em impostos é verificado por esse setor da administração pública, que tem sua missão e atribuições definidas pela Constituição.

Indicações para conselho vêm da Alerj e do governador. São quatro indicados pelos deputados e três pelo chefe do Executivo estadual. Dos três indicados pelo governador, dois devem vir da função de procurador do Ministério Público ou auditor de contas.

Requisitos do cargo incluem "idoneidade moral e reputação ilibada". Outros critérios são ter mais de 35 e menos de 65 anos de idade, ter "notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública" e ter usado esses conhecimentos em alguma atividade profissional por ao menos dez anos.

O relatório final da PF sobre o caso Marielle aponta que a nomeação de Brazão chegou a ser questionada pelo PSOL na época.

A assunção ao cargo foi deveras questionada sob a alegação de não ter sido observado o rito procedimental previsto em lei, bem como em razão de sua incapacidade para exercício do cargo, que supostamente deveria ser ocupado por um servidor de carreira. Diante disso, a bancada do PSOL na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro trouxe mais polêmica ao caso quando, dias após a nomeação, declarou que iria judicializar a questão. Além de questionar a inobservância dos aspectos formais entre a eleição e a nomeação ao cargo, o partido questionou a capacidade técnica de Brazão, sob a alegação de que este não atendia ao requisito do 'notório saber'.
Relatório da PF

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TCE-RJ diz que "não foi notificado sobre eventuais medidas a serem tomadas". Em nota, o tribunal afirmou que, "na hipótese de notificação, será determinado o imediato cumprimento da decisão judicial. Nesse contexto, o tribunal está adotando os procedimentos regimentais para assegurar que não haja prejuízo ao regular prosseguimento das suas atribuições constitucionais".

Brazão até hoje mantém influência política, por meio dos irmãos. Chiquinho, também suspeito de ser mandante do crime e preso junto com Domingos, é deputado federal. Outro irmão, Pedro Brazão (União Brasil), é deputado estadual. Em eleições passadas, Domingos chegou a emprestar o sobrenome a outros candidatos sem parentesco com ele. Outras acusações recorrentes são de ligação com a milícia, na zona oeste da cidade.

As prisões de domingo aconteceram após delação de Ronnie Lessa, acusado de ser o executor do crime. Ele apontou Chiquinho e Domingos como mentores intelectuais. A citação a Chiquinho, que é deputado, motivou a transferência do caso do Superior Tribunal de Justiça para o STF.

Domingos, Chiquinho e o delegado e ex-chefe da Polícia Civil do Rio Rivaldo Barbosa foram presos na capital fluminense. A operação foi deflagrada no domingo porque os suspeitos apresentavam risco de fuga. Por volta das 16h de domingo, eles chegaram a Brasília, para onde foram transferidos pela PF.

Além dos três mandados de prisão, foram cumpridos 12 de busca e apreensão, todos no Rio. A investigação confirmou buscas contra o ex-titular da Delegacia de Homicídios Giniton Lages, além de Marcos Antônio de Barros Pinto e Erika de Andrade de Almeida Araújo, mulher do delegado Rivaldo Barbosa.

Lages esteve ontem na Secretaria de Administração Penitenciária (Seap), no centro do Rio, para colocar uma tornozeleira eletrônica.

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Segundo o relatório da PF, os irmãos mandaram matar Marielle porque a vereadora atrapalhava os interesses dos irmãos Brazão. Em especial, por sua atuação junto a comunidades em Jacarepaguá, em sua maioria dominadas por milícias, onde se concentra relevante parcela da base eleitoral dos suspeitos.

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