Conteúdo publicado há 1 mês

Morte de atropelada por Porsche segue sem resposta há mais de 1 ano em SP

A família de Simone Ferreira dos Santos, de 51 anos, está há mais de um ano sem resposta da Polícia Civil de São Paulo sobre o atropelamento e morte da auxiliar de limpeza.

O que aconteceu

A trabalhadora morreu no dia 18 de janeiro de 2023 após ser atropelada por um empresário que conduzia um Porsche 911 Carrera. O caso é semelhante ao de Fernando Sastre de Andrade Filho, que está preso e é réu pela morte de um motorista de aplicativo após colisão na capital paulista em março deste ano.

Simone foi atropelada quando estava a caminho do trabalho. O atropelamento da trabalhadora pelo Porsche, conduzido pelo empresário Fábio da Silva de Oliveira, hoje com 39 anos, ocorreu no dia 18 de janeiro de 2023, por volta das 22h, na Avenida Vereador Abel Ferreira, no bairro Vila Regente Feijó, na zona leste de São Paulo.

A mulher foi encaminhada ao Hospital Municipal do Tatuapé, na zona leste, mas já chegou morta ao local. A causa da morte foi politraumatismo provocado por agente contundente e a auxiliar perdeu um braço no atropelamento, segundo o laudo necroscópico obtido pelo UOL. Fábio não deixou o carro no local do acidente e parou o automóvel de luxo em uma rua próxima, conforme mostrado por imagens disponíveis no inquérito policial.

Laudo pericial, realizado na madrugada de 19 de janeiro, aponta que o empresário atrapalhou o procedimento. O médico legista discorreu no documento que o empresário se recusou a ser fotografado, retirar a roupa para exame físico e não permitiu a coleta de exame de sangue para análise de dosagem alcoólica. O laudo também indica que Fábio teria afirmado ter bebido três latas médias de cerveja cerca de cinco horas antes do atropelamento.

PM que atendeu ocorrência também citou bebidas alcoólicas. Uma agente falou em depoimento que Fábio se recusou a fazer o teste do bafômetro e teria argumentado que "naquela tarde teria ingerido pequena quantidade de álcool e temia que o teste desse positivo para embriaguez".

Depoimento do condutor do veículo, ocorrido em abril de 2023, traz versão diferente. À polícia, Fábio negou ter consumido bebida alcoólica e, ao ser questionado sobre o motivo porque ele não fez o bafômetro após o atropelamento, o homem disse que ficou "em choque" e que os policiais disseram na ocasião que não era obrigatório.

Namorada de empresário afirmou em depoimento, em março de 2023, que não o viu beber e também declarou que ele não estava embriagado. A mulher disse que Fábio parou em um semáforo, depois saiu com o veículo em velocidade normal quando, mais a frente, Simone teria aparecido fora da faixa de pedestres em um local escuro e com pouca iluminação. Sobre colocar o carro em uma rua próxima, a namorada alegou que o companheiro procurou um "lugar seguro para estacionar" já que a avenida era movimentada.

Foto mostra como o Porsche ficou após Simone ser atropelada em janeiro em 2023
Foto mostra como o Porsche ficou após Simone ser atropelada em janeiro em 2023 Imagem: Obtido pelo UOL
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Demora em pedido pela polícia

Polícia Civil pediu as imagens de câmeras de monitoramento quase um mês após o atropelamento e depois da solicitação da defesa da família de Simone. Em resposta às autoridades, a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) comunicou que não havia equipamento de monitoramento de trânsito no local do acidente. A companhia também informou que os equipamentos nas proximidades não registraram a passagem do Porsche nas vias na data e horário questionado pelas autoridades.

Já uma loja de carros de luxo próximo ao local do atropelamento também não tinha os registros das câmeras. Aos investigadores, a gerente do local explicou que as imagens não ficam salvas e são deletadas após 15 dias da data do registro. Como a solicitação foi realizada fora deste período, os registros não existiam mais.

Caso de Simone é apurado no 30º Distrito Policial, no Tatuapé, na zona leste da capital, mesma delegacia onde o caso do empresário Fernando Sastre de Andrade Filho foi investigado.

Inquérito policial é concluído, mas MP pediu mais apurações

Inquérito policial, finalizado em abril de 2023, aponta que Fábio não estaria embriagado e obedecia às regras de trânsito no momento do acidente. O órgão policial decidiu indiciar o empresário por homicídio culposo (quando não há intenção de matar) na direção de veículo automotor. O crime prevê pena de detenção de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir.

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Nove dias depois, o MPSP (Ministério Público de São Paulo) pediu — e a Justiça aceitou — que o inquérito voltasse à delegacia para coleta de mais informações. Entre as solicitações estavam o pedido para que o IC (Instituto de Criminalística) analisasse as imagens da rua onde Fábio deixou o carro e identificar uma testemunha, que é um motorista que fotografou o Porsche amassado logo após o atropelamento, já fora do local onde Simone foi ferida.

Neste meio tempo, o MP mandou o inquérito voltar para a delegacia outras vezes para esclarecimentos. Entre eles, um laudo do IC, finalizado em 17 de dezembro de 2023, apontou algumas possibilidades da composição da placa do motorista que fotografou o Porsche após o acidente e não identifica a testemunha. Em fevereiro deste ano, o órgão ministerial afirmou que o documento encaminhado pela polícia não esclarece os questionamentos do MP.

Desde então, o inquérito segue parado na Polícia Civil. Questionado pelo UOL em abril, o MP informou que pediu diligências complementares ao inquérito policial e agora espera as respostas da polícia para decidir se denúncia ou não Fábio pelo crime. Se o empresário for denunciado pelo MP, cabe à Justiça decidir se o homem irá virar réu ou não pelo homicídio.

Procurada pela reportagem, a SSP-SP disse que realiza diligências para identificar e ouvir a testemunha que fotografou o carro de luxo. A Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo também informou que investiga a morte da auxiliar e que o inquérito voltou à delegacia para cumprimento de solicitação do MP.

Irmã pede justiça

Sandra Godoy disse ao UOL que entrou em depressão após o falecimento da irmã. Ela relatou que tinha medo de falar sobre o caso em razão do poder aquisitivo de Fábio, mas decidiu pedir justiça após ver a repercussão do caso do motorista de aplicativo Ornaldo da Silva Viana, morto após o condutor de um Porsche colidir contra o automóvel dele em 31 de março, também na zona leste de São Paulo.

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A auxiliar de limpeza Simone Ferreira dos Santos tinha 51 anos
A auxiliar de limpeza Simone Ferreira dos Santos tinha 51 anos Imagem: Obtido pelo UOL

Irmã diz que Fábio nunca procurou a família para falar sobre o atropelamento. "É isso que mais mata a gente. Não é o dinheiro, não é nada. A gente é pobre, humilde, mas a dor que a gente está sofrendo é pela impunidade. Porque minha irmã não vai voltar, nem que ele pague o dinheiro que ele quiser para gente, não vai trazer minha irmã de volta. A gente não quer dinheiro, a gente não quer coisa, queremos justiça."

Outro lado

A defesa de Fábio Oliveira nega que o empresário estava embriagado e diz que Simone atravessava fora da faixa no momento do atropelamento — o que é contestado pela família da vítima. Ao UOL, a defesa ainda apontou que a auxiliar foi "negligente" por tentar cruzar uma via movimentada fora do local correto e que o empresário não fugiu do local.

Por fim, a defesa de Fábio ainda disse que a família da vítima está "forçando uma situação". Na fala, o advogado indica um possível interesse financeiro.

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