Morte de Miguel completa quatro anos sem conclusão: 'Descaso', diz mãe
A morte de Miguel Otávio Santana da Silva, de cinco anos, completa quatro anos neste domingo (2). A criança não resistiu aos ferimentos após cair do 9º andar, cerca de 35 metros de altura, de um prédio de luxo na região central do Recife. Desde então, a mãe do garoto, Mirtes Renata Santana, luta para que o caso seja concluído pela Justiça.
Saiba como está o caso na Justiça
Quatro processos tramitam na Justiça de Pernambuco. Além da esfera criminal, o caso corre na área trabalhista. Há ainda uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em Pernambuco.
Sari Mariana Costa Gaspar Corte Real, ex-patroa da mãe de Miguel, responde em liberdade. Na área criminal, ela foi condenada em maio de 2022 por abandono de incapaz. Em um novo julgamento, a Justiça de Pernambuco diminuiu a pena de Sarí Corte Real de oito anos e seis meses de prisão para sete anos em regime fechado. A pena máxima para o crime é de 12 anos de reclusão.
Família recorreu da redução da pena. A advogada Maria Clara D'Ávila, explicou que a redução da pena ocorreu porque os desembargadores desconsideraram algumas circunstâncias agravantes da pena. "Como a valoração negativa da personalidade e da conduta social da ré Sari, bem como a agravante em razão do crime ter sido cometido no contexto da pandemia", disse ao UOL.
A advogada Maria Clara D'Ávila considera que tais circunstâncias agravantes e merecem ser mantidas. Ela informou vai entrar com recurso cabível no Superior Tribunal de Justiça para o aumento da pena.
Defesa de Sari também recorreu. Advogados pediram a redução da pena. Atualmente, os recursos de ambas as partes ainda estão tramitando no Tribunal de Justiça de Pernambuco.
Mirtes cita descaso no andamento dos recursos e cobra Justiça para resolução do caso. "Ainda precisa do julgamento dos recursos para depois subir para Brasília. Esse tempo todo para analisar os recursos, que são os embargos de declaração, e ainda não foi feito nada?", questionou a mãe em uma publicação nas redes sociais.
A reportagem procurou o TJPE para esclarecer o andamento do caso, mas não houve retorno.
Eu vejo também um pouco de descaso. E olha que é um crime que tomou uma proporção internacional e ainda não foi resolvido. Enquanto casos parecidos com o do meu filho já foram resolvidos. Um exemplo é o caso do menino Henry Borel, que já prenderam o padrasto e a mãe. E a Sarí? Está solta. Porque é o caso de um menino preto. Porque se fosse o caso de um menino branco, já teria sido resolvido. É bem nítida essa questão. Preciso da celeridade do TJPE.
Mirtes Santana
Área trabalhista
As decisões mais recentes foram desfavoráveis. No dia 15 de maio, a Justiça do Trabalho em Pernambuco reduziu de R$ 2 milhões para R$ 1 milhão a indenização que deve ser paga por Sarí e o marido à família de Miguel. A decisão foi da Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região.
Justiça decidiu que a nova indenização por danos morais será de R$ 500 mil para cada autora. Em primeira instância, no dia 6 de setembro de 2023, o juiz João Carlos de Andrade e Silva havia decidido que os réus deveriam pagar R$ 2.010.000 a Mirtes e sua mãe
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Quero receberA nova decisão foi unânime. A ação teve relatoria da desembargadora Solange Moura de Andrade. Sua decisão foi seguida, por unanimidade, pelos desembargadores Virgínio Benevides e Fernando Cabral Filho. O processo ainda é passível de recurso.
O UOL entrou em contato com a defesa de Sérgio Hacker Corte Real e Sari Mariana Costa Gaspar para saber se o casal irá recorrer da decisão. Não houve retorno. O espaço segue aberto para manifestação.
Para a desembargadora, foi evidente que a perda de Miguel só aconteceu em razão da relação de trabalho existente. Mirtes e Marta prestavam serviço doméstico no apartamento dos réus, situado no mesmo edifício, durante a pandemia, quando não havia escolas ou creches funcionando.
Também houve concessão de outras duas indenizações por danos morais. Decisão diz que deve ser pago R$ 10 mil para cada uma das reclamantes, em razão de fraude contratual, sendo o total de R$ 20 mil. Isto porque, embora ambas as trabalhadoras prestassem serviços domésticos aos réus, estavam registradas como funcionárias da Prefeitura de Tamandaré (PE), município do qual Sergio Hacker Corte Real era prefeito.
Relatora do acórdão defendeu que tal conduta trouxe danos à honra e à imagem das reclamantes. Argumentou ainda que também ficaram sem remunerações que lhes eram de direito - como verbas rescisórias e auxílio-desemprego.
Mãe e filha também devem ser indenizadas em R$ 5 mil cada por danos morais em razão do trabalho na pandemia. Para a relatora, o tipo de serviço que Mirtes e Marta Santana desempenhavam não era considerado essencial por lei, portanto elas deveriam ter feito o lock down. Desembargadora-relatora citou se guiar por critérios de razoabilidade, proporcionalidade, porte econômico dos réus, valor indicado pelas autoras em sua petição inicial e pelo caráter educativo que a decisão proporcionará.
Advogada de Mirtes e Marta informou ao UOL que a diminuição do valor não será objeto de recurso. Karla Cavalcanti esclareceu que irá analisar a decisão, e que apesar da redução significativa no valor da indenização, entende que não se trata de uma reparação pela vida de Miguel, pois isso não tem preço. "A condenação tem caráter compensatório e educativo. O alcance desta condenação ultrapassa os limites do processo e reflete na sociedade. O Tribunal Regional do Trabalho cumpriu o seu papel: fez justiça não só à Mirtes e Marta, mas a uma classe que luta há muitos anos por seus direitos: as domésticas", afirmou.
Outras duas ações foram ajuizadas no Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região. Mãe e filha pleiteiam verbas trabalhistas como 13º, férias e seu adicional de 1/3, aviso prévio indenizado.
Ação civil pública
Há ainda a ação civil pública ajuizada em julho de 2020. O Ministério Público do Trabalho em Pernambuco pleiteou a condenação de Sari Costa Gaspar e Sergio Hacker Corte Real por danos morais coletivos. Neste último caso, havendo indenização, ela será direcionada ao Fundo de Amparo ao Trabalhador ou em favor de entidade pública, ou filantrópica indicada pelo MPT-PE que atue em benefício social.
Danos morais coletivos. Em 14 de março de 2021, o juiz substituto José Augusto Segundo Neto condenou o casal a pagar R$ 386.730,40 por danos morais coletivos.
Defesa recorreu. O Tribunal Superior do Trabalho chancelou a decisão e a manteve. O caso julgado pelo TST não diz respeito ao processo criminal, que ainda está em curso, mas sim à contratação fraudulenta de Mirtes e sua mãe.
Trata-se de um casal em que o marido era prefeito de uma das cidades da região metropolitana de Recife e estava usando o trabalho doméstico de duas trabalhadoras negras em sua casa durante o período de pandemia sem qualquer adoção de medidas de segurança e de defesa para a saúde delas.
Ministro José Roberto Freire Pimenta durante o julgamento
E alega no processo que elas não eram suas empregadas, e sim do município, e que ele tinha desviado as trabalhadoras para trabalhar em sua residência, como se ainda vivêssemos no período colonial.
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