Cidade onde Bolsonaro se criou tem quilombola do PT enfrentando centrão
Na eleição municipal da pequena Eldorado, cidade de pouco mais de 15 mil habitantes no Vale do Ribeira, região mais pobre do estado de São Paulo, a maioria dos candidatos quer estar bem com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e com a população quilombola ao mesmo tempo.
Isso porque o município é o lugar que Bolsonaro chama de terra natal e ao qual se refere pelo antigo nome: Xiririca —embora tenha nascido em Glicério (SP), foi criado em Eldorado. Mas a cidade também abriga 12 quilombos, com cerca de 600 famílias no total. Conclusão: seria um erro estratégico falar mal tanto de um quanto de outro.
O problema é que os quilombolas de Eldorado estão furiosos com o tal "filho ilustre" da cidade. Em 2017, durante a pré-campanha eleitoral, o então deputado federal Jair Bolsonaro fez um discurso, no Rio, que resultou numa denúncia contra ele por racismo. A fala que revoltou os quilombolas do Vale do Ribeira foi: "Eu fui em um quilombo em Eldorado. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas".
Por 3 a 2, o STF rejeitou a denúncia, mas, nos quilombos de Eldorado, a mágoa ficou.
Segundo o agricultor Benedito Alves da Silva, 65, fundador do PT em Eldorado em 1981 e pioneiro na luta pela demarcação dos 12 quilombos da cidade, em especial o de Ivaporunduva, "Bolsonaro nos chamou de vagabundos. Nos deixou abaixo de zero, arrebentou com nós (sic)", diz o militante petista.
Apesar de ter integrado a coligação que venceu as últimas eleições em Eldorado, o PT desta vez lança candidato próprio. Aliado ao PV, o partido tem, pela primeira vez, um quilombola concorrendo à prefeitura. Trata-se do advogado Oriel Rodrigues de Moraes, 48.
Também há cinco candidatos a vereador, quatro deles quilombolas: Setembrino dos Quilombos e Marcinha Esperança, do Ivaporunduva, Nany Furquim, do Pedro Cubas de Cima, e Ivo do Sapatu [nome de seu quilombo], atual presidente do PT local. O único não quilombola é o já vereador Cido.
Nos quilombos, há em torno de 1.500 dos 11.635 eleitores da cidade. A cidade é uma das mais pobres das 645 do estado, ficando em 557º lugar no critério renda. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), apenas 10,8% da população local tem emprego formal.
Se tiver a adesão de todos os eleitores quilombolas, a candidatura petista pode ter sucesso --em 2016, o TRE computou apenas 8.451 votos válidos. A cidade tem mais três candidatos ao Executivo: o atual prefeito, Dinoel Pedroso (PL), o vereador Tikinho Feliciano (Republicanos) e Zetinho (DEM).
Moraes chegou a conversar brevemente com o UOL dias antes da convenção que confirmou sua candidatura. Disse que estava receoso, pois se tratava de uma iniciativa inédita que poderia incomodar.
Desde então, não quis mais falar com a reportagem. A candidata à vice na chapa, Ivy Wiens, disse que iriam evitar falar com imprensa de fora da cidade para não polarizar a eleição em Eldorado.
O atual prefeito foi candidato a vice na última eleição. Dinoel (PL) assumiu o cargo quando o então prefeito Vadico renunciou, em junho deste ano, para tratar de problemas pessoais.
Coligado com PT na eleição anterior, Dinoel conta que tem bom relacionamento com os quilombos e com a família de Bolsonaro.
"Nas duas vezes em que Bolsonaro esteve aqui [como presidente], eu fiz a recepção. A gente convive muito bem com a família dele. A cidade é pequena e todo mundo se conhece", afirmou.
O mesmo discurso tem o ex-prefeito Zetinho. Disse que quase teve Geraldo Bolsonaro, pai do presidente, como seu vice em 1988.
"Na eleição seguinte, eu queria desistir e ele me animou. Subiu no meu palanque e tudo", contou. "Nesses tempos em que estive na política, sempre quando ia a Brasília passava no gabinete do Jair para tomar café. A gente tem uma história longa de amizade", completou, falando visitar bastante os quilombos.
O vereador Tikinho Feliciano (Republicanos) também diz ter um bom relacionamento com os quilombos. E orgulho de viver na cidade do presidente.
"Por causa de Bolsonaro, Eldorado é conhecida nacional e mundialmente. Para mim, ele vem desempenhando um bom papel, mas a família dele quase não participa da política local. Ele mesmo já disse que não vai se envolver nas questões municipais", afirmou.
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