Topo

Entre otimismo e cautela, equipe de Lula tenta conter clima de 'já ganhou'

O ex-presidente Lula (PT) em comício em Belém - Ricardo Stuckert
O ex-presidente Lula (PT) em comício em Belém Imagem: Ricardo Stuckert

Do UOL, em São Paulo

18/09/2022 04h00

A duas semanas das eleições, a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) encara um impasse. Com pesquisas indicando possibilidade de vitória em primeiro turno —ainda que apertada—, o grupo se divide entre estimular aqueles que acreditam na vitória no primeiro turno ou mostrar cautela, acenando que estão satisfeitos ainda que haja uma segunda etapa.

A equação é complicada: a campanha considera que manter o tom otimista é determinante para conquistar o "voto útil" de indecisos ou de eleitores de outros candidatos. Assim, a eleição acabaria no primeiro turno. Por outro lado, se adotar essa estratégia e houver segundo turno, o PT teme que isso pareça uma vitória do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Por enquanto, Lula tem jogado um pouco dos dois lados —fala que quer ganhar no primeiro turno, mas lembra que isso seria inédito para o PT; diz querer votos de todos, mas nega praticar voto útil. Mas a campanha quer seguir um caminho só.

O fantasma do derrotismo. Desde o lançamento da pré-candidatura, no início de junho, a campanha petista tem assumido um tom otimista.

Com Lula liderando as pesquisas durante todo o ano, a equipe não só tem trabalhado forte para uma vitória já em 2 de outubro, como faz questão de deixar isso claro. Não são poucas as referências de vitória em primeiro turno nos discursos de todos os apoiadores e do próprio ex-presidente.

De todas as eleições que eu disputei, sempre quis ganhar em primeiro turno. Claro que estou trabalhando para isso."
Lula, em Montes Claros, na quinta-feira (15)

A postura assertiva tem seus motivos: dentro do PT, há um fantasma da campanha de 2018, quando Lula foi preso e tirado da disputa, e o ex-ministro Fernando Haddad (PT) acabou derrotado por Bolsonaro.

O partido avalia que, depois de uma série de acontecimentos desfavoráveis (impeachment de Dilma Rousseff, grande derrota nas eleições municipais de 2016 e prisão do ex-presidente), o PT fez uma campanha cabisbaixa, com exceção do movimento "Vira voto" no segundo turno, enquanto Bolsonaro tinha postura altiva ("Melhor Jair se acostumando").

Neste ano, o tom que o PT buscou —e conseguiu— é diferente. A campanha e seus eleitores estão confiantes, os eventos têm tom otimista e a vitória na primeira etapa segue no horizonte.

Na trave. Membros da campanha dizem que em todas as pesquisas qualitativas e quantitativas que eles fazem há dois números que não caem, embora as intenções de voto de Bolsonaro tenham crescido:

  • O apoio a Lula, superior a 40%, e
  • A rejeição ao presidente, acima dos 50%.

Na última semana, tanto o Ipec (ex-Ibope) quanto o Datafolha voltaram a dar um fôlego, com ampla vantagem de Lula, mas indicam que a ida para o segundo turno tem se mostrado cada vez mais provável. Até julho, eles indicavam que Lula levaria no começo de outubro.

Torcedores, calma. Se os números são favoráveis e o clima, otimista, há uma parcela dentro da campanha que pede um pé atrás.

O cálculo para o grupo é que, mesmo que Lula apresente a vantagem que eles esperam, ir para um segundo turno quando o partido falava em vitória imediata pode parecer uma vitória de Bolsonaro e estimular, consequentemente, um movimento de reação bolsonarista.

É como no futebol, eles dizem, quando um time consegue levar o jogo para a prorrogação no finalzinho. Mesmo que o outro saia na frente, há uma sensação de derrota.

Parte disso já está sendo usada por apoiadores de Bolsonaro, que costumam desacreditar as pesquisas, mas viram com empolgação o crescimento do presidente nos últimos dois meses.

Esta tendência de alta também levantou um sinal de alerta para o clima de "já ganhou" que tomou a campanha.

Sinal duplo. Por isso, Lula tem apostado, até então, em uma postura que deixa aberta a todas as possibilidades. Em seus discursos, ele vem pedindo aos eleitores "uma ajuda" para conquistar os cerca de dois a quatro pontos percentuais que faltam para garantir a vitória no primeiro turno.

Eu espero ganhar no primeiro turno, estou trabalhando para isso. Por isso estou pedindo voto. [Mas] se o povo não votar, nós vamos ter segundo turno e vamos fazer o segundo turno normalmente. É uma decisão do povo, mas eu quero ganhar no primeiro turno."
Lula, em entrevista nesta semana

Na mesma fala, ele lembra, no entanto, que o PT nunca ganhou um pleito no primeiro turno —algo só conquistado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1994 e 1998.

O ex-presidente também diz respeitar os outros candidatos e promete não praticar a política de voto útil contra Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) —ao mesmo tempo que dá algumas cutucadas nos adversários.

"Eu não sou favorável à teoria de impedir o outro de ser candidato. Eu fui vitima do voto útil muitas vezes, nunca aceitei isso. Acho que o povo tem que ter liberdade de escolher seus candidatos", declarou, em coletiva em Montes Claros (MG).

No partido, o único consenso é que, para essas duas semanas, é preciso escolher uma estratégia só —falta definir qual.