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Com Bolsonaro estagnado, candidatos militares a governador não decolam

O deputado federal Capitão Wagner, candidato ao governo do Ceará, viu adversário petista crescer oito pontos em duas semanas - Cleia Viana/Câmara dos Deputados
O deputado federal Capitão Wagner, candidato ao governo do Ceará, viu adversário petista crescer oito pontos em duas semanas Imagem: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Do UOL, no Rio

27/09/2022 04h00

Com o presidente Jair Bolsonaro (PL) estagnado nas pesquisas e com a perda de popularidade da Operação Lava Jato, policiais e militares enfrentam dificuldades para tentar viabilizar suas candidaturas aos governos estaduais, conforme mostra levantamento feito pelo UOL com base em dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) (veja tabela abaixo).

Neste pleito, 18 policiais, bombeiros e militares das Forças Armadas tentam se eleger governadores —em 2018, eleição marcada pela onda bolsonarista, foram apenas oito. Apesar do aumento das candidaturas, apenas dois deles lideram as pesquisas. Carlos Moisés (Republicanos) e Coronel Marcos Rocha (União Brasil), ambos governadores buscando a reeleição, estão na frente em Santa Catarina e Rondônia, respectivamente.

Dois candidatos —Tarcísio de Freitas (Republicanos), em São Paulo, e Capitão Wagner (União Brasil), no Ceará— entram na última semana de campanha com chances reais de irem ao segundo turno. Outros dez candidatos são nanicos, com até 3% das intenções de voto.

Quase todos os candidatos são de direita e concorrem por partidos associados a Bolsonaro. Apenas dois são de esquerda: o policial civil Kleber Rosa (PSOL), na Bahia, e o capitão da PM Vinicius Sousa (PSTU), no Espírito Santo.

Para o levantamento, o UOL considerou os candidatos a governador que usam a patente no nome de urna, declararam a atividade policial ou militar como suas profissões no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ou são notoriamente associados a uma das forças —caso de Tarcísio de Freitas.

Descolando de Bolsonaro. O deputado federal Capitão Wagner (União Brasil) liderou toda a corrida pelo governo do Ceará, mas viu o candidato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Elmano de Freitas (PT), crescer 8 pontos nas pesquisas em apenas duas semanas e ultrapassá-lo numericamente —o petista agora tem 30% e Wagner 29%, de acordo com o último levantamento do Ipec, do dia 22.

Derrotado duas vezes em disputas pela Prefeitura de Fortaleza, Capitão Wagner fez nesta campanha uma guinada ao centro e tenta se descolar de Bolsonaro como forma de se viabilizar na disputa pelo governo do Ceará.

Catapultado para a política após ser uma das principais lideranças do motim de PMs no estado, em 2011, Wagner renegou esse passado e tem evitado nacionalizar a disputa cearense —no estado, Lula tem 63% das intenções de voto, contra 18% do presidente e 10% de Ciro Gomes (PDT).

Em sabatina na TV Verdes Mares, afiliada da TV Globo no Ceará, Wagner evitou declarar apoio a Bolsonaro quando questionado sobre o tema. "Conseguimos sete partidos e temos o maior tempo de TV, a maior estrutura. E, dentre esses sete partidos, temos cinco candidatos a presidente. Então a gente construiu um arco de alianças amplo com foco no Ceará", desconversou.

Nanicos no Nordeste. Segundo mostra o levantamento do UOL, oito dos 18 candidatos concorrem em estados nordestinos —quase metade do total. Na região, que se tornou um bunker do eleitorado petista desde 2006, boa parte deles mal consegue pontuar nas pesquisas. Vários deles evitam a associação com Bolsonaro.

Uma das exceções é o Coronel Diego Melo (PL), candidato ao governo do Piauí, que aparece com 3% das intenções de voto. No estado, Lula lidera com 61%, contra 20% de Bolsonaro, de acordo com o último levantamento Ipec, do dia 12 deste mês.

Oriundo da PM, o Coronel Diego Melo tenta trazer os bolsonaristas para o seu lado. Se equiparasse suas intenções de voto às do presidente no estado, ele teria chances de ir para o segundo turno.

O povo daqui sabe quem acompanha o presidente desde 2016. Sou um apoiador dele desde o primeiro momento, não sou um aventureiro. O que nos une são valores e propostas, não são pessoas e pragmatismo."
Coronel Diego Melo (PL), candidato ao governo do Piauí

O Piauí vive uma situação sui generis: embora o PL tenha candidato próprio, o apoio do presidente formalmente vai para Silvio Mendes (União Brasil), candidato lançado pelo senador Ciro Nogueira (PP-PI), ministro da Casa Civil e homem forte do governo.

Coronel Diego Melo, candidato do PL no estado, utiliza a imagem de Bolsonaro com frequência, mas até o momento não conseguiu reverter isso em intenções de voto. Seguindo a cartilha do bolsonarismo radical, ele ataca os institutos de pesquisa para justificar o resultado.

No Nordeste, seis dos oito candidatos não conseguem atingir a marca dos dois dígitos.

Em pesquisa do instituto Real Time Big Data do dia 20 deste mês, o senador Capitão Styvenson (Podemos), oriundo da PM, tem 20% das intenções de voto e poucas chances de evitar uma vitória em primeiro turno da governadora Fátima Bezerra (PT) no Rio Grande do Norte.

Já no lançamento de sua candidatura, em agosto, deixou claro o distanciamento de Bolsonaro: "Não peço voto nem para mim, não vou pedir para ninguém, não", disparou ao ser perguntado sobre um apoio ao presidente.

Líder do governo fica para trás. Mesmo em Goiás, reduto bolsonarista, um policial fortemente ligado ao presidente enfrenta dificuldades. Líder do governo na Câmara dos Deputados em boa parte da legislatura, Major Vitor Hugo (PL) marcou apenas 6% na última pesquisa Ipec, do dia 22.

Ele fica em terceiro, atrás do governador Ronaldo Caiado (União Brasil), que tem 55%, e de Gustavo Mendanha (Patriota), com 23%.

Vitor Hugo se elegeu pelo PSL em 2018 com o apoio de Bolsonaro e, ao longo do mandato, foi um dos parlamentares mais próximos do presidente. Ele era considerado uma das apostas do Palácio do Planalto nestas eleições.

Em julho, Bolsonaro realizou uma motociata para auxiliar o lançamento da candidatura do aliado. No estado, o presidente lidera com 44% e Lula tem 35%.

Outro nome prioritário de Bolsonaro, Tarcísio de Freitas vem explorando sua passagem como ministro da Infraestrutura como principal mote de campanha, deixando de lado o fato de ser oficial da reserva do Exército.

Pulverização de candidaturas. De acordo com levantamento do FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), 2022 representa um recorde de candidaturas: neste pleito são 1.888 candidatos que declararam ser policiais, bombeiros ou militares das Forças Armadas ao TSE —28,5% a mais do que os 1.469 casos registrados em 2018.

O levantamento —que reúne candidaturas a todos os cargos em disputa nessa eleição— considera profissionais na ativa, aposentados, reformados ou da reserva.

Líder da chamada bancada da bala no Congresso, o deputado federal Capitão Augusto (PL-SP), representante histórico dos PMs na política, tem criticado o que considera um excesso de candidaturas de policiais e militares. Segundo ele, isso pode reduzir a representação das candidaturas na política.

"Prejudica demais, por causa da divisão de votos. Quem sai apostando somente no voto institucional da Polícia Militar dificilmente vai conseguir se eleger", disse ele à Veja em setembro. À Folha de S.Paulo, ele já havia dito que o número de candidaturas é "absurdo e exagerado".

Para o sociólogo Renato Sérgio de Lima, presidente do FBSP, a cooptação de parte significativa dos policiais e militares pelo bolsonarismo tem relação com o possível fracasso de candidaturas majoritárias dessas categorias.

"Os radicais não são maioria no eleitorado. Esses candidatos sabem que precisam fazer um discurso que amplie a pauta. Não podem só falar de ordem e combate à corrupção. Tem que falar de fome, saúde, educação. E aí candidatos que são nichados, como os policiais, perdem força", diz ele.

Lima pontua ainda que um dos efeitos colaterais do avanço do bolsonarismo nas polícias é dificultar o caminho para o surgimento de lideranças orgânicas nas categorias que não sigam estritamente a cartilha desse grupo político.

Ele afirma, com base nos dados levantados pelo FBSP, que nesta eleição os candidatos das forças de segurança devem ter mais espaço nas assembleias legislativas dos estados, onde podem dar sequência a uma pauta sindical.

"Estão tentando uma carreira política mais tradicional. Quem pode resolver problema de jornada de trabalho, salário, escala de trabalho e toda essa pauta sindical é o deputado estadual. E é essa pauta que tem o voto", diz ele.