Brasil tem mais de 11 denúncias de assédio eleitoral por dia desde agosto

O Brasil registrou mais de 11 denúncias de assédio eleitoral por dia desde o início das campanhas municipais, em 16 de agosto. Os dados são do Ministério Público do Trabalho, que recebeu até a tarde desta quinta-feira (24) um total de 831 denúncias do tipo em todo o país.

O que aconteceu

Órgão atualiza em tempo real as denúncias de assédio eleitoral. Desde o início da campanha, em 16 de agosto, o MPT também já realizou 42 TACs (Termos de Ajustamento de Conduta) e moveu 28 ações na Justiça do Trabalho para combater esse crime.

Até a véspera do primeiro turno, foram 590 denúncias. Mais 240 só na campanha pelo segundo turno, que acontece em apenas 51 cidades.

SP campeão. Até a tarde desta quinta, o estado líder em denúncias era São Paulo, com 107, seguido por Bahia, com 98, e Ceará, com 51. Já o estado com menos registros foi Roraima, com duas denúncias, seguido por Amapá, com cinco.

Números são menores que 2022, mas ainda chamam atenção. Naquele ano, o país passou pela eleição presidencial mais acirrada de sua história e foram registrados mais de 3.600 casos de assédio eleitoral até o fim do ano. Como os casos de assédio eleitoral começaram a ser contabilizado de forma separada apenas em 2022, não é possível comparar os dados com as eleições de 2020. Antes, eles se somavam às denúncias de assédio moral.

Crime praticado em ambiente de trabalho. O assédio eleitoral ocorre quando um superior hierárquico tenta influenciar de alguma forma na votação ou mesmo na manifestação política de seus subordinados, o que pode ocorrer tanto no setor público quanto no privado.

Ministério Público do Trabalho tem feito acordos com órgãos públicos e privados. Além de entrar com ações, órgão tem realizados os chamados TACs, por meio do qual os empregadores, sejam eles públicos ou privados, se comprometem a cessar a prática sob pena de serem multados.

Os números atestam duas evidências: a primeira é que a sociedade brasileira reconheceu o trabalho do MPT, tanto em 2022 como agora, e confiou no órgão para ser o responsável por coibir e impedir práticas de assédio eleitoral, que remontam o voto de cabresto. A segunda é que, apesar do incansável trabalho de toda a instituição, ainda há muito o que ser feito para que estejamos livres das amarras do passado e possamos celebrar um processo eleitoral em que todas e todos escolham seus representantes sem nenhum tipo de interferência externa ou pressão.
José de Lima Ramos Pereira, procurador-geral do Trabalho

'Para garantir o emprego'

MPT acionou Justiça do Trabalho contra secretário de Sobral (CE) que cobrou voto em candidata da família Gomes. O secretário municipal de Transportes da Cidade, Kaio Dutra, foi gravado em reunião com servidores públicos na véspera do primeiro turno. Na ocasião, ele falou abertamente que, para garantirem o emprego, eles deveriam votam na "prefeita". A única candidata mulher na eleição deste ano era Izolda Cela, ex-secretária-executiva do MEC no governo Lula e apoiada pelo PT e pelos irmãos Gomes.

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Izolda acabou derrotada na eleição. O vencedor foi o deputado estadual Oscar Rodrigues (União Brasil). Com o resultado, é a primeira vez desde 1992 que um opositor da família Gomes consegue se eleger prefeito do município.

Justiça do Trabalho determinou que a prefeitura cessasse qualquer prática de assédio eleitoral sob pena de multa de R$ 500 mil. A ação do MPT foi proposta em 4 de outubro, e a decisão da Justiça do Trabalho saiu no mesmo dia.

Ah, é porque eu tenho meu emprego garantido, porque meu vereador vai garantir meu emprego. Não é assim! Não é assim! Para garantir o emprego a prefeita tem que ganhar.
Trecho da fala do secretário de Transportes de Sobral, Kaio Dutra, durante reunião com servidores

O tom da fala do secretário, ao coagir os presentes na reunião realizada no dia 1º/10/2024 a votar em um(a) determinado(a) candidato(a), inclusive sob ameaça de perda do empregado, configura uma conduta flagrantemente ilícita e incompatível com a função de servidor público, que deve se submeter aos princípios insertos no art. 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, dentre os quais a legalidade, impessoalidade, moralidade e probidade administrativa.
Decisão da juíza da 1ª Vara do Trabalho de Sobral, Theanna de Alencar Borges

Edição de vídeos

Funcionários de empresa de ônibus obrigados a editar vídeos contra candidato em Planaltina (GO). Outro caso em que o MPT atuou envolveu funcionários da Viação Amazônia, uma empresa de ônibus local. O órgão recebeu relatos de funcionário que foi demitido por se recusar a fazer trabalhos de edição de áudio e vídeo contra candidatos que não eram apoiados pelos donos da empresa.

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Segundo as investigações do MPT, o objetivo era atacar os concorrentes do candidato Professor Zenilton (PSDB). Ele ficou em segundo lugar na disputa pela prefeitura neste ano. O órgão acionou a Justiça do Trabalho, que determinou a interrupção imediata da prática sob pena de multa de R$ 50 mil. A empresa chegou a ser intimada a se manifestar pelo juiz antes da decisão, mas não deu resposta. A ação foi apresentada pelo MPT em 3 de outubro e a Justiça do Trabalho decidiu no dia seguinte.

No caso em exame, existem fortes indícios de que os trabalhadores da demandada são obrigados a editar textos e áudios, fazer sua edição, colocando música de fundo, com o que não concordavam, configurando, em análise apriorística, a conduta da reclamada como assédio eleitoral (prática de coação, ameaça ou constrangimento) sobre os trabalhadores de forma a violar a liberdade política e o livre exercício da cidadania.
Decisão do juiz da Vara de Trabalho de Formosa, Wanderley Rodrigues da Silva

Voto no sogro

Em Teresina, MPT denunciou casos envolvendo servidores da saúde que eram pressionados a votar em candidatos indicados pelos chefes. Investigação identificou que funcionários de diferentes setores, incluindo UBSs (Unidades Básicas de Saúde), eram coagidos a votar nos candidatos indicados por seus superiores. Uma servidora até foi afastada da função por apoiar candidato diferente do que mandava o coordenador da UBS. Em outro caso, uma servidora era pressionada a votar no sogro da diretora de uma unidade.

Ministério Público do Trabalho entrou com ação em setembro e, no dia 25 daquele mês, a Justiça do Trabalho determinou que a Fundação Municipal de Saúde fizesse cessar as práticas. Em caso de descumprimento, o município estaria sujeito a multa de R$ 10 mil, mais R$ 5.000 por servidor assediado.

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