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2010: Muita informação

The New York Times

31/12/2010 07h02

Escritores, empreendedores, acadêmicos e artistas refletem sobre a revolução da comunicação: o que a tecnologia faz por nós e para nós, o que podemos fazer com ela.

Richard Branson – Empreendedor britânico, fundador do Virgin Group
A tecnologia moderna realmente revolucionou a forma como operamos negócios no dia a dia, e melhorou radicalmente a forma como vemos conteúdo, informação e entretenimento na nossa vida pessoal.
De uma perspectiva pessoal, adoro a liberdade e o movimento gerado pelo trabalho remoto com o meu Blackberry. Acho libertador que esse aparelho me permita fazer negócios de qualquer lugar do mundo apenas clicando um botão – especialmente útil levando em consideração o grande período em que passo viajando. Usar meu Blackberry me permite permanecer em contato constante com minhas equipes de gerência, manter-me informado em relação às notícias do mundo e falar com minha família – tudo a partir de um dispositivo. É fantástico!
Quanto a desligar, sou muito bom em reservar um tempo para recarregar minhas baterias em Necker Island: nadar, praticar kite-surf ou jogar tênis me dá a pausa de que necessito. Não sou bom em manter meus dispositivos carregados – então tenho de admitir algumas pausas forçadas numa semana agitada para recarregar.

Recep Tayyip Erdogan – Primeiro-ministro da Turquia
As melhorias na tecnologia da informação sem dúvida nenhuma transformaram a natureza da política. Os políticos hoje possuem uma verdadeira cornucópia de novas plataformas para alcançar seu público-alvo: celulares, internet, redes sociais e todos os seus derivados e permutações. No entanto, pode-se dizer que a disseminação da tecnologia leva à desvalorização das interações humanas.
Consequentemente, damos grande importância a interações face a face e pessoais. Formas de comunicação tradicionais, que algumas pessoas podem ridicularizar, chamando-as de "antigas", sempre desempenharão um papel central na política. Eu, pessoalmente, tento extrair o máximo benefício das novas ferramentas de comunicação com a ajuda dos meus colegas. Mas não nos esquecemos que nossos valores tradicionais de cordialidade e humanismo só podem ser preservados se não negligenciarmos as interações face a face, mesmo quando sacamos proveito das novas opções tecnológicas. Quando viajo dentro do país ou para o exterior, revejo meus velhos colegas a quem escrevi cartas e observo o brilho em seus olhos, lembro-me constantemente que a tecnologia não pode ser um substituto para a cordialidade que esta interação humana produz.

Pico Iyer – Escritor e autor de "The Open Road: The Global Journey of the Fourteenth Dalai Lama"
Há hoje mais celulares no mundo do que pessoas (quase dez vezes mais aparelhos do que há uma década). Uma adolescente californiana enviou 300 mil mensagens de texto em um único mês – o que corresponde a quase dez mensagens enviadas em cada minuto em que esteve acordada, supondo-se que ela estivesse acordada (pelo menos oficialmente) durante 16 horas por dia. Até mesmo a Intel, empresa de alta tecnologia, experimentou o "Tempo de silêncio", em que, por quatro horas consecutivas todas as semanas, nenhum e-mail ou ligação telefônica seria permitido. A empresa também tentou os "dias sem e-mail" e disse aos funcionários que eles têm 24 horas – não minutos – para responder as mensagens internas.
Nossas preocupações com o que a tecnologia está causando em nossas mentes começaram a alcançar uma massa crítica: todos os dias, ao que parece, novas aflições – apneia de e-mail, transtorno de vício em internet, nomofobia (medo de estar fora do contato telefônico) – são reportados. Proliferam livros sobre o silêncio, a atenção, a sobrecarga digital. De acordo com uma pesquisa confiável, 28% de cada dia de trabalho é perdido devido ao excesso de informação. Mais profundo que isso é o sentimento de que toda a informação do mundo não é capaz de nos ensinar como racionalizar a informação. Temos mais e mais formas de nos comunicar, ao que parece, e menos e menos coisas a dizer.
Ninguém nega que a tecnologia expandiu infinitamente nossas possibilidades. Mas cada vez mais pessoas estão se questionando por que todas essas ferramentas de conexão estão nos deixando tão esgotados, desconectados e sozinhos. Somente saindo um pouco de nossas máquinas podemos começar a ver como usá-las de uma forma melhor. A tecnologia nos deu o mundo; cabe a nós agora ver o que podemos trazer e traremos à tecnologia.

Sylvie Kaufmann – Diretora executive do "Le Monde"
Anotar mais eventos, reuniões, prazos e listas de coisas a fazer no meu iPhone não necessariamente me torna mais eficiente; isso só me faz sentir mais culpada quando ignoro algum desses itens. Não tem desculpa! (Sinto muito, meu iPad comeu meu dever de casa).
Bem, chegamos ao fim de 2010 e a maioria de nós da comunidade global está conectada a todo tipo de dispositivos empolgantes. Estamos amarrados, eles são divertidos, são incrivelmente úteis, não podemos viver mais sem eles. Eles são maravilhosos manter pessoas isoladas conectadas. Se eles tornam nossa vida mais fácil? Claro que não. Eles levaram a arte de realizar várias tarefas ao mesmo tempo a outro nível, mas não nos ajudam se não somos realmente organizados. Eles limitam nosso escopo de atenção no trabalho. Eles violam nossa privacidade no sentido de que aceitamos ter momentos de intimidade, conversas importantes ou jantares familiares interrompidos por celulares, SMS e e-mails – ou mesmo tweets.
Gerenciar todos esses canais de comunicação o dia todo pode se tornar nosso pior desafio, já que isso consome cada vez mais tempo, em vez de economizá-lo. Criticamos nossos adolescentes por passarem tanto tempo no Facebook, mas somos igualmente viciados em nossas próprias redes. Um amigo meu tinha uma "semana sem tela" – sem TV ou computador – para toda a família de vez em quando, pelo bem da sanidade mental de todos. As crianças e os pais liam, conversavam mais à mesa de jantar, ouviam música, iam ao cinema ou faziam o dever de casa. Isso seria pouco realista hoje. Mas talvez tenha chegado a hora de inventar outra coisa. Como "noites sem Facebook ou e-mail".

Bernard-Henri Levy – filósofo e jornalista francês
Hoje posso responder a várias mensagens que antes eu jamais responderia (porque sou um pouco rude) graças ao meu pequeno Blackberry e táxis que ficam presos no trânsito. Quando meu avião tem o azar de pousar no aeroporto JFK cinco minutos depois de um Boeing jumbo, e eu tenho de esperar uma hora antes de passar pela alfândega, agora posso ler o "Huffington Post" ou o "International Herald Tribune" online – evitando os olhos de autoridades que exigem que os celulares sejam desligados (embora jamais tenha entendido o motivo desse pedido).
E tem também a "máquina de guerra", minha capacidade de usar a internet para levar ao mundo minhas ideias e as de meus colegas, e gerar interesse em diversas causas – um esforço em que conto com a ajuda do meu colega Jean-Baptiste Descroix-Vernier. Minha resenha literária e filosófica, La Regle du Jeu, por exemplo, está no processo de se tornar uma revista online de ideias na França. Foi ali onde a batalha por Roman Polanski foi travada e vencida; onde Farouk Hosni, o egípcio queimador de livros, foi metodicamente derrotado em sua candidatura para o posto de diretor-geral da Unesco; onde liderei a luta para poupar a vida de Sakineh Ashtiani Mohammadi, a mulher iraniana que foi condenada por adultério e sentenciada à morte por apedrejamento.
No meu país, muitas vezes sou creditado por ter entendido muito cedo – há 30 anos – o "bom uso" da mídia. Talvez. Mas o que mais me orgulha é ter entendido, antes de muitos outros, a maravilhosa utilidade da internet para um intelectual como eu, sua eficácia na batalha de ideias, seu uso na conservação e permanente perpetuação dos pensamentos. A internet, lata da lixo do mundo? O reino do instante e do efêmero? Não, ao contrário, é o mármore para tudo o que está escrito, a maior conservadora, portanto amiga, da reflexão.
Então pode que devemos temer esta nova força? Será que às vezes eu desejo poder desligar tudo isso? Não! Ela é minha aliada, esta nova força. E eu viveria sem ela hoje, mas com grande dificuldade e pesar.

Evgeny Morozov – Intelectual e autor de "The Net Delusion: The Dark Side of Internet Freedom"
Como uma pessoa que escolheu passar o último verão morando numa floresta no meio da Bielorrússia, eu me encaixaria no perfil de rabugento que odeia tecnologia. Mas não interprete assim minha rebeldia: eu não quis fugir da "sociedade da informação", mas desfrutar sua principal commodity – a informação – sem a perturbação de e-mails e tweets.
Algum tipo de exercício emergencial de recuperação da atenção era necessário fazia tempo. Manter-me afastado de qualquer aparelho conectado à internet parecia a única opção. Isso acabou sendo fácil na minha terra-natal, Bielorrússia. A rede wi-fi é escassa e instalar um acesso à internet na minha dacha seria extremamente caro e pouco prático. Quando decidi passar o verão na floresta, eu na verdade me cerquei de tecnologia. Queria rejeitar a conectividade – mas não tinha intenção de rejeitar a produtividade. Então nunca "despluguei" completamente. Embora não tivesse conexão à internet, tinha meu Kindle, meu laptop, meu disco rígido cheio de textos para ler e filmes para assistir – e uma TV de plasma obscenamente grande para tudo isso.
Só me conectava durante uma hora, mais ou menos, em minhas viagens semanais à cidade. Era quando eu baixava todas as minhas assinaturas do Kindle – meia dúzia de jornais diários, uma dúzia de revistas semanais e mensais e um punhado de blogs. Eu lia a maioria das matérias com uma semana de atraso e não tinha a riqueza dos comentários instantaneamente disponíveis no Twitter – mas, pela primeira vez em muitos anos, me sentia no controle da minha dieta de informações. A ironia é que, se não fosse pela tecnologia, eu jamais teria ousado tirar um verão de folga e morar numa floresta na Bielorrússia! Graças à tecnologia, eu já não enfrentava mais a dura escolha entre morar num completo apagão de informação por três meses – algo a que eu não seria capaz de sobreviver – ou conectar meu esconderijo na floresta, privando-me da capacidade de me concentrar que me assombrava na cidade. Assim, pelo menos num aspecto bastante limitado, acho que, se a tecnologia for um problema, ela também é a solução.

Rene Redzepi, Chef, Noma (Copenhague)
Em nosso restaurante, vemos os clientes trazendo uma quantidade cada vez maior de câmeras, filmadoras etc para suas refeições. É natural que nossos clientes queiram registrar uma noite especial. O que geralmente acontece é que as gravações vão parar na internet, muito provavelmente num blog ou comunidade da web, para que os outros possam compartilhar a experiência. Não podemos discutir. Por outro lado, a qualidade única do restaurante se torna tão amplamente divulgada que um novo cliente pode saber exatamente o que esperar antes de entrar no restaurante. De certa forma é uma vergonha, mas em outro aspecto isso nos obriga a repensar e renovar nossas práticas constantemente.
Eu, pessoalmente, adoro a tecnologia que vem com os novos tipos de celulares. Eu os uso bastante em nosso trabalho no restaurante. Posso enviar mensagens curtas aos outros gerentes. O mais importante: todos nós usamos celulares como mapas virtuais de produção. Quando estamos na natureza e encontramos um novo local onde um ingrediente de alta qualidade cresce em abundância, a tecnologia me permite compartilhar esse local específico com outros membros da equipe. Apontar a área exata num mapa, espalhar a informação pelo cyber-espaço e explicar o que encontrar em mensagens curtas e fotos é, ao mesmo tempo, maravilhoso e útil. Antes disso, era quase impossível dar a direção certa.
Esta prática resulta em mais diversidade nos ingredientes da cozinha; ela motiva o compartilhamento do conhecimento e, portanto, aumenta a inovação para benefício dos nossos clientes. Como temos mais produtos para usar na cozinha, damos um passo natural e nos afastamos dos itens mais comumente usados em todo o mundo ocidental em supermercados e restaurantes. A nova tecnologia nos permite fazer um pacto melhor com a natureza.

Donald J. Trump – Empreendedor
Acho que o que acontece hoje com a tecnologia é empolgante, e eu gosto de acompanhar os novos dispositivos. É claro que uso celular e internet, e gosto especialmente de todas as novas atualizações e o acesso mais rápido à informação que hoje está tão disponível. Também uso o Twitter e o Facebook. Toda essa nova tecnologia é eficiente, eficaz e divertida, mas uma coisa que não quero é ficar tão distraído que não consigo erguer os olhos – algo que vemos cada vez mais hoje em dia.