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Estação onde ocorreu acidente na Argentina tem obras atrasadas e trens da década de 50

Do UOL, em São Paulo

23/02/2012 14h58

O acidente com um trem na estação Once, no centro de Buenos Aires, na quarta-feira, que deixou 50 mortos e mais de 700 feridos, trouxe á tona uma série de questões envolvendo a administração do transporte ferroviário no país.

Os baixos investimentos em transporte público na capital Argentina podem estar por trás da tragédia, segundo declarações de especialistas e sindicalistas ferroviáios no país ouvidos pela BBC. Já para os principais jornais do país, o acidente era uma tragédia anunciada.

O jornal Clarín questionou a falta de investimentos na infraestrutura e segurança da linha férrea de Sarmiento. "Embora oficialmente pese um investimento milionário e não comprovado desde 2003, a realidade mostra que a linha Sarmiento ostenta um atraso tecnológico e uma extensa lista de promessas e obras não cumpridas", diz o diário.

Quem administra a linha é a empresa privada TBA (Trens de Buenos Aires). Atualmente, a estação possui vias construídas na década da de 50, com trens usados há mais de 50 anos e com sistemas de segurança obsoletos. Dentre as obras previstas para a linha, a mais atrasada é da estação Sarmiento.

A licitação para as obras foi anunciada em 2006 e fechada em 2008. De lá para cá, o início de obras entre as estações Caballito e Ciudadela tiveram várias datas para começar. A última data foi marcada para este mês.

A reforma no tamanho de 25 vagões para aumentar a capacidade de passageiros também está atrasada. Previso para ser entregue em cinco anos, desde 2006, apenas quatro vagões foram entregues, e não há previsão de finalização dos outos 21.

Em sua coluna no jornal espanhol El País, o jornalista e escritor argentino Martín Caparrós disse que o acidente já "era esperado" e é resultado de uma "sucessão de causas perdidas". Ele relembra o tempo em que a ferrovia estatal do país tinha 40.000 quilômetros e empregava 190.000 trabalhadores. Hoje, a malha ferroviária é de 7.000 quilômetros e emprega pouco menos de 20 mil pessoas.

Em declaração ao jornal Página 12, o titular da Auditoria Geral da Nação, AGN, Leandro Despouy, disse que o acidente foi "consequência direta do descumprimento de normas básicas" e já seria um motivo para o governo encerrar seu contrato com a TBA. Segundo Despouy, em um relatório de 2008 a AGN já havia classificado a situação do serviço ferroviário como "desastrosa" e que as mudanças feitas até então não eram suficientes para "evitar acidentes".

"TBA já protagonizou vários incidentes e, em alguns casos, acidentes graves, como o que ocorreu em Flores", disse Despouy, em referência ao acidente em setembro de 2011, quando um ônibus e dois trens colidiram no bairro de Flores, deixando 11 mortos e 212 feridos.

Os passageiros de trem na região metropolitana da capital argentina fazem queixas frequentes sobre as condições que enfrentam durante as viagens. Devido à superlotação, algumas pessoas ficam penduradas do lado de fora dos vagões e chegam a viajar em cima dos trens. Além disso, a falta de ventilação também é outra reclamação frequente.

O acidente ocorreu no momento em que é discutida a redução ou eliminação dos subsídios do governo federal aos transportes públicos e outros setores da economia. Um estudo realizado pelos especialistas em infraestrutura Lucio Castro e Paula Szenkman, do Centro de Implementação de Políticas Públicas para Equidade e Crescimento Econômico (CIPPEC), de Buenos Aires, indicou que as empresas de transporte público são hoje dependentes destes recursos do Estado, mas que, mesmo com este dinheiro, não houve melhoria nos serviços.

"A partir de 2003 (quando surgiram os subsídios), aumentou a quantidade de passageiros e caiu a oferta de assentos no sistema de transporte público. Desde então, dentro do sistema de transporte público, o setor que menos investimentos recebeu foi o ferroviário e o que mais recebeu foi o das estradas", afirmou Castro. 

Em seu site oficial, a TBA publicou um comunicado dizendo que está acompanhando as investigações e está à disposição da Justiça Federal para colaborar com o caso. A empresa também disse que não fará mais declarações sobre a tragédia até que tenha informações precisas da causa do acidente. O acidente é o mais grave desde os anos 70 e o terceiro pior da história argentina. (Com BBC)

Vídeo mostra o momento do acidente com trem na Argentina