Por que Trump pode ter falado demais e ter colocado até os EUA em risco?
As informações secretas que Donald Trump compartilhou com o governo russo, conforme relato do jornal "The Washington Post", podem colocar em perigo o trabalho dos Estados Unidos com aliados na luta contra o terrorismo e até mesmo a vida de agentes que possam ter intermediado essa informação para os norte-americanos, segundo especialistas em inteligência e segurança ouvidos pela imprensa americana.
Segundo o "Washington Post", Trump revelou informação altamente confidencial para o chanceler russo Sergei Lavrov e para o embaixador da Rússia nos Estados Unidos durante uma reunião na Casa Branca na semana passada. A informação diz respeito a uma suposta ameaça do grupo Estado Islâmico relacionada a segurança aérea e foi comunicada por um aliado dos Estados Unidos que não havia dado autorização a Washington para compartilhá-la com Moscou, segundo reportagem do jornal, citando fontes do governo Trump.
Trump se defendeu alegando ter o "direito absoluto" de repassar informações para a Rússia sobre "fatos relacionados a terrorismo e segurança aeronáutica" dizendo que gostaria que o governo de Vladimir Putin "aumentasse de forma importante sua participação na luta contra o EI e o terrorismo". A Rússia chamou a história do "Washington Post" de "falsa".
Especialistas concordam que não há legislação que impeça Trump de compartilhar o conteúdo. A decisão, no entanto, faz com que o presidente perca controle sobre a informação, segundo o ex-agente da CIA Bob Baer, em entrevista à CNN. "Revelando para a Rússia, essa informação vai para os sírios, para os iranianos, que são aliados russos", disse Baer, em referência a dois adversários dos EUA na guerra síria.
Já Stephen Tankel, que trabalhou como conselheiro do Departamento de Defesa norte-americano em 2014, diz que a inteligência russa tem elementos para decifrar a origem da informação, apesar de a Casa Branca alegar que "os métodos [praticados] e as fontes" da informação não foram discutidos na conversa --segundo o general H.R. McMaster, conselheiro de Segurança Nacional do governo Trump, que estava na reunião com os russos, nem o presidente americano conhecia a origem dessa informação.
"Revelando a cidade onde a informação foi coletada, Moscou pode determinar o aliado que a forneceu", escreve Tankel em um artigo no "Washington Post".
"Um agente pode ser morto"
Segundo ele, o primeiro impacto seria prejudicar o trabalho de inteligência contra o Estado Islâmico. Mas, depois disso, o dano poderia se multiplicar. "Revelar essa informação à Rússia não era uma decisão dos EUA. Segundo as regras da inteligência, os Estados Unidos precisariam da permissão do país que o coletou", alega Tankel.
Isso aumentará a desconfiança de aliados norte-americanos com Trump, segundo Tankel e outros analistas. "É um ato que prejudica toda uma gama de relações. Agora, todo mundo --inclusive nossos aliados mais próximos, como o Reino Unido-- serão aconselhados a ter cuidado com o que compartilham com a gente", afirma Eliot Cohen, ex-conselheiro do Departamento de Estado entre 2007 e 2009, durante os governos de George W. Bush e Barack Obama.
"Isto é assustador. Se acidental, poderia ser motivo de demissão para qualquer um. Se deliberado, poderia ser traição", escreveu Cohen no Twitter.
Existe outra preocupação: a segurança dos agentes, norte-americanos ou não, envolvidos na coleta desse dado. "Se alguém descobre como você reuniu informações, essa sua 'escuta' cuidadosamente plantada pode ser morta. Ou um agente pode ser morto", diz Cohen.
"Existem linhas vermelhas que nem o presidente pode atravessar. Ele tem que proteger seus bens. [A atitude de Trump] É muito assustadora para nosso povo, especialmente para as pessoas que conseguiram estabelecer a relação [com quem recebeu a informação]", afirmou Wayne White, ex-agente de inteligência no Departamento de Estado durante o governo Bush, ao site "Politico". "Se for verdade, é mais uma indicação que não dá para controlar esse cara."
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