Trump elogiou Bolsonaro? No contexto do discurso, talvez não seja bem assim
Nesta semana, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, citou o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (PSL) durante um evento do lobby do agronegócio americano. "Dizem que ele é o Donald Trump da América do Sul. Acreditam? E ele está feliz com isso! Se ele não estivesse, eu não gostaria tanto daquele país, mas eu gosto", declarou o presidente em discurso na última segunda-feira (14), na convenção da AFBF (American Farm Bureau Federation), a maior organização agropecuária dos EUA.
Quando analisada separadamente, a frase soa elogiosa, já que o brasileiro compartilha de uma série de afinidades com o americano. Mas, quando é levado em conta o trecho inteiro da fala de Trump, o tom não parece tão simpático, e soa quase como um deboche por ele ter conseguido abrir o mercado brasileiro para a carne americana.
"Estamos transformando, por todo o mundo, acordos de comércio em algo mais justo que coloca os agricultores americanos, fazendeiros e, de fato, os EUA em primeiro lugar. É isso que me interessa: a América em primeiro lugar. Acabamos de abrir a Argentina para as exportações americanas de carne suína --carne de porco-- pela primeira vez em um quarto de século. Eles precisavam de algo; eu disse: 'Você tem que abrir para a carne de porco'. E eles disseram: 'Tudo bem'. Eu disse: 'Por que vocês não fizeram isso antes?' Eles disseram: 'Ninguém nunca nos pediu'."
"Vocês ficariam surpresos. Ninguém nunca os pergunta. Índia e Marrocos abriram seus mercados para nossas exportações de aves. Nós fazemos muito por eles. É incrível. O Japão abriu seu mercado para as exportações americanas de batatas de Idaho. E de cordeiro do grande estado do Texas. Eles apenas se abriram. Nós pedimos a eles. Nós dissemos: 'Você tem que se abrir. Desculpa.'"
E depois de se gabar de ter aberto os mercados de Argentina, Índia, Marrocos e Japão apenas com um simples pedido, Trump cita o Brasil:
"A carne bovina dos EUA foi vendida ao Brasil pela primeira vez desde 2003. E eles terão um ótimo novo líder. Dizem que ele é o Donald Trump da América do Sul. Vocês acreditam nisso?", diz Trump em tom de brincadeira. Ele interrompe seu discurso e é bastante aplaudido em meio a risadas. "Mas eu gosto dele. E ele está feliz com isso. Se ele não estivesse, eu não gostaria muito do país."
Trump segue e, dessa vez, o alvo é China, país que frequentemente é atacado pelo americano em meio a uma guerra comercial. "E abrimos a China para a carne bovina americana pela primeira vez em muitos e muitos anos. Nós tomamos [esse mercado, e é aplaudido]. Vocês sabem disso. Mas isso foi antes do acordo comercial. Não se preocupem com isso. Isso é - isso não é nada comparado ao que estamos falando. Tomamos as medidas mais duras para confrontar as práticas comerciais desleais da China, que prejudicam fazendeiros e pecuaristas americanos".
Bolsonaro é fã declarado do presidente americano e chegou a afirmar que estaria pronto para uma instalação de uma base dos Estados Unidos em território brasileiro. Mais tarde, diante da repercussão negativa entre os militares brasileiros, voltou atrás.
Em si, a aproximação com os EUA não é exatamente uma novidade na política externa brasileira. O Brasil faz parte da esfera de influência dos Estados Unidos e, ao longo do tempo, a relação teve momentos de maior ou menor intensidade. As gestões Vargas (1951-1954), Jânio Quadros (1961) e Lula (2003-2010) ficaram conhecidas por tentativas de independência. Os momentos de maior tensão ocorreram em 1977, quando Geisel (1974-1979) rompeu um acordo militar de 25 anos com Washington, e 1987, quando o Brasil governado por José Sarney (1985-1990) foi alvo de sanções por conta da Política Nacional de Informática. Por sua vez, os governos de Dutra (1946-1951) e Castelo Branco (1964-1967) se notabilizaram por grande proximidade com Washington. (Com DW)
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