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Guerra da Rússia-Ucrânia

Notícias do conflito entre Rússia e Ucrânia


'Putin só vai negociar um cessar-fogo se tomar Kiev', diz especialista

Herculano Barreto Filho

Do UOL, em São Paulo

03/03/2022 04h00

Tanguy Baghdadi, professor de relações internacionais da UVA (Universidade Veiga de Almeida), no Rio de Janeiro, vê um impasse nas negociações por paz no confronto após a invasão da Ucrânia pelas forças armadas da Rússia.

"[O presidente russo, Vladimir] Putin só vai negociar um cessar-fogo se tomar a capital Kiev", afirma. Uma delegação russa partiu ontem (2) para uma nova rodada de negociações por cessar-fogo entre os altos escalões dos dois países.

O especialista, que analisa os desdobramentos do conflito no podcast Petit Journal, vê dois cenários paralelos. Por um lado, entende que Putin concentra esforços na tomada imediata da capital Kiev.

Satélites capturaram imagens de um comboio de 65 km de veículos militares russos se aproximando da cidade com blindados, tanques e artilharia rebocada. Ontem, uma forte explosão foi ouvida perto da estação rodoviária central da cidade. O Ministério do Interior da Ucrânia informou que o ataque pode deixar a cidade sem aquecimento em meio a uma súbita onda de frio.

A Rússia está fazendo grandes esforços para tomar Kiev da maneira mais rápida possível. O objetivo é cercar a cidade por todos os lados. Isso impacta na possibilidade de uma negociação diplomática. Se tomar a capital, Putin poderá determinar os termos de um acordo"
Tanguy Baghdadi, professor de relações internacionais

Ele também vê os avanços contra Kharviv, segunda maior cidade ucraniana, como estratégicos na tentativa de controlar o país invadido. A sede de polícia local foi destruída por um míssil, provocando ao menos 25 mortes, segundo as autoridades do país. A Câmara Municipal da cidade também foi bombardeada. Mais de 40 mil pessoas estão sem comida e sem eletricidade no leste do país, de acordo com o governo.

Baghdadi, contudo, entende que a intenção dos ucranianos é de resistir aos bombardeios, prolongando o conflito — ontem, a Ucrânia informou ter lançado pela primeira vez um ataque para retirar as forças inimigas do seu território. O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky informou hoje que 6.000 militares russos morreram no conflito —informação rebatida pela Rússia, que fala em 498 baixas.

Mapa Rússia invade a Ucrânia - 26.02.2022 - Arte UOL - Arte UOL
Imagem: Arte UOL

A resistência conta com o apoio da própria população. Vídeos em redes sociais mostraram tropas russas investindo contra civis em Enerhodar, no sul da Ucrânia, que estavam no local para impedir o acesso a Zaporizhzhia, maior usina nuclear da Europa.

"Os primeiros dias de resistência ucraniana foram surpreendentes. Mas é difícil prever se o país vai conseguir manter esse cenário. Se a Ucrânia resistir ainda mais, aumenta a pressão, com isolamento brutal contra a Rússia, que vai sofrer economicamente", afirmou Baghdadi em entrevista ao UOL.

Anteontem, Zelensky disse em prounciamento não saber até quando os ucranianos conseguirão impedir o avanço das tropas de Vladimir Putin. "Uma hora talvez nós não consigamos mais ficar de pé contra a Rússia", afirmou.

A Casa Branca detalhou ontem uma série de medidas econômicas impostas contra a Rússia e sua aliada Belarus. Entre as ações anunciadas estão novas restrições que estendem as políticas de controle de exportação para a Belarus e impedem o envio de tecnologia e software para a Rússia pelo país.

Além disso, os Estados Unidos e aliados estão identificando 22 "entidades relacionadas à defesa" russas, incluindo empresas que fornecem suporte tecnológico e material para os militares.

Putin pode ser preso?

Embora ainda considere prematuro analisar possíveis retaliações a Vladimir Putin, Tanguy Baghdadi prevê restrições ao presidente russo se ele for condenado pelo Tribunal Penal Internacional, que já abriu investigações por crimes de guerra e contra a humanidade.

A Corte Internacional de Justiça (CIJ) da Organização das Nações Unidas (ONU) convocou audiências para os dias 7 e 8 deste mês sobre as denúncias apresentadas pela Ucrânia envolvendo ações das tropas russas.

"Se for condenado, o Putin corre o risco de ser preso caso queira sair da Rússia. Mas não acho que isso possa interferir no cenário atual. A guerra vai continuar. Hoje, o Putin tem pouco a perder",afirma.

Putin convocou reunião com sua equipe econômica para tratar das sanções aplicadas à Rùssia - RIA Novosti/Sergey Guneev - RIA Novosti/Sergey Guneev
Putin convocou reunião com sua equipe econômica para tratar das sanções aplicadas à Rùssia
Imagem: RIA Novosti/Sergey Guneev

Ele também contesta uma eventual rejeição da população russa ao presidente. "Não considero que isso seja tão significativo. Claro que há críticos, que inclusive estão sendo presos. Mas a popularidade do Putin segue em alta. Muitos russos culpam a própria Ucrânia e a Otan pelo conflito", avalia.

Alexei Navalny, principal opositor de Putin na Rússia, convocou a população para participar de protestos contra o conflito. Nas redes sociais, afirmou que o presidente não representa o país e pediu aos russos que não fiquem em silêncio.

Mais de 5.100 pessoas foram presas na Rússia por manifestações contrárias ao governo desde o início da invasão russa, informou a ONG de monitoramento de violência OVD-Info.

Só no domingo (27), quase 2.000 pessoas foram detidas. Na Rússia, os protestos devem ser autorizados pela prefeitura.