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Premiê assassinado foi Mario Bros na Rio 2016 e renunciou duas vezes

Shinzo Abe fantasiado de Mario Bros na Cerimônia de Encerramento da Rio-2016 - Anadolu Agency/Getty Images
Shinzo Abe fantasiado de Mario Bros na Cerimônia de Encerramento da Rio-2016 Imagem: Anadolu Agency/Getty Images

Do UOL, em São Paulo

08/07/2022 09h56

Shinzo Abe, 67, morto hoje após ser baleado durante um evento de campanha, foi o primeiro-ministro que ficou mais tempo no cargo e um dos líderes mais poderosos do país no pós-guerra. E, em 2016, apareceu como o personagem de videogame da Nintendo, Mario Bros, durante a apresentação da transferência olímpica do Rio de Janeiro para Tóquio (veja abaixo).

Abe serviu como primeiro-ministro por um curto período - de 2006 a 2007 - antes de voltar a ocupar cargo político mais alto do país novamente de 2012 a 2020. As duas passagens terminaram com sua renúncia, alegando problemas de saúde.

Abe nasceu em 21 de setembro de 1954, em Tóquio, e foi preparado desde muito jovem para exercer o poder, marcado pela história familiar de duas gerações de líderes políticos antes dele.

Seu pai foi ministro das Relações Exteriores e um tio-avô serviu como primeiro-ministro. Nobusuke Kishi, seu avô, foi um ministro do gabinete de guerra preso, mas nunca julgado como criminoso de guerra após a Segunda Guerra Mundial. Ele serviu como primeiro-ministro de 1957 a 1960.

Abe tinha 52 anos quando assumiu o cargo pela primeira vez e se tornou a pessoa mais jovem a ocupar a posição desde a Segunda Guerra Mundial. Seu primeiro mandato foi turbulento, marcado por escândalos e disputas, e terminou com sua renúncia abrupta após um ano.

Inicialmente ele declarou que renunciou por motivos políticos, mas depois admitiu que tinha um problema de saúde, que mais tarde foi diagnosticado como colite ulcerativa, uma doença inflamatória do cólon.

"O que mais me preocupa agora é que, por causa da minha renúncia, os ideais conservadores que o governo Abe levantou vão desaparecer", escreveu ele posteriormente na revista Bungei Shunju. "A partir de agora, quero me sacrificar como um legislador para fazer o verdadeiro conservadorismo se enraizar no Japão."

A condição de Abe exigiu meses de tratamento, superado graças a um novo medicamento, segundo relatou. Ele voltou a ser candidato e retornou ao cargo de primeiro-ministro em dezembro de 2012, momento em que o Japão se encontrava fragilizado devido aos efeitos do tsunami em 2011 e o desastre nuclear de Fukushima.

Abe tentou revitalizar a estagnada economia japonesa, que perdeu sua posição como a maior da Ásia entre seus dois mandatos no cargo — sua estratégia de recuperação econômica ficou conhecida como "abenomics". Alguns avanços foram registrados, como o aumento da taxa de emprego das mulheres e dos idosos. O país também passou a recorrer de maneira mais intensa à imigração para enfrentar a escassez de mão de obra.

Porém, sem reformas realmente ambiciosas, o programa teve sucesso apenas parcial, ofuscado pela crise econômica provocada pela pandemia do novo coronavírus.

Mario Bros no Maracanã

Abe foi fundamental para vencer as Olimpíadas de 2020 para Tóquio, alimentando o desejo de presidir os Jogos e até apareceu como o personagem de videogame da Nintendo, Mario, durante a transferência olímpica.

Ele se fantasiou como o personagem na cerimônia de encerramento dos Jogos Olímpicos do Rio, em 2016, no estádio do Maracanã, para convidar o mundo para o evento seguinte, realizado no Japão.

Em um vídeo, Abe dizia estar atrasado e achava que não conseguiria chegar a tempo ao Rio para participar da cerimônia. Ele então se transformava no personagem, entrava em um cano gigante e chegava no meio do gramado do estádio, onde acenou para a multidão usando o famoso boné de Mario.

Gestão na pandemia e segunda renúncia

Abe tornou-se o primeiro-ministro mais antigo do Japão em novembro de 2019, mas em 2020, o apoio público havia sido corroído por sua gestão da pandemia, que desencadeou a maior queda econômica de todos os tempos no Japão.

No início do surto, Abe demorou a fechar as fronteiras do Japão e implementar um estado de emergência pedindo às pessoas que ficassem em casa e que as lojas fechassem. Os críticos inicialmente classificaram a resposta como desajeitada e depois culparam Abe por falta de liderança. Ainda assim, a taxa de mortalidade do Japão permaneceu muito abaixo da de muitas outras nações desenvolvidas.

Uma série de escândalos, incluindo a prisão de seu ex-ministro da Justiça tornaram ainda mais difícil a situação. Ele anunciou que iria renunciar em agosto de 2020, sem presidir as Olimpíadas, adiadas para 2021. Novamente, Abe citou o mesmo problema de saúde de 2007 para justificar sua saída.

Não posso ser o primeiro-ministro se não puder tomar as melhores decisões para o povo. Decidi renunciar ao meu cargo Shinzo Abe ao anunciar sua renúncia em agosto de 2020

Postura dura com a Coreia do Norte

No cenário internacional, Abe adotou uma linha dura com a Coreia do Norte, mas assumiu um papel de pacificador entre Estados Unidos e Irã.

Abe será lembrado por aumentar os gastos com defesa e impulsionar uma grande mudança na política militar japonesa. Em 2015, seu governo aprovou uma reinterpretação da constituição pacifista do Japão no pós-guerra, permitindo que as tropas japonesas se envolvessem em combates no exterior - com condições - pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial.

Ele argumentou que a mudança era necessária para responder a um ambiente de segurança mais desafiador, um aceno para uma China mais assertiva e testes frequentes de mísseis na Coreia do Norte.

Durante seu mandato, Abe buscou melhorar as relações com Pequim e teve um telefonema histórico com o líder chinês Xi Jinping em 2018. Ao mesmo tempo, tentou conter a expansão chinesa na região unindo aliados do Pacífico.

25.ago.2019 - Donald Trump e Shinzo Abe durante encontro bilateral no G7  - Nicholas Kamm/AFP - Nicholas Kamm/AFP
25.ago.2019 - Donald Trump e Shinzo Abe durante encontro bilateral no G7
Imagem: Nicholas Kamm/AFP

O ex-primeiro-ministro priorizou um relacionamento próximo com o ex-presidente americano Donald Trump para proteger a relação entre os dois países do nacionalismo de Trump, ao mesmo tempo que tentou ajustar os vínculos com Rússia e China.

Mas os resultados foram mistos: Trump insistiu em forçar o Japão a pagar mais pelos soldados americanos presentes no país, não conseguiu concretizar um acordo com a Rússia sobre ilhas em disputa e o mesmo aconteceu com seu plano de convidar Xi para uma visita de Estado.

Influente no partido

Após deixar o cargo, Abe permaneceu como chefe do maior grupo dentro de seu partido e permaneceu influente. O ataque contra ele ocorreu durante um comício para as eleições do Senado, marcadas para o próximo domingo (10).

O hospital para onde Abe foi levado informou que o ex-premiê morreu às 17h03, no horário local (5h03, em Brasília), mais de cinco horas após ele ter sido baleado. Um médico disse que Abe sangrou até a morte, devido a dois ferimentos profundos, um deles no lado direito de seu pescoço. Ele não tinha sinais vitais quando deu entrada no hospital.

Segundo o porta-voz do governo japonês, Hirokazu Matsuno, os tiros foram disparados pouco antes do meio-dia, no horário local, e "um homem, que se acredita ser o atirador, foi detido"..

28.fev.2017 - Shinzo Abe e a esposa Akie  - Kazuhiro Nogi/AFP - Kazuhiro Nogi/AFP
28.fev.2017 - Shinzo Abe e a esposa Akie
Imagem: Kazuhiro Nogi/AFP

Em um pronunciamento, o chefe de governo, Fumio Kishida considerou o atentado "absolutamente imperdoável". A comunidade internacional também reagiu ao assassinato. Abe deixa sua esposa Akie Abe, com quem se casou em 1987. O casal não teve filhos.

* Com AFP e Reuters