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Venezuela: por que legitimidade da vitória de Maduro pode ser questionada

Situação e oposição declararam vitória após as eleições para presidência na Venezuela. Oficialmente, o CNE (Conselho Nacional Eleitoral) do país, controlado pelo governo de Nicolás Maduro, reconheceu que o ditador foi reeleito e o proclamou presidente. Alguns pontos anteriores e atuais da eleição, porém, levantam questionamentos.

Pontos que levantam questionamento sobre eleições na Venezuela

Burocracia impediu que migrantes, em sua maioria contrários a Maduro, votassem. Muitos estrangeiros narraram consulados fechados e requerimento de "documentos desnecessários" para se inscrever para votação. Segundo a agência de notícias EFE, somente 69,2 mil venezuelanos que vivem no exterior ficaram aptos a votar. O número é pequeno perto do balanço de oito milhões de pessoas que deixaram o país, cinco milhões desses, maiores de idade, segundo levantamento da Organização das Nações Unidas.

Eles dificultaram esses votos em termos burocráticos. As pessoas não estão proibidas de votar nas embaixadas da Venezuela ao redor do mundo, mas têm muitos empecilhos.
Flávia Loss de Araújo, coordenadora da pós em Relações Internacionais da FESP

Vitória de Maduro foi declarada com 80% das urnas apuradas. Mesmo antes de completar a contagem nas urnas, a CNE afirmou que a vitória de Maduro é "contundente e irreversível". No momento da declaração, Maduro tinha 51,2% dos votos, enquanto Edmundo Gonzales tinha 44,2%.

Atas da eleição ainda não foram divulgadas. Oposição diz que esses documentos podem mostrar que, somadas as zonas eleitorais, Maduro não teve mais votos. O Brasil aguarda a divulgação desse material para deixar uma posição sobre a eleição venezuelana.

Site do CNE está fora do ar. Nesta manhã, durante a apuração dos últimos votos, o site do Conselho constava como "inacessível".

Alegação de ataques atrasou divulgação dos resultados e não foi esclarecida. O presidente da CNE, Elvis Amoroso, afirmou que o "sistema de transmissão" dos dados eleitorais foi atacado e atrasou a divulgação de resultados "de maneira adversa". Ele não deu, porém, qualquer detalhe sobre o que teria ocorrido neste ataque.

Candidatos impedidos ainda antes do pleito. Para especialistas ouvidas pelo UOL, a questão principal sobre a legitimidade das eleições vem de antes da ida dos eleitores às urnas. Ainda em janeiro, a principal opositora de Maduro, Maria Corina, foi considerada inelegível, assim como o candidato Henrique Capriles.

Neste momento, é mais fácil para a gente dizer que com muitos candidatos impedidos, ficou mais fácil para o Maduro ser eleito.
Regiane Bressani, professora de relações internacionais da Unifesp.

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Falta internacional de observadores. Outro fator anterior à eleição que também é apontado como questionável é a falta de observadores internacionais previstos no acordo de Barbados, assinado entre situação e oposição da Venezuela em 2023.

Os observadores mais renomados estão lá, como o Carter Center, dos Estados Unidos, e os observadores da ONU, mas muitos outros foram desconvidados e descredenciados para acompanhar as eleições, por exemplo, a União Europeia. Isso acaba tirando a legitimidade.
Flávia Loss de Araújo, coordenadora da pós em Relações Internacionais da FESP

Maduro é presidente desde 2013. O ditador assumiu após a morte de Hugo Chávez. Desde então, foi eleito em duas eleições, pleitos sempre contestados por observadores internacionais pela falta de transparência.

Mesmo com questionamentos, não é possível cravar que houve fraude

Para as especialistas, mesmo com os pontos de questionamento, é difícil cravar que houve fraude no momento. As duas concordam que o país vive uma situação delicada no campo da democracia e que, independentemente do resultado, tempos difíceis estão no horizonte da Venezuela.

"Os dois lados têm pouco compromisso com a democracia". Para Flávia Loss, é importante analisar o histórico dos opositores que questionam a legitimidade das eleições neste momento.

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Se você pegar o histórico dessa oposição na Venezuela, percebe que eles são os mesmos atores mais ou menos desde a época da tentativa de golpe contra o Chávez, em 2002. Recentemente, em 2019, um opositor se autoproclamou presidente. Esses fatos são extremamente antidemocráticos também.
Flávia Loss de Araújo, coordenadora da pós em Relações Internacionais da FESP

Polarização cria "torcida organizada" e também ameaça democracia. Para a professora da FESP, as opiniões de cidadãos de outros países, como Argentina e Brasil, sobre as eleições venezuelanas nas redes sociais ressalta que o clima de polarização da Venezuela, assim como o dos Estados Unidos, virou um tema passional para alguns.

Se tivesse acontecido o inverso e a oposição tivesse ganhado, teríamos a mesma contestação sobre a validade dos votos. Esse é um problema grave que eu acho que não é só venezuelano. A gente aqui no Brasil passou pela mesma coisa, assim como em outros países da América Latina, que é essa suspeita de fraudes eleitorais sem fundamento.
Flávia Loss de Araújo, coordenadora da pós em Relações Internacionais da FESP

Esperança é de acordo internacional para recontagem. Regiane Bressani afirma que, caso uma recontagem não seja feita, a pressão internacional na região vai aumentar, com ainda mais sanções do que as que o país vive atualmente.

Vejo que com Maduro no governo a situação vai piorar. Se o Edmundo ganhasse, o momento de transição também não seria fácil.
Regiane Bressani, professora de relações internacionais da Unifesp

Brasil deve manter distância da situação. Bressan aponta que a proximidade fronteiriça e as questões em comum que o Brasil tem com a Venezuela devem deixar o Itamaraty longe da posição de pressionar o governo venezuelano. Até o momento, o Itamaraty afirmou que espera a publicação de mais dados sobre as eleições.

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