"Nunca tive a sensação que fôssemos morrer", diz turista que caiu de balão na Capadócia

José Miguel Calatayud

Fazia cerca de 20 minutos que sobrevoavam os vales coloridos da Capadócia, as moradias escavadas na pedra, as caprichosas colunas de rocha que chamam de chaminés de fadas. Dezenas de balões aerostáticos flutuavam a seu redor. "Tudo estava tão tranquilo lá em cima... De repente, notamos uma pequena turbulência. Olhei para cima e me pareceu ver um buraco na lona.

Então o piloto avisou: 'Temos um problema, todos na posição que mostrei no início', agachados e segurando umas alças no interior do cesto." Foi na última segunda-feira (20). Estavam a 300 metros do solo.

Verónica Borda, natural de Pamplona, 34 anos, narra esse momento deitada na cama de um hospital em Nevsehir, na Turquia. O balão em que voava com outros 23 passageiros, da empresa Anatolian Balloons, acabava de se rasgar depois de um choque com o cesto de outro veículo que estava mais elevado.

"Pensei que seria complicado, mas nunca tive a sensação de que fôssemos morrer. Via que estávamos baixando mais rápido que o normal e que íamos sofrer um golpe forte, mas que não seria mortal", lembra Ángel Casado, 60, residente em Madri, prostrado em outro quarto do mesmo hospital.

"Abracei minha mulher para protegê-la, e creio que isso a salvou um pouco do impacto." Casado fraturou as duas pernas e uma costela. Sua mulher também quebrou as duas pernas e foi operada, como ele. Por enquanto está em tratamento intensivo. Enquanto isso, Borda tem um tornozelo e uma vértebra quebrados. Sua mãe, outra passageira, quebrou uma perna.

São quatro dos 11 espanhóis que na última segunda-feira caíram de uma altura equivalente à de um edifício de cem andares. Apesar da gravidade de suas lesões, tiveram sorte: três mulheres brasileiras morreram por causa do acidente, uma no momento do impacto e duas outras, mais tarde.
Os demais passageiros, seis brasileiros, três argentinos e um porto-riquenho, e o piloto português ficaram feridos com certa gravidade, a maioria com fraturas ósseas.

O balão começou a desinflar lentamente e no início caiu em velocidade moderada. O piloto conseguiu continuar aquecendo o ar no interior do balão e amortecer a queda, segundo narram várias testemunhas. Até que o tecido ficou tão próximo da chama que teve que apagá-la. Os últimos 50 ou 60 metros foram em queda livre.

"A partir daí, não me lembro de nada, nem como batemos contra o solo nem como saí do cesto; não lembro nada até estar na ambulância", conta Casado em seu leito no hospital.

A experiência de Borda é semelhante: "Chegamos ao solo e a primeira coisa que eu disse foi: 'Puxa, meus óculos de sol quebraram'. Só isso. Depois, já na ambulância ou entrando no hospital... não lembro mais nada".

Voar de balão é uma das atividades mais populares na turística Capadócia. Durante a alta temporada, como agora, cerca de cem balões coloridos podem compartilhar o céu a cada dia. É o lugar do mundo onde voam mais balões diariamente. Entre 300 mil e 350 mil pessoas por ano pagam cerca de 150 euros por um percurso de uma hora, que começa com as primeiras luzes do dia. Mas entre tantos voos alguns acabam mal.

Cristina Sánchez, uma advogada de Madri, voou de balão em dezembro passado, também com a Anatolian Balloons. A aterrissagem foi muito brusca: o cesto se chocou com o solo, caiu no rio e finalmente se enganchou em cabos de alta tensão.

Dois passageiros tiveram que receber tratamento médico. Alguns meses antes, em abril, outro balão da mesma companhia atingiu uma parede de pedra e várias árvores durante o voo, e depois aterrissou com força.

Vários passageiros aparecem ensanguentados em uma série de vídeos que um deles gravou. Em 2009, um turista britânico morreu no que era até agora o único acidente mortal em balões na Capadócia.

Joaquim Boet, piloto e fundador da Baló Tour, comenta que em 1997 havia apenas "alguns balões" nesta área. "Agora são dezenas, e todos com entre 20 e 30 passageiros!"

E por experiência esses gigantes precisam de 100% de concentração do piloto, ainda mais voando com outros balões tão próximos. A questão é que espaçar o tempo de decolagem ou ocupar mais espaço para que estejam mais separados é perder dinheiro."

"Menos carros circulando, menos risco de acidentes, pois [com os balões] é exatamente a mesma coisa", concorda Sancho González, um piloto espanhol que há cinco anos trabalha na Capadócia, agora em uma empresa do mesmo grupo da Anatolian Balloons.

González pilota balões há 21 anos e percorreu grande parte do mundo. Diz que os pilotos da Capadócia, cujos salários oscilam entre 2.000  e 4.000 euros, são muito experientes. "Aqui há muitas companhias, muito trabalho... mas voar em balão é muito seguro, há milhares de voos e agora, infelizmente, tivemos um acidente, mas o risco é quase zero."

Neste caso, todas as partes apontam como responsável o piloto do veículo que rasgou o balão acidentado. Boet e González explicam que o balão que está mais alto deve subir para evitar o impacto. A polícia está investigando o acidente, e poderá concluir que o piloto dessa nave incorre em responsabilidade criminal, segundo uma autoridade que pede para manter o anonimato.

Ozan Korucku, responsável pela Istanbul Balloons, a empresa desse outro balão, não quer dar declarações, mas envia um e-mail. Sua empresa lamenta o acidente, oferece condolências aos familiares das vítimas e declina fazer comentários até que termine a investigação.

A Anatolian Balloons, por sua vez, também emitiu um comunicado em que oferece suas condolências e responsabiliza a outra companhia pelo acidente. "É muito seguro, muito seguro, voar de balão não é perigoso", insiste por telefone seu diretor-geral, Mahmut Uluer.

"Essas coisas acontecem e não se deve perder o bom humor e o estado de espírito, não vale a pena", comenta Ángel Casado, que afirma que no ano que vem gostaria de visitar novamente a Capadócia com sua mulher.

"Você não pode deixar que essas coisas o atrapalhe. A vida continua, foi uma experiência e fica como tal."
 

Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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