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NYT: Com queda do crescimento econômico do Brasil, bilionário autoconfiante leva tranco

Peter Lattman e Simon Romero

24/06/2013 13h55

Quando o bilionário brasileiro Eike Batista apareceu no programa de Charlie Rose, em 2010, ele e seu país estavam em um bom momento.

A economia do Brasil, impulsionada por um boom mundial de commodities, havia crescido estrondosos 7,5% naquele ano. E as holdings prodigiosas de Eike Batista –que envolviam os setores de petróleo, mineração, transporte e imobiliário– estavam valorizando fortemente. Na entrevista, perguntaram a Batista o quão rico ele iria se tornar na próxima década.

“Cem bilhões de dólares”, respondeu - uma quantia que provavelmente o tornaria a pessoa mais rica do mundo.

Hoje, com o mercado de ações brasileiro e o valor da moeda caindo enquanto grandes manifestações abalam o país, os bilhões de Eike Batista estão se evaporando. De um pico de US$ 34,5 bilhões (em torno de R$ 70 bilhões) em março 2012, sua fortuna caiu para cerca de US$ 4,8 bilhões (R$ 10,8 bilhões), de acordo com o Índice de Bilionários Bloomberg. Seus credores estão cada vez mais ansiosos, e há preocupações de que ele tenha que reorganizar -e, eventualmente, perder o controle- de seu império decadente.

A ascensão e queda do empresário carismático espelha a súbita inversão da sorte do Brasil. Depois de anos de expansão econômica, a nação sul-americana começou a engasgar. A inflação tornou-se uma grande preocupação. O índice do mercado de ações do Brasil caiu cerca de 23% neste ano, mais do que qualquer grande país. Este mês, a Standard & Poors reduziu sua perspectiva para a classificação de crédito do Brasil para negativa, citando a desaceleração do crescimento e o enfraquecimento das finanças.

E depois há os protestos se espalhando pelas ruas de todo o Brasil, que deixaram os políticos e empresários no país estupefatos. Com surtos de violência, os protestos, inicialmente movidos por um aumento das tarifas de ônibus, cresceram e passaram a ser um amplo questionamento das prioridades do governo. As manifestações sacudiram uma série de cidades ao longo do fim de semana, com um pouco menos intensidade do que nos dias anteriores, e os organizadores prometeram uma nova rodada de manifestações para os próximos dias.

O conglomerado de Eike Batista, como um símbolo do vigor industrial do país, estava entre as prioridades do governo hoje questionadas, recebendo mais de US$ 4 bilhões (R$ 9 bilhões) em empréstimos e investimentos do banco nacional de desenvolvimento. Apesar de os manifestantes não terem se focado muito na elite econômica do Brasil, há um ressentimento crescente em relação ao fato das estruturas de governo sujeitas a corrupção no Brasil terem permanecido praticamente intocadas em todo o boom econômico, enquanto as autoridades canalizaram enormes recursos do Estado para projetos controlados por magnatas.

Os manifestantes direcionaram grande parte de sua revolta contra os líderes políticos, alguns dos quais são próximos a Eike Batista, como o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, a quem Batista ocasionalmente emprestou seu jato particular e que encontrou manifestantes acampados em frente sua casa.

“Eike Batista montou um império graças ao financiamento colossal do governo brasileiro”, disse Carlos Lessa, economista e ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento do Brasil. “Mas sua explosão de riqueza e proeminência no cenário mundial veio com riscos, como o próprio governo e os investidores estão descobrindo agora”.

Eike Batista construiu sua fortuna vendendo o potencial do Brasil, formando empresas que se beneficiariam de campos ricos em petróleo, de vastos recursos minerais e da classe média em rápido crescimento.

Mas ao longo do ano passado, os investidores de seis empresas de capital aberto de Batista – nenhuma das quais são lucrativas - venderam as suas ações em meio a projeções decepcionantes, prazos perdidos e uma dívida pesada.

Ele “embrulhava vento e vendia”, disse Miriam Leitão, historiadora econômica e colunista de “O Globo”, um dos principais jornais brasileiros. “A euforia enganou um monte de gente”.

Agora, Batista está vendendo ativos e levantando dinheiro. Em abril, ele vendeu uma grande participação em sua empresa de energia elétrica. Ele colocou à venda um jato particular, um Embraer Legacy 600, de US$ 26 milhões (R$ 58,6 milhões). Ele está procurando um sócio para o histórico Hotel Glória no Rio de Janeiro, comprado em 2008, um projeto que deveria estar pronto para a Copa do Mundo de futebol de 2014, mas está atolado em atrasos.

No domingo (23), o jornal “Folha de São Paulo” informou que a empresa de construção offshore de Batista, OSX, está inadimplente no pagamento de mais de US$ 200 milhões (R$ 451 milhões) para a Acciona, uma empresa de construção espanhola. Um porta-voz de Batista negou a reportagem, alegando que a OSX está em negociações sobre as “obrigações” com a Acciona.

Em um comunicado, Batista refutou as especulações de que seu império de negócios pode estar caminhando em direção ao colapso. Referindo-se a sua recente venda de ações de sua própria empresa petrolífera carro-chefe, a OGX, Eike Batista chamou o movimento de “ajuste mínimo pontual” relacionado com a “redução do custo da dívida entre credores”. Enquanto o movimento erodiu a confiança por parte dos investidores, ele enfatizou que não tem planos de fazê-lo novamente.

Houve um tempo em que Batista personificava a emergência do Brasil como uma força econômica mundial. Filho de um ex-presidente da gigante da mineração brasileira Vale, Eike nasceu em meio ao privilégio. Ele ganhou seus primeiros milhões comprando ouro de minas remotas na Amazônia e, em seguida, adquirindo minas de ouro no Brasil e no Canadá.

Desde meados da década passada, Eike Batista, através de sua holding EBX, formou seis empresas listadas em bolsa: OGX (petróleo) e OSX (equipamentos e serviços para as empresas de energia offshore), assim como MMX (mineração), LLX (logística), CCX (carvão) e MPX (energia). O X no nome de cada empresa é utilizado para simbolizar a multiplicação de riqueza.

Eike Batista, 56 anos, vive luxuosamente e aprecia os holofotes. Ele foi campeão de corrida de lancha, e sua ex-mulher foi garota da capa da Playboy. No Jardim Botânico, um bairro chique do Rio, abriu um restaurante chinês luxuoso, chamado Mr. Lam, onde recebe os visitantes de negócios do extremo oriente. Por um tempo, ele estacionava sua Mercedes-Benz SLR McLaren, que custa cerca de US$ 450 mil (R$ 1 milhão), em sua sala de estar. Ele publicou um livro de memórias em 2011 com o título “O X da questão: A trajetória do maior empreendedor do Brasil”.

O livro agora parece precisar de um epílogo. Considere os altos e baixos da OGX, empresa de petróleo que foi uma das maiores holdings de Batista. Em 2008, a OGX captou US$ 4,1 bilhões (R$ 9,25 bilhões) no mercado acionário brasileiro, no que foi a maior IPO do país até então. Mas, em junho passado, após a OGX fracassar em suas previsões de produção por uma larga margem, suas ações despencaram em cerca de 90%. Na sexta-feira (21), três dos cinco membros independentes do conselho, incluindo um ex-ministro das finanças e um ex-juiz da Suprema Corte, renunciaram.

O ceticismo está crescendo para além das fileiras de seus próprios conselhos de administração. “Tanto para ele quanto para o Brasil, é hora de falar menos e fazer mais”, disse recentemente a “Exame”, principal revista de negócios do país, em uma análise geral dos problemas de suas empresas.

Houve também a queda, na semana passada, das ações da CCX, sua empresa de carvão. As ações caíram 37% na quinta-feira, uma baixa recorde, após Eike Batista cancelar os planos de fechar o capital. Batista disse em um comunicado que, com a deterioração no mercado de ações do Brasil, não havia “o ambiente ideal para os atuais termos” do negócio.

Se a participação de Batista continuar a diminuir em valor, os analistas dizem que seus credores, que incluem alguns dos maiores bancos do Brasil, podem pressioná-lo a uma reestruturação que poderia custar-lhe o controle de suas empresas.

A crise em seu império se desenrola enquanto o Brasil está lidando com um declínio nos preços de algumas das commodities que exporta, e os projetos de infraestrutura ambiciosos em todo o país enfrentam atrasos. Embora o crescimento tenha caído para menos de 1% em 2012, a economia do Brasil não está em crise. Os economistas ainda esperam que a economia cresça cerca de 2,5% este ano, mesmo com a turbulência nos mercados que agita o Brasil e outros países em desenvolvimento.

A súbita emergência de protestos em mais de cem cidades está colocando maior pressão sobre as autoridades para estimularem a economia.

Além de seus problemas nos negócios, Eike Batista também está sendo alvo de críticas por causa de sua família. Em março de 2012, seu filho, Thor Batista, 21, estava dirigindo a McLaren do pai quando atingiu um ciclista e matou-o instantaneamente. Este mês, um júri condenou-o por homicídio culposo. Ele evitou a prisão, mas foi proibido de dirigir por dois anos e recebeu uma multa milionária. Seus advogados disseram que vão recorrer.

Eike Batista manteve-se firme em meio às perdas, lembrando aos investidores que suas empresas ainda têm bilhões de dólares em dinheiro disponível. Ele também foi às mídias sociais para se defender, dizendo aos seus 1,3 milhões de seguidores no Twitter que quem apostar contra ele será “pego com as calças na mão”.

Jack Deino, gestor de fundos da Invesco, parece disposto a correr esse risco. Depois de adquirir uma grande posição em títulos da OGX, ele vendeu toda a sua participação um ano atrás, depois que a empresa anunciou o grande déficit de produção.

“Batista construiu seus negócios em cima de sua arte de vender e de sua fama”, disse Deino. “Sinto como se tivesse me queimado e não vou mais tocar em seus empreendimentos”.

Tradução: Deborah Weinberg