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Número de incêndios florestais em SP é o maior dos últimos 10 anos

Incêndio tomou conta do parque do Juquery, em Franco da Rocha (SP), no domingo (22) - Divulgação/Prefeitura de Franco da Rocha
Incêndio tomou conta do parque do Juquery, em Franco da Rocha (SP), no domingo (22) Imagem: Divulgação/Prefeitura de Franco da Rocha

Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

26/08/2021 04h00

O número de incêndios florestais registrados neste ano no Estado de São Paulo e na capital paulista é o maior dos últimos dez anos, revelam dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) coletados a pedido do UOL pela plataforma de dados Info Tracker (USP e Unesp).

No domingo, um desses focos devastou ao menos 80% do Parque Estadual do Juquery, pondo em risco o último remanescente protegido do cerrado na região metropolitana de São Paulo.

Entre janeiro e agosto deste ano, foram 57,5 mil focos de incêndio no estado, alta de 127% em relação aos 25 mil registrados no mesmo período de 2012.

Como as áreas mapeadas pelo Inpe abrangem beiras de rodovias e terrenos particulares, a Secretaria Estadual de Infraestrutura e Meio Ambiente se diz responsável apenas pelo combate aos incêndios em Unidades de Conservação, onde informa 53 ocorrências registradas entre janeiro e agosto de 2021 ante 168 no mesmo período do ano passado.

queimadas no estado de São Paulo entre 2012 e 2021 -  -

Na capital paulista, o aumento foi de 88%, de 150 focos nos oito primeiros meses de 2012 para 283 este ano.

Nas contas da prefeitura, houve redução nas ocorrências. Segundo a Secretaria Executiva de Mudanças Climáticas, "neste ano foram quatro ocorrências, 23 em 2020, 21 em 2019 e 14 em 2018".

queimadas na capital São Paulo entre 2012 e 2021 -  -

Setembro pode ser ainda pior

O que preocupa ambientalistas é que as queimadas previstas para setembro disparem como aconteceu no mesmo mês do ano passado. Na ocasião, o Inpe registrou 41 mil focos de incêndio, três vezes mais do que um ano antes. Setembro é historicamente o mês com mais focos de queimadas no estado.

De acordo com o MapBiomas, o fogo queimou 61.409 hectares em todo estado em 2020 área maior do que a cidade de Porto Alegre (49,6 mil hectares). A devastação não apenas superou com folga 2019 (alta de 128%) como foi a maior em 26 anos, quando 76 mil hectares de mata viraram cinzas em 1994.

Chamas consomem o Parque do Juquery - Reprodução/Twitter @prefdefranco - Reprodução/Twitter @prefdefranco
Chamas consomem o parque do Juquery
Imagem: Reprodução/Twitter @prefdefranco

Cerrado em perigo no Juquery

"As mudanças climáticas, como aponta o relatório do IPCC [Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas], provocam invernos cada vez mais quentes e secos", explica a gerente de ciência do WWF-Brasil, Mariana Napolitano.

"O solo resseca, os corpos hídricos evaporam menos água para a atmosfera e a vegetação fica inflamável, aumentando as queimadas. É um ciclo que vai se retroalimentando."

Antigamente era São Paulo da garoa, agora não é. O fenômeno climático acontece no Brasil inteiro. Não seria diferente em São Paulo."
Mariana Napolitano, do WWF-Brasil

Ela explica que a flora do cerrado é a mais adaptada ao fogo dentre os biomas brasileiros. As árvores têm casca grossa e se restabelecem quando a chuva volta a cair, em outubro.

"O problema é o fogo contínuo e intenso, como no parque do Juquery", diz Napolitano. "Há focos de incêndio em época seca, mas nunca nem metade dele havia pegado fogo." Se os incêndios com essa intensidade começarem a se repetir, diz, a gramínea não virá e as árvores não brotarão.

"Os animais não têm para onde fugir porque o parque é um remanescente de cerrado isolado na cidade de Franco da Rocha, sem outras regiões de cerrado nas imediações", diz ela.

parque juquery - Reprodução/Facebook/Prefeitura Municipal de Franco da Rocha - Reprodução/Facebook/Prefeitura Municipal de Franco da Rocha
Incêndio no parque do Juquery devastou mais de 80% dos 1.927 hectares de área
Imagem: Reprodução/Facebook/Prefeitura Municipal de Franco da Rocha

Diretor do Instituto de Biociências da USP, Marcos Buckeridge lembra que "retirar as plantas afeta todo o ciclo alimentar" da floresta. Os herbívoros ficam sem os frutos e os carnívoros sem os herbívoros. Napolitano teme pelos roedores, que durante os incêndios se escondem em cavidades no solo, onde fogo leve não costuma pegar. "É diferente do que aconteceu agora", diz.

Buckeridge alerta para as consequências da ação do homem, maiores em período de seca prolongada.

"Um raio pode acender fogo no cerrado, mas a ação antrópica aumenta drasticamente essa possibilidade. É culpa humana que o parque do Juquery tenha queimado porque caiu um balão dentro dele", diz Buckeridge, que por 20 anos foi pesquisador no Instituto de Botânica de São Paulo.

Mais de 90% dos focos em 2020 "tiveram como causa ações humanas que poderiam ter sido evitadas", diz a secretaria estadual, que afirma ter gasto R$ 8 milhões na contratação de bombeiros, aeronaves e equipamento de proteção individual.

O valor é equivalente ao recebido pelo governo após autuar 431 infratores por incêndio florestal este ano, 345 por uso irregular do fogo e 86 por soltar, vender ou confeccionar balões.

Com tantos focos de incêndio este ano, o Juquery é só a vítima mais recente. Nos últimos dias, o fogo consumiu parte de uma terra indígena no Jaraguá e porções do Parque Estadual do Itapetinga, berço do Sistema Cantareira.

"As florestas perto de mananciais ao redor da capital vêm sendo devastadas para a construção de imóveis clandestinos", diz o professor. "Ao retirar essas florestas do entorno, as nascentes podem secar."