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Gravação indica que piloto do voo AF 447 não estava na cabine de comando durante fase crítica

  • Mehdi Fedouach/AFP

    Caixa-preta do Airbus encontrada no início de maio

    Caixa-preta do Airbus encontrada no início de maio

O que aconteceu a bordo do jato da Air France que caiu no Atlântico na rota do Rio para Paris? De acordo com informações obtidas pela “Spiegel” sobre a análise dos dados registrados do voo, o piloto Marc Dubois aparentemente não estava na cabine de comando na hora que o acidente fatal começou a se desenrolar.   O destino do voo 447 da Air France foi selado em apenas quatro minutos. Este curto espaço de tempo começou com a primeira mensagem de aviso em um dos monitores do Airbus A330 e terminou com o avião caindo no Atlântico entre o Brasil e a áfrica, matando todas as 228 pessoas a bordo.   Desde a semana passada que investigadores do departamento de segurança na aviação civil da França, o BEA, vêm analisando os dados do voo e gravações de voz extraídos da cabine de comando do voo da Air France que se acidentou no dia 1º de junho de 2009, quando ia do Rio de Janeiro para Paris. O que eles descobriram nas gravações parece sugerir tanto falhas técnicas quanto humanas.   Fontes próximas da equipe de investigação revelam que as gravações indicam que o piloto Marc Dubois, que tinha 58 anos de idade, não estava na cabine de comando na hora em que os problemas começaram. Aparentemente, é possível ouvir quando Dubois corre de volta para o cockpit. “Ele dá instruções aos dois co-pilotos sobre como salvar a aeronave”, disse a fonte que tem conhecimento da investigação.   Mas suas tentativas de salvar o avião foram em vão.   Erro do piloto?   No início de maio, robôs submarinos conseguiram recuperar as caixas-pretas do voo junto aos destroços que estavam quase quatro quilômetros abaixo da superfície no mar de Sargaço. Há dois finais de semana, os investigadores conseguiram extrair dados das caixas pretas. Em 24 horas, havia relatos sugerindo que o acidente parecia resultar mais de um erro do piloto do que de uma falha na fabricação do Airbus.   Contudo, mesmo que a ausência do capitão da cabine de comando corrobore a teoria de erro do piloto, os dados incluem pistas indicando que o próprio avião pode ter se comportado de maneira estranha. Portanto, os investigadores estão enfrentando um caso complicado, que ainda pode trazer surpresas.   Até agora, parecia que a tripulação do voo AF 447 tinha levado o avião diretamente para uma tempestade severa, que eventualmente levou os sensores de velocidade a congelarem.   Contudo, os indicadores do voo registrados pela caixa-preta parecem mostrar que a tripulação vinha tentando encontrar a rota mais segura para passar pela frente de tempestade. Eles inicialmente parecem terem conseguido, pois os dados do voo não contêm quaisquer evidências de turbulências mais severas.   As tempestades na chamada Zona de Convergência Intertropical, porém, são traiçoeiras. Como numa chaminé, enormes quantidades de água são sugadas para grandes alturas, onde são transformadas em cristais de gelo difíceis de serem detectados pelos radares. Foi precisamente esse tipo de armadilha de gelo que o voo da Air France enfrentou.   “Velocidade avassaladora”   Qualquer que tenha sido o caso, os sensores de velocidade congelados colocaram os pilotos em uma situação precária: a esta altitude, eles teriam que manter uma velocidade muito precisa para impedir que o avião perdesse a sustentação.   Os pilotos chamam essa condição de voo perigosa de “estol profundo”. “Se o avião não consegue se recuperar, mergulha a uma velocidade avassaladora”, explica Jean François Huzen, capitão da Air France e representante sindical dos pilotos.   A esta altura, quase ninguém duvida que a aeronave passou por um estol profundo fatal. Uma evidência disso é o local dos destroços do avião, a quase 10 km de distância da última posição que o avião transmitiu via satélite.   A grande questão é: o que levou ao estol em primeiro lugar? Uma possibilidade é que os pilotos reagiram incorretamente diante da falha nos sensores de velocidade. Mas mesmo que este fosse o caso, ainda não seria suficiente para libertar a fabricante da aeronave ou a operadora de toda a responsabilidade. O fato é que, no momento da catástrofe, os pilotos da Air France estavam mal informados sobre o número crescente de falhas nos sensores de velocidade –e, ainda mais, sobre a forma correta de reagir a elas.   De quem é a culpa?   Ainda mais sérias são as indicações que o próprio avião possa ter respondido errado ao estol. “O gravador de dados indica que a aeronave puxou forte para cima pouco depois da falha nos sensores de velocidade”, diz um especialista com laços com a equipe de investigação, acrescentando que isso pode ter provocado o estol do avião.   é claro que é possível que o piloto tenha estimado errado a velocidade do avião e aumentado a potência do motor, jogando assim o nariz do avião para cima. Mas também é possível que os computadores de voo tenham sido responsáveis pela manobra. Os computadores são desenhados para assumirem o controle toda vez que se encontram em situação ameaçadora. Uma equipe de pesquisadores aeroespaciais observou um comportamento similar em um simulador de voo há alguns meses.   Enquanto prosseguem as investigações, a Airbus se recusa a comentar detalhes do voo. Mas na última segunda-feira (16/5), momentos após os últimos dados serem baixados da caixa-preta, a empresa enviou um “telegrama com informação do acidente” para todas as companhias aéreas cujas frotas incluem alguns dos quase 800 A330 atualmente em serviço.   A mensagem tranquilizadora dizia que os investigadores não tinham conseguido encontrar pistas apontando para uma falha técnica. Além disso, naquela mesma noite, surgiu uma reportagem no site do jornal francês “Le Fígaro” alegando que os investigadores não acreditavam que a Airbus tinha culpa no acidente.   Vazamento?   Mas a esta altura precoce das investigações ninguém poderia fazer afirmações tão amplas, o que gerou suspeitas de um vazamento proposital para aumentar a confiança na fabricante. Certamente, tanto a Airbus quanto a Air France têm um interesse urgente em desviar a responsabilidade do acidente para longe de si. Os promotores franceses estão considerando se vão acusar as duas empresas de homicídio por negligência. Além disso, o valor dos pagamentos de indenização às famílias das vítimas será determinado por fim pela extensão da culpa atribuída a cada parte.   As duas companhias têm opiniões totalmente divergentes sobre a publicação do relatório final da investigação. A Airbus prefere que o assunto desagradável seja resolvido o quanto antes. De fato, o ideal seria que fosse divulgado antes do Air Show 2011 de Paris, que estreia no dia 20 de junho em Le Bourget. Muitos contratos de venda são aguardados para durante a mostra. Como diz o presidente da Fundação pela Segurança de Voo com sede na Virgínia, William Voss: “Nenhuma empresa quer ter esse tipo de acidente sem explicação em seu histórico”.   Enquanto isso, em breve será decidido se o diretor executivo da Air France-KLM, Pierre-Henri Gourgeon, terá seu contrato estendido. Durante a conferência com a imprensa de publicação do relatório anual da empresa em Paris na última semana, Gourgeon foi perguntado se achava que a investigação poderia complicar a renovação de sua nomeação.   O piloto evitou a questão dizendo: “Não gosto muito da palavra ‘responsabilidade’”.

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