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Silêncio na Praça dos Mártires: muda o equilíbrio de poder no Líbano

Josh Wood

Beirute (Líbano)

  • Joseph Barrak/AFP

    Milhares de pessoas lembram o aniversário da morte de Rafiq Hariri, em Beirute, em julho de 2010

    Milhares de pessoas lembram o aniversário da morte de Rafiq Hariri, em Beirute, em julho de 2010

No sexto aniversário do assassinato do primeiro-ministro Rafik Hariri em 2005, a Praça dos Mártires no centro de Beirute permaneceu praticamente vazia, em um grande contraste com aniversários anteriores.   Em meio à garoa do início de tarde na segunda-feira, o número de pessoas chegava apenas a centenas, enquanto o filho do líder assassinado –o primeiro-ministro libanês de saída, Saad Hariri– prestava homenagem ao túmulo de seu pai ao lado da Mesquita Mohammad al Amin de domo azul, à beira da praça.   Nos aniversários anteriores, a Praça dos Mártires contava com dezenas, às vezes centenas de milhares de pessoas que apoiavam o Movimento Futuro de Saad Hariri e a Aliança 14 de Março que ele liderava, batizada com a data dos protestos em massa anti-Síria na praça, um mês após a morte de seu pai em 14 de fevereiro de 2005.   “Ninguém convocou o comparecimento das pessoas –não houve convite”, disse Mohammed Hajj, um simpatizante de Hariri de 19 anos, de Sidon, que foi à praça na segunda-feira. “Nos últimos cinco anos, eles costumavam convidar as pessoas com seis dias de antecedência.”   Após a coalizão de oposição 8 de Março, liderada pelo Hizbollah, ter provocado o colapso do governo e forçado Hariri a deixar o cargo em janeiro, o momento político no Líbano claramente mudou. Antes detentora da maioria no governo, a Aliança 14 de Março agora se vê na oposição.   Ainda se esforçando para se adaptar a este papel não familiar, o bloco decidiu que agora não era o melhor momento para convocar um comício oficial na praça.   “Não é segredo que grande parte dos simpatizantes do 14 de Março estão decepcionados com os eventos recentes e têm problemas com o desempenho da coalizão desde 2005”, disse Eli Khoury, um influente organizador do movimento 14 de Março em seu início. Khoury também é o presidente-executivo da Quantum, uma empresa de comunicação estratégica em Beirute, e publisher do “Now Lebanon”, um serviço de notícias online pró-14 de Março.   “O desafio enfrentado hoje pela coalizão, diferente do que muitos acreditam, não é a disposição da população de apoiá-lo, mas se a coalizão é capaz ou não de realizar a agenda da população”, ele disse.   Enquanto a aliança pró-Hariri continua tentando encontrar seu equilíbrio, as manifestações foram adiadas até 14 de março –o sexto aniversário da data em que até 1 milhão de pessoas se reuniram em Beirute para protestar contra a ocupação militar e interferência síria no Líbano.   Esses protestos – posteriormente chamados de Revolução do Cedro– levaram a Síria a retirar suas tropas do país em abril de 2005, encerrando seus 29 anos de presença militar no Líbano.   Apesar do baixo comparecimento para o aniversário na segunda-feira – e para os protestos noturnos na Praça dos Mártires desde que Najib Miqati foi escolhido como próximo primeiro-ministro– alguns dizem que a Aliança 14 de Março ainda pode mobilizar seus simpatizantes.   “Há um claro apoio popular aos partidos do 14 de Março –eles ainda podem mobilizar um número substancial de pessoas nas ruas e nós provavelmente veremos isso em 14 de março de 2011”, disse Nicholas Noe, um analista político de Beirute. “Não dê muita atenção ao jogo de números.”   Khoury disse que o pequeno número de pessoas nos protestos da noite no túmulo de Rafik Hariri refletia “basicamente, uma ausência de uma agenda clara, não de fervor” dos simpatizantes do 14 de Março.   Quando Miqati foi escolhido primeiro-ministro pelo Hizbollah e seus aliados no final de janeiro, os simpatizantes de Hariri tomaram as ruas por todo o país em protesto, e em muitos casos bloquearam ruas com pneus em chamas e viraram latas de lixo. Na cidade de Trípoli, um “dia de fúria” em 25 de janeiro pela nomeação de Miqati resultou em distúrbios violentos e inicialmente ofuscou parte da cobertura internacional do início da revolução no Egito. Os manifestantes prometeram continuar o quanto fosse necessário para devolver o poder político ao seu partido.   Hariri, entretanto, escolheu outra rota, condenando parte das ações de seus próprios simpatizantes.   “Foi a primeira vez que um líder político no Líbano condenou o que aconteceu nas ruas, pediu à população que saísse das ruas e colaborasse com o exército e as Forças de Segurança Interna na proteção do país”, disse o dr. Ahmad Fatfat, um membro do Parlamento pelo Movimento Futuro, do norte do Líbano, a base de apoio de Hariri. “Foi uma nova abordagem por parte de um partido político ou líder libanês.”   Os manifestantes atenderam ao pedido de Hariri e os distúrbios por todo o país cessaram rapidamente.   Mas se mobilizar os simpatizantes nas ruas é a demonstração mais visível de força para os partidos políticos, ela não é a única ferramenta à disposição deles, disse Noe.   “Ambos os lados possuem várias opções bem testadas para promover mudança”, ele disse. “Protestos de rua podem ser transformados em distúrbios; ajuda financeira e política de uma grande variedade de apoiadores externos; recorrer a armas, às quais ambos os lados têm acesso.”   “E há as velhas negociações de bastidores pelas quais os libaneses são famosos.”   Por ora, não se sabe se a relativa invisibilidade dos simpatizantes de Hariri é um sinal de uma perda de influência ou um controle tático. Mas o comparecimento no comício marcado para 14 de março na Praça dos Mártires pode fornecer algumas respostas.

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